Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) descobriram fatores genéticos que tornam a proteção da placenta mais ou menos eficaz contra o zika vírus, o que ajuda a explicar por que alguns bebês acabam com microcefalia e outros, não. A revelação é mais um avanço no intuito de desvendar a doença que foi epidemia entre 2015 e 2016.
Os cientistas do Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (CEGH-CEL) passaram os últimos quatro anos acompanhando três pares de gêmeos. Em todos dos casos, embora a mãe estivesse infectada, apenas um dos irmãos teve má-formações na cabeça.
Foram colhidas amostras de sangue de todas as crianças. As amostras serviram para recriar em laboratório um tipo de célula chamada trofoblasto, que compõe a estrutura que dá suporte ao feto nos três primeiros meses de gestação, conhecida como placenta primitiva.
O material foi dividido em dois grupos. Um deles simulou a gestação dos bebês afetados pela zika e o outro, do gêmeo que não teve qualquer tipo de alteração. Todas as estruturas foram então infectadas pelo mesmo tipo de zika que circulou no Brasil durante a epidemia de cinco anos atrás.
Nas células dos bebês com microcefalia, houve uma redução nos genes que fazem com que a placenta se fixe no útero e possa, dessa forma, nutrir corretamente o bebê em formação e servir como barreira de proteção contra algumas toxinas, vírus, bactérias e outros.
Já nas amostras das crianças resistentes, houve aumento estatisticamente significativo de uma molécula que age como sinalizadora do sistema imune. Basicamente, elas chamam as células de defesa da mãe para que elas possam proteger o bebê, destruindo o vírus. Todo esse processo foi observado entre 46 e 96 horas após a contaminação induzida.
A descoberta servirá como base para que cientistas possam desenvolver tratamentos capazes de fortalecer as placentas e prevenir os danos nos cérebros das crianças cujas mães foram contaminadas pelo vírus.
RISCOS
Estudo feito na Universidade de Missouri mostrou que a placenta primitiva é um ambiente mais favorável à contaminação pelo zika vírus em comparação com a madura.
Isso acontece, suspeitam os cientistas, porque nos três primeiros meses de gravidez vários genes que tornam mais fácil a entrada do agente causador da doença nos tecidos do bebê que está em formação. Por outro lado, conforme a gestação avança, a estrutura passa a produzir quantidade maior de proteínas cuja função é justamente fazer a defesa do sistema da criança contra vírus.
O problema é que o estudo mostrou o que acontece em um feto que desenvolveu microcefalia e outro que não, mas ainda não sabem o que tornou um dos irmãos mais resistentes que o outro, já que eles estão no mesmo ambiente e, teoricamente, expostos às mesmas condições.
Vale lembrar que existem outros fatores já descritos pela ciência que tornam os bebês mais suscetíveis a terem quaisquer tipos de má-formação, como a composição da microbiota intestinal, a dieta da mãe, entre outros. Este é um dos motivos que fez com que a quantidade de bebês com microcefalia no nordeste fosse superior a do restante do país.