A implantação dos corredores de transporte em Campo Grande, projetados em 2012 com vias modeladas especialmente para atender ônibus do modelo BRT (que trafega em vias especiais), vem gerando reclamação de motoristas e comerciantes, justamente por gerar problemas que o projeto veio para melhorar: a mobilidade urbana.
No que depender da prefeitura, as reclamações vão continuar. É que os pontos de ônibus no meio das vias, como já é visível na Rua Brilhante, motivo das reclamações e característica marcante do projeto, não serão alterados pela prefeitura.
O motivo? A prefeitura tem de garantir os R$ 110 milhões em recursos federais para bancar a obra e que estão condicionados ao projeto.
O diretor-presidente da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran), Janine Lima Bruno, afirmou que priorizar os ônibus em detrimento dos carros é uma tendência mundial.
“As cidades estão sendo descentralizadas, então, as pessoas passam a viver dentro de regiões. A tendência de priorizar o carro está ultrapassada”, afirma Janine.
Quando o projeto foi concebido, Campo Grande tinha dezenas de ônibus articulados em circulação e planejava-se a implantação dos BRTs (Ônibus de Trânsito Rápido, na tradução livre), como os que existem em Curitiba (PR) e no Rio de Janeiro (RJ).
De lá para cá, o Consórcio Guaicurus retirou a maioria dos ônibus articulados de circulação, alegando queda no movimento, e não tem planos de colocá-los de volta.
RECLAMAÇÕES
Enquanto o Corredor Sudoeste, que está em obras e abrange as ruas Guia Lopes, Brilhante, e as avenidas Bandeirantes, Marechal Deodoro e Gunter Hans, não fica pronto, os motoristas e empresários não gostam nada do que veem.
Antônio Sérgio, um comerciante da região, diz não saber por onde começar. Segundo ele, primeiro, os estabelecimentos comerciais sofriam com o recapeamento da via pelo Exército, em 2018. Agora, não pode nem colocar os carros que vende na via porque o estacionamento público será retirado.
“Se eu não fosse dono do terreno, eu já teria fechado o negócio”, lamenta. Antônio diz que os prejuízos são enormes em relação ao funcionamento da garagem da qual é proprietário. Daqui para frente ele nem tem planos.
“Vou avaliar. Se não der certo, talvez eu monte um estacionamento privado ou feche”, sentencia.
Outro local afetado pelas mudanças é a Clínica da Alma, que funciona no lado oposto ao negócio de Antônio. Felipe Santana, um trabalhador local, diz que o maior problema foi não poder usar o estacionamento da via.
“As pessoas não reclamaram muito porque não tem muito culto, mas acho que deve mudar quando as coisas voltarem ao normal”, especula.
“MELHOR OPÇÃO”
Uma reclamação recorrente é a colocação de pontos de ônibus no meio das vias. Segundo a Agência Municipal de Trânsito e Transportes, a ilha é a melhor opção, pois “não há calçada em Campo Grande que suporte as especificações dos abrigos para os ônibus”. A diretora adjunta, Andrea Figueiredo, diz que essa é “a melhor hipótese possível”.
O diretor-presidente da Agetran, afirma que o projeto atende 80% dos usuários de ônibus da cidade. Alguns proprietários de carros estão irritados com as obras e dificuldades no trânsito. Eles se preocupam, mas defendem o projeto como fundamental para implantar o que está previsto no plano de mobilidade urbana.
“As obras atrapalham, mas, se não há marcação na via, é difícil as pessoas entenderem o que está acontecendo”, afirma Janine. Ele segue dizendo que o ônibus disputa o lugar com o carro. “A infraestrutura é para melhorar a qualidade de vida das pessoas que precisam se deslocar até o Centro”, complementa.
A Agência afirma que a ideia segue uma tendência mundial de inverter a lógica estrutural das cidades modernas, que, conforme Janine disse, é ultrapassada.
Segundo ele, “as grandes cidades do mundo estão invertendo a lógica do trânsito”. O processo é chamado de pirâmide invertida. Nele,“o pedestre passa a ocupar o primeiro lugar em prioridade, depois o ciclista, o ônibus em terceiro e, por fim, os transportes privados compartilhados, como táxis e aplicativos, antes do veículo pessoal”.
O projeto estava previsto desde 2007. Os recursos foram aprovados em 2011 – era para ser uma das obras para a candidatura de Campo Grande à sede da Copa do Mundo de 2014 –, mas só em 2017, mediante convênio com o Exército Brasileiro (que depois foi desfeito), é que a obra teve início.
Prefeitura já comprou 17 estações polêmicas
EDUARDO MIRANDA
Alvo da polêmica, os pontos de ônibus, nomeados como “estações de pré-embarque”, custaram cerca de R$ 1,1 milhão dos R$ 24 milhões previstos para o Corredor Sudoeste.
Ao todo, serão 17 estações implantadas. Deverão ser três unidades de 10 metros de cumprimento e 14 de 5 metros, ambas com 2,5 metros de cobertura. As estações maiores têm 15 assentos, e as menores, seis bancos, além de uma estrutura de concreto onde os usuários também poderão se acomodar.
Na primeira etapa, que será entregue até agosto, devem ser instaladas quatro estações nas ruas Brilhante e Guia Lopes. As outras ficarão na Avenida Bandeirantes e na Rua Bahia (esta última já integra o Corredor Norte de Transporte).
O corredor tem o propósito de melhorar o fluxo de passageiros alimentado pelos terminais Bandeirantes e Aero Rancho.
OUTROS CORREDORES
No ano passado, a Prefeitura de Campo Grande autorizou a contratação de empréstimos de R$ 91,3 milhões para bancar os outros corredores: Sul e Norte.
O Corredor Sul abrangerá as avenidas Costa e Silva, Gury Marques e Calógeras e fará a conexão dos terminais Morenão e Guaicurus. O Corredor Norte contemplará vias como as ruas Bahia, 25 de Dezembro e Alegrete, além das avenidas Coronel Antonino e Cônsul Assaf Trad, e fará a ligação dos terminais General Osório e Nova Bahia.