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A judicialização previdenciária, a busca por justiça e a necessidade de reformas estruturais

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Recente relatório estatístico divulgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) revelou um dado alarmante: 87% das ações ajuizadas contra a União são de natureza previdenciária. O número, além de expressivo, escancara problemas históricos e estruturais do sistema de proteção social brasileiro.

A judicialização da Previdência, ao contrário do que se poderia supor, não é fruto da litigiosidade excessiva dos segurados. Trata-se de um reflexo direto das dificuldades enfrentadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para garantir, de forma célere e justa, a concessão dos benefícios a milhões de brasileiros.

As causas são múltiplas. Entre elas estão o indeferimento de benefícios baseado em interpretações excessivamente restritivas, erros materiais no cálculo da renda mensal inicial, demora na análise dos processos administrativos e descumprimento de entendimentos já consolidados pela Justiça.

Soma-se a isso a falta de integração entre bancos de dados e sistemas, o baixo investimento em tecnologia e a insuficiente orientação ao segurado no momento do requerimento. Esses fatores mostram que a judicialização não é artificial: ela decorre da necessidade de corrigir falhas que, se ignoradas, agravariam a vulnerabilidade social de milhões de brasileiros.

Para enfrentar o problema, é imprescindível atacar suas causas. Entre as alternativas possíveis estão o fortalecimento estrutural do INSS, com novos concursos públicos e modernização tecnológica, a uniformização dos entendimentos administrativos conforme a jurisprudência dos tribunais superiores e a criação de câmaras administrativas de conciliação para demandas de baixa complexidade.

O INSS é uma das maiores autarquias do mundo em volume de atendimento: são mais de 39 milhões de benefícios ativos e milhões de novos requerimentos a cada ano. Nesse cenário, falhas administrativas, análises deficientes, interpretações restritivas da legislação e atrasos são recorrentes. Para o segurado, já em situação de vulnerabilidade, recorrer ao Judiciário se torna a única via para concretizar direitos garantidos constitucionalmente.

É fundamental destacar que o problema não reside na atuação dos servidores do INSS, que muitas vezes trabalham sob pressão, com sistemas instáveis, acúmulo de tarefas e estrutura defasada. A questão é estrutural e aponta para a necessidade de reformas urgentes em múltiplas frentes.

Ao analisar o índice de judicialização, fica claro que o cidadão brasileiro ainda enxerga no Poder Judiciário a principal forma de garantir a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental consagrado no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. O direito à proteção previdenciária, previsto no artigo 201, também reforça essa busca legítima.

Em um sistema ideal, a solução deveria ser obtida na esfera administrativa. No entanto, a realidade impõe outro cenário: o Poder Judiciário, na esmagadora maioria dos casos, atua como um corretor de falhas administrativas, restabelecendo direitos e reequilibrando o sistema de proteção social.

A reestruturação do sistema Meu INSS também é fundamental: é preciso oferecer orientações claras, informações transparentes e facilidades que evitem erros e a necessidade de judicialização. Parcerias com defensorias públicas podem orientar o segurado desde o início, evitando litígios desnecessários.

Além disso, cabe ao INSS uma atuação mais proativa no sentido de orientar o cidadão a buscar o melhor benefício a que tem direito, eliminando entraves burocráticos e promovendo uma cultura de eficiência e respeito.

O dado de 87% não é apenas estatístico: ele aponta para um sistema previdenciário que precisa ser fortalecido, modernizado e aproximado da realidade dos trabalhadores brasileiros – os mesmos que sustentam, com suas contribuições, todo o edifício da proteção social.

Enquanto as reformas não se concretizam, é legítimo que o Poder Judiciário siga exercendo seu papel de garantidor da dignidade humana. O segurado, longe de ser visto como um causador do problema, deve ser compreendido como o verdadeiro protagonista na luta pela efetivação de direitos fundamentais.

A responsabilidade pela mudança é coletiva: advogados, servidores, administradores públicos, magistrados e sociedade devem caminhar juntos. Fortalecer a Previdência é fortalecer a cidadania. E é por essa causa que vale a pena lutar.

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Editorial

BR-163: enfim, uma nova etapa

A reconstrução da confiança entre a população e as empresas responsáveis pela infraestrutura pública passa, obrigatoriamente, pelo cumprimento rigoroso de metas e prazos

21/05/2025 07h15

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Após anos de incertezas, promessas não cumpridas e frustrações acumuladas, a novela da BR-163 parece enfim caminhar para um desfecho. A rodovia que corta Mato Grosso do Sul de norte a sul terá um novo contrato de concessão. A empresa Motiva, novo nome da CCR, foi a única a se candidatar à tarefa de administrar esse importante eixo logístico do Estado. Em função da falta de concorrência, resta à sociedade acompanhar de perto e cobrar cada cláusula que será assinada.

É evidente que o contrato que está prestes a ser oficializado não representa o cenário ideal, especialmente se considerarmos as expectativas dos sul-mato-grossenses. Após tantos anos convivendo com promessas descumpridas e obras paradas, o sentimento geral da população é de cautela, se não de ceticismo. Ainda assim, diante da necessidade urgente de investimentos em infraestrutura viária, o que foi proposto parece, neste momento, razoável.

Entre os compromissos assumidos pela nova concessão, destaca-se a duplicação de pelo menos 200 quilômetros da BR-163 já nos cinco primeiros anos de contrato. Essa medida é essencial para aumentar a segurança de quem trafega pela rodovia e para garantir maior fluidez ao transporte de cargas e passageiros. Além disso, o alargamento da pista em trechos críticos também está previsto – outro ponto positivo que deve ser valorizado e, mais importante, fiscalizado.

A população de Mato Grosso do Sul já foi penalizada demais com descasos e contratos descumpridos. O que se espera, a partir de agora, é uma mudança de postura. A responsabilidade da empresa concessionária é enorme, mas a responsabilidade dos cidadãos e autoridades públicas de fiscalizar e cobrar também não é menor. O novo contrato precisa sair do papel e se transformar em obras visíveis, concretas e eficazes.

O contrato anterior ficou no passado – e, com ele, um histórico que não deve ser repetido. O presente exige maturidade para olhar para a frente, sem deixar de aprender com os erros cometidos. A reconstrução da confiança entre a população e as empresas responsáveis pela infraestrutura pública passa, obrigatoriamente, pelo cumprimento rigoroso de metas e prazos.

Mato Grosso do Sul tem crescido de forma consistente nos últimos anos. Mas, para que esse crescimento se consolide e se torne sustentável, é urgente que a logística acompanhe o ritmo da economia. Uma BR-163 segura, moderna e eficiente é peça-chave nesse processo. O agronegócio, o setor industrial, o comércio e o turismo dependem diretamente de uma malha viária que funcione.

Portanto, que essa nova etapa da BR-163 seja marcada pelo trabalho sério e pelo respeito à população. O que está em jogo vai muito além de uma concessão: trata-se do futuro de um Estado que quer – e pode – crescer ainda mais.

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Sua excelência, a Defensoria Pública

20/05/2025 07h45

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Nesses tempos em que tanto se fala em resiliência, que tal lembrarmos um pouquinho da Defensoria Pública, principalmente porque o mês convida a essa reflexão, já que comemoramos o Dia do Defensor Público, em 19 de maio?

Funcionando inicialmente, na maior parte dos estados brasileiros, como assistência judiciária, além de outras denominações congêneres que recebera, a Instituição, que é uma legítima representante jurídica da população, já percorrera (e ainda percorre) uma via crucis medonha para se firmar. É que todos os avanços até aqui firmados se deram às custas de muito “sangue, suor e lágrimas” (prosaicamente se falando). 

Isso é o que faz dela um exemplo de bravura e de autêntico exemplo de resistência em todo o percurso histórico da Justiça. Por essa razão, a data de 19 de maio tem de ser objeto de reflexão, principalmente porque, mesmo que seja reconhecida constitucionalmente como uma das funções essenciais à Justiça, ainda não lhe foram conferidas, concretamente, todas as prerrogativas previstas, para a obtenção da indispensável “paridade” com as demais carreiras jurídicas.

Para piorar a situação, “vira e mexe” a Defensoria é alvo de potenciais “criações legislativas” mirabolantes, as quais acabam subtraindo de seus membros e, consequentemente, de seu público-alvo, a paz e a segurança jurídica, já tão duramente conquistadas ao longo da existência institucional.

Em tema de conquistas, recentemente, o Projeto de Lei nº 4.015/2023, que foi aprovado no Congresso (Lei nº 15.134/2025), incluindo a Defensoria Pública entre as atividades de risco. Todavia, o presidente da República vetou parte substancial do PL, que continha, por exemplo, maior proteção de informações cadastrais e de dados pessoais dos membros da Defensoria, bem como a inclusão da atividade como de risco permanente, além da possibilidade de especial proteção policial e aposentadoria.

Entretanto, na contramão desses direitos que já deveriam fazer parte (sem favor) das prerrogativas institucionais, os defensores públicos ainda não têm isonomia com as demais funções da Justiça, a exemplo da garantia da vitaliciedade e da sonhada equiparação remuneratória.

De tais garantias e direitos, porém, seus membros já são dignos, há tempos, bastando-se lançar um olhar mais sensato e justo sobre tantos “tijolos” já carregados pelos defensores, para soerguer os muros de dignidade e de justiça daqueles que dos seus serviços dependem.

Ainda assim, guardadas todas as proporções (e desproporções), a carreira de defensor público é, por excelência, uma das que mais atraem os bacharéis em Direito, presentemente, seja pela nobreza e altruísmo de seu exercício, seja pelos auspícios promissores que ela guarda, em tema de realização profissional.

Na última década, o concurso para o cargo de defensor público tem figurado, nacionalmente, como um dos mais cobiçados, com vários certames em andamento por alguns estados da Federação, a exemplo de Alagoas, Amazonas e Pernambuco. Neste último, por exemplo, há 7.645 inscritos para 20 vagas, o que gera uma concorrência de 385.25 candidatos para cada uma daquelas.

Para quem sonhar em trilhar a nobre carreira de defensor público, como eu já dissera em um artigo que publiquei lá pelos idos de 2012, a atividade é fascinante e encantadora. Congratulações e vida longa, portanto, à Defensoria Pública, da qual, honrosamente, sou membro!

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