Artigos e Opinião

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O debate sobre o ajuste fiscal no Brasil parece girar em torno de um eixo fixo: o sacrifício dos mais vulneráveis. A cada nova proposta ou clamor dos “procuradores” da Faria Lima – aqueles agentes do mercado que, dentro ou fora do governo, sempre encontram aplausos nos mais favorecidos – o alvo permanece inalterado: cortar investimentos sociais. Para eles, o equilíbrio das contas públicas é mágico, mas seletivo.

Os números não mentem, ainda que a interpretação seja frequentemente enviesada. No orçamento de 2024, os gastos com Forças Armadas somam R$ 86,8 bilhões, enquanto incentivos fiscais para empresas alcançam R$ 97,7 bilhões até agosto. Acrescente-se a isso os R$ 44,67 bilhões destinados às emendas parlamentares – muitas vezes instrumentos de barganha política –, e temos um total de R$ 229,17 bilhões que raramente entram na mira dos “ajustes”. E isso sem falar na generosidade do Plano Safra 2024/2025: R$ 400,59 bilhões para os gigantes do agronegócio, muitas vezes os mesmos que acumulam dívidas monumentais.

O discurso hegemônico evita tocar em privilégios estabelecidos, optando por sacrificar o pouco que sustenta muitos. Quando se fala em cortes, não são os incentivos bilionários ao setor empresarial ou os subsídios ao agro que entram em pauta. Ao contrário, é a proteção social que se torna alvo preferencial. Programas como o Bolsa Família (R$ 14 bilhões), o Benefício de Prestação Continuada (R$ 30 bilhões), o Farmácia Popular (R$ 3,4 bilhões) e até iniciativas modestas, como o Vale Gás (R$ 3,7 bilhões) são tratados como “excessos” a serem eliminados.

Somados, esses programas representam R$ 60,8 bilhões – menos de um sexto do que é destinado às Forças Armadas, aos incentivos fiscais e às emendas parlamentares. Ainda assim, são apresentados como o grande problema fiscal. Sem falar, claro, também das sempre sacrificadas áreas como meio ambiente e cultura. É uma narrativa que desconsidera vidas humanas e ignora o papel essencial desses programas para a sobrevivência de milhões de brasileiros.

Há um padrão evidente nessa dança de cortes: desmontar, pouco a pouco, as bases de um projeto de governo que foi escolhido democraticamente nas urnas. E que, como vemos, é rejeitado pela seita que não aceita o resultado das últimas eleições e trama um golpe de Estado. Enquanto a retórica dos “ajustes” é propagada como técnica e neutra, seu impacto é profundamente político e ideológico. Trata-se, na prática, de inviabilizar políticas públicas que combatem desigualdades históricas, ao mesmo tempo em que se preserva – ou mesmo se amplia – a “bondade” destinada aos setores mais abastados.

Esse golpe fiscal, embora mais sutil do que os atrapalhados ataques terroristas aos prédios dos Três Poderes e as ameaças de morte contra personalidades públicas, tem consequências igualmente preocupantes. Cada corte em programas sociais cobra um preço em vidas humanas, seja no aumento da fome, na precarização da saúde ou na exclusão educacional. E, ao contrário do que apregoam os arautos do mercado, não é o Estado “inchado” que pesa sobre o Orçamento, mas, sim, as escolhas deliberadas que priorizam poucos em detrimento de muitos.

A discussão sobre ajuste fiscal não precisa ser tabu. É verdade que há gastos injustificáveis e outros que, no mínimo, merecem revisão. No entanto, o debate deveria começar por onde o impacto social é menor – como os incentivos ao grande capital e às benesses ao agronegócio – e não pela exclusão dos mais vulneráveis. Várias empresas responsáveis do setor agrícola não dependem de favores, são geradoras de empregos e renda, tratam com respeito seus trabalhadores, não agridem o meio ambiente e pagam impostos como qualquer negócio. Idem na indústria, no comércio e nos serviços.

A narrativa dominante precisa ser desafiada. Não há mágica no ajuste fiscal, apenas escolhas políticas. Enquanto essas escolhas ignorarem os mais necessitados, o “ajuste” continuará sendo apenas um eufemismo para a perpetuação da desigualdade.

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Recomendações de Herman Benjamin para os juízes

03/12/2024 07h30

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Sempre tive uma vontade grande de conhecer pessoalmente o ministro presidente do STJ, Herman Benjamin, paraibano de Catolé do Rocha, e conversar com ele para beber seus vastos conhecimentos jurídicos, filosóficos, teológicos e humanitários tão importantes para sedimentar as suas sentenças e engalanar a cátedra onde sustenta com absoluta competência. Esse sempre foi um dos meus acalentados sonhos.

O ministro está tão próximo da minha cidade Ponta Porã e não pude concretizar essa aspiração em razão da fragilidade da minha saúde. Mas as oportunidades se renovam e quem sabe um pouco mais à frente poderei concretizar esse desiderato precioso. Mas é certo também, em outra vertente, que as suas decisões inseridas nos anais dos tribunais por onde peregrinou e ainda peregrina são sábias e pedagógicas e de valor inigualável. Não são conversas vazias e destituídas de fundamentos esse indicativo lançado pelo articulista. 

São provas robustas e insofismáveis emanadas daqueles que verdadeiramente amam o Direito e ainda consagram a sua vida inteira a serviço da Justiça como instrumento fomentador da paz social. Sim, porque o Direito, embora seja uma ciência abstrata, ele atrai, seduz e nunca chega a satisfazer a inteligência do seu estudioso diante da sua grandeza e do alcance dos seus propósitos.

Desde que nascemos, com o registro de nascimento, até quando morremos, com o atestado de óbito, tudo o que fazemos ou realizamos no curso da nossa peregrinação terrena está regulamentado por normas, regulamentos, portarias, decretos e leis que formam o nosso ordenamento jurídico. Base fundamental para referendar a justa distribuição da Justiça sempre que esse reclamo bater às portas dos juízos, instâncias ou tribunais.

Nessa linha de pensamento e de coexistência pacífica entre o Estado e a sociedade civil organizada surge o Judiciário como instrumento valioso para assentar a paz social, sobretudo quando foi esse o propósito do Estado para chamar para si a responsabilidade de distribuir a Justiça. Como o Estado se trata de um ente abstrato, ele mostra a sua face na pessoa física do juiz como responsável pela aplicação da Justiça. Não pode existir nada mais sublime do que isso. 

Consolidar a paz social com a aplicação da norma jurídica capaz de serenar os ânimos dos que buscam na Justiça o último guardião para a defesa dos seus direitos. E isso se torna mais evidente quando se constata a lisura dos nossos juízes, suas condutas morais, culturais, sociais, éticas e jurídicas no contexto da sociedade em que convive, como expressão maior para conquistar a respeitabilidade dos seus jurisdicionados.

Na primeira entrevista que concedeu, e que está estampada nas páginas amarelas da edição da Veja de setembro/24, disse a cada jovem magistrado com quem se encontra que a ambição da riqueza material ou quem sonha com um emprego glamouroso não deve ser juiz, estará na profissão errada. E sentenciou dizendo que o juiz no exercício da sua função judicante nunca será rico, e quem quer ser rico, não deve fazer concurso para juiz. 

Foi o desabafo diante de tantos tormentos que sacudiram os tribunais estaduais com os afastamentos de desembargadores de seu ofícios judicantes. Mas esse desejo enlouquecido que embrutece o ser humano não reside apenas nos limites do Judiciário. Outras tantas instituições sofrem com esse pesadelo. Nem o papa Francisco com o seu colégio de cardeais rebelde, e de outros tantos padres que se utilizam da sotaina para destruir sonhos justos e santos, vive momentos do seu pontificado sem tormentos. 

Em razão desses ditames, a nossa Carta Constitucional, para evitar essa vontade condenável, reservou aos integrantes do Judiciário as garantias constitucionais da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos como instrumentos robustos para enfrentar os poderosos e vencer os desafios que todos os dias surgem na sua rotina de trabalho.

Parabéns ao nosso Estado, que recebe as mais altas autoridades do Judiciário brasileiro pelo colóquio. Parabéns a nossa sempre linda Campo Grande, terra de José Antônio Pereira, plantador de uma cidade de gente honesta, trabalhadora e que respeita a ordem, a lei e as autoridades constituídas. 

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Poderá existir anistia aos atentados de 8 de janeiro?

29/11/2024 07h45

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O almirante ateniense Trasíbulo (440 a.C.) derrotou os 30 tiranos trazendo um exército inicial de 60 homens de Tebas e, depois da vitória, fez os atenienses que estavam divididos se reconciliarem.

A ele é atribuído o nascimento ou significado da palavra anistia (amnesia), dada aos atenienses ao editar lei concedendo o perdão àqueles que cometeram delitos, em nome do fortalecimento da paz.

A concessão de perdão ao longo da história sempre nos revela a existência de tensões sociais sobre as quais o perdão incidirá, resolvendo-as ou evitando-as.

No Brasil, são causas extintivas da punibilidade segundo a ordem penal: a) a morte do agente; b) a anistia, a graça e o indulto; c) a abolição do crime; d) a prescrição, a decadência ou a preempção; e) a renúncia ou o perdão, entre outros.

Fala-se que haveria uma disposição do Congresso Nacional de anistiar diversos fatos punidos recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), alguns deles, supõe-se, teriam, na visão do mesmo STF, atentado contra a ordem constitucional ou o Estado Democrático.

Caso de fato o Congresso decida praticar a anistia nesse último caso, certamente haverá reação de alguns partidos políticos que baterão às portas do STF indicando a proibição de anistia para aqueles que atentaram contra o regime democrático.

Novo contencioso se criará, porquanto há os que veem nos atentados de 8 de janeiro um movimento ordenado, um tipo de vandalismo, visando sobretudo a destruição do patrimônio público nacional, mas não propriamente um golpe de estado ou contra as instituições. Já há outros que enxergam no ocorrido um verdadeiro golpe em sentido mais amplo da palavra.

Quem está com a razão? E mais: qual a solução que melhor atende ao interesse social? A anistia ou a punição dos infratores à ordem jurídica?

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