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Antônio Carlos Siufi Hindo: "A satanização dos partidos políticos"

Promotor de Justiça aposentado

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Todas as democracias que  se consolidaram ao longo da história da humanidade sempre consagraram em seus textos constitucionais a pluralidade dos partidos políticos com um dos alicerces inexoráveis do regime democrático. A sua grandeza a enxergamos nos limites próprios da sua importância como instituição de direito privado. No corpo dos seus estatutos estão consagrados os seus princípios, as suas metas e objetivos que precisam ser respeitados pelos seus filiados, a fim de que se possa construir com o respaldo da sua orientação doutrinaria uma pátria livre, soberana e democrática. Sua estrela maior a conduzir os seus destinos está concentrada no seu conselho de ética que está sempre pronto para punir os seus filiados que conspirarem contra os seus princípios.  

Nesse diapasão, não podemos conceber a existência de qualquer partido político que tenha como seu propósito maior conspirar contra a pátria, contra os seus valores, contra os princípios democráticos e fundamentais de um povo. Não, esse tipo de partido de político não existe. Tanto é verdade que Justiça nenhuma em qualquer lugar do mundo teria através de seus juízes a enorme insensibilidade de referendarem a sua existência dando-lhe o seu registro definitivo. 

A questão, que intriga o cidadão comum do povo e o direciona cada vez mais a se afastar da política e de temas a ela relacionados não tem nada a ver  com os partidos políticos existentes, mas com os homens  que o compõem  e formam. Os seus donos, os líderes partidários, os correligionários, os simpatizantes, coloquem o nome que quiserem colocar para satisfazer seus interesses pessoais e de seus afilhados, são capazes de vender a própria alma. Fazem pior. 

Transformam os partidos políticos que dirigem,  em verdadeiras mercadorias que se dá; que se vende ou que se empresta nos balcões imundos do comércio desprezível,  sem nenhum tipo de constrangimento. Trata-se de um ato de mercancia, como qualquer outro. 

Com esses atos de absoluta insanidade jogam na lama, no lixo e no lodo a sua bandeira partidária, as suas cores, as suas insígnias, a sua tradição de luta, enfim tudo aquilo de bom e auspicioso que a sua agremiação pode oferecer. Esse espetáculo sórdido estamos assistindo em Brasília. Um governo em estado terminal oferece suas vísceras para os partidos em  que os seus dirigentes  se constituem em verdadeiros abutres a devorarem seus órgãos. Algo inacreditável. Essa ação pecaminosa tem prazo certo para morrer, a sentença das urnas. Mas os Partidos Políticos, não. Eles  continuam vivos, dignos, e sempre altaneiros convidando a todos os que   simpatizarem com os seus princípios a acolhê-los de braços abertos em seu seio sempre generoso. 

Quando esses arremedos de políticos embrulham as suas bandeiras partidárias para a luxúria; para o prazer enganoso do poder; pelas trapaças; pelas espertezas, mas principalmente, pelo dinheiro que resulta no fruto da discórdia e do compromisso nenhum com a sua consciência, o que temos então a toda evidencia é a sua satanização.

editorial

Violência contra a mulher e ações efetivas

Setores nostálgicos da sociedade ainda pregam o retorno a um modelo em que a mulher era silenciada, confinada ao lar e privada de voz pública

13/06/2025 07h00

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O mais recente Mapa da Segurança Pública, divulgado nesta semana pelo Ministério da Justiça, trouxe novamente um dado alarmante: o Estado de Mato Grosso do Sul continua figurando entre os líderes do ranking nacional quando o tema é violência contra a mulher. Trata-se de uma repetição trágica que vem se confirmando ano após ano, sem que haja sinais de uma reversão estrutural. Os números são um reflexo doloroso de uma realidade que exige, com urgência, uma abordagem séria, objetiva e comprometida por parte das autoridades.

O enfrentamento da violência contra a mulher exige mais do que discursos bem-intencionados. Ele exige dados, precisão nas políticas públicas e, sobretudo, vontade política. A primeira e mais óbvia necessidade é garantir que os agressores sejam punidos com rigor. Não por desejo de vingança, mas por um princípio essencial do Direito Penal: a punição eficaz tem função pedagógica e dissuasória. Onde há impunidade, há incentivo ao crime. Onde há resposta firme do Estado, há limites sendo reafirmados.

Mas a efetividade da lei não se mede apenas pela quantidade de anos previstos em uma pena. A lei só é respeitada quando é aplicada de forma real, rápida e visível. Isso requer mais do que papel e tinta — requer fiscalização, presença ostensiva, estrutura e recursos humanos preparados. Tudo isso custa dinheiro. E mais que isso: custa tempo, comprometimento e esforço coordenado entre o Executivo, o Judiciário, os órgãos de segurança e os sistemas de proteção social.

A verdade incômoda é que, sem vontade política clara e corajosa para enfrentar os agressores de mulheres, os números continuarão altos. Não se pode permitir que casos de violência sejam tratados com negligência ou relativismo, como se fossem apenas conflitos domésticos ou “questões privadas”. A omissão do poder público e da sociedade civil, em qualquer nível, é cúmplice da perpetuação da violência.

Além da resposta penal, há um desafio ainda maior: o da transformação cultural. É preciso romper com a cultura da subjugação das mulheres, que ainda encontra espaço em muitos setores da sociedade. Não adianta o Estado fazer campanhas sobre respeito e igualdade se, ao mesmo tempo, líderes religiosos ou comunitários reforçam discursos que colocam a mulher em posição de inferioridade. A sociedade precisa decidir, coletivamente, qual papel deseja dar às mulheres — e essa decisão deve ser baseada em igualdade, dignidade e liberdade.

É verdade que os tempos mudaram, e que hoje há mais autonomia feminina do que em décadas passadas. No entanto, setores nostálgicos da sociedade ainda pregam o retorno a um modelo em que a mulher era silenciada, confinada ao lar e privada de voz pública. Essa nostalgia que não respeita a autonomia da mulher — muitas vezes romantizada como “valores da família” — precisa ser encarada como parte do problema, e não como solução.

Reduzir a violência contra a mulher no Mato Grosso do Sul e no Brasil é possível. Mas isso exigirá ação efetiva, punição exemplar aos agressores, investimento público contínuo e coragem para enfrentar costumes nocivos à diginidade das mulheres ainda presente nas instituições e no cotidiano. Não há caminho mais curto — nem mais necessário.

ARTIGOS

Caetano canta música evangélica e o erro estratégico de setores progressistas

10/06/2025 07h45

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A cena é recorrente nos shows de Caetano Veloso: após sucessos consagrados de seu repertório, o artista entoa a canção “Deus Cuida de Mim”, do pastor Kleber Lucas. A resposta do público, composto em larga medida por admiradores laicos, progressistas e críticos do fundamentalismo religioso, é fria, por vezes, entremeada por vaias.

Muitos entendem essa escolha uma provocação deslocada, uma suposta concessão ao bolsonarismo, dado o histórico apoio evangélico à extrema direita. No entanto, essa leitura é, para dizer o mínimo, apressada e míope. Caetano não cede ao senso comum, mas propõe, pela via da música, uma reflexão profunda sobre escuta, alteridade e a complexidade da experiência religiosa no Brasil.

Reduzir os evangélicos à caricatura do reacionário militante é ignorar a pluralidade real e histórica desse campo e, no atual estado de coisas, incentivar a radicalização de muitos grupos.

Kleber Lucas, pastor batista, negro, progressista e oriundo de comunidade periférica no Rio de Janeiro (RJ), é um exemplo eloquente da riqueza que existe dentro do universo evangélico. Sua trajetória, marcada por pontes entre tradições religiosas, pelo respeito às culturas de matriz africana e pelo compromisso com a justiça social, destoa da retórica de ódio que contaminou setores das igrejas.

Quando Caetano escolhe cantar Kleber, ele o faz com plena consciência: não por ignorância sobre a força do bolsonarismo entre evangélicos, mas justamente para resgatar, em meio ao ruído, vozes que dissonam e que são invisibilizadas. Há, portanto, um erro estratégico e moral no impulso de vaiar Caetano. Rejeitar a canção e a sua proposta é rejeitar o convite a enxergar o outro em sua inteireza, com suas contradições e insurgências internas.

Ao zombar da religiosidade popular, sobretudo quando encarnada em sujeitos negros, pobres e periféricos, setores do campo progressista acabam por reproduzir o elitismo que denunciam e contribuem, inadvertidamente, para o isolamento de milhões de brasileiros.

O abandono simbólico das massas evangélicas, tratadas como um bloco homogêneo e retrógrado, é uma das razões pelas quais a extrema direita tem conseguido monopolizar esse campo. A política, afinal, não se faz só com razão: exige também empatia, imaginação e capacidade de escuta.

Cantar Kleber Lucas em um palco para o público majoritariamente progressista é, da parte de Caetano Veloso, um gesto político potente e perigosamente mal compreendido. Se a esquerda deseja cativar um público maior, precisa deixar de lado o conforto da superioridade moral e compreender, com generosidade e estratégia, a religiosidade do povo.

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