O Banco Central (BC) apertou o freio na economia: elevou a taxa Selic para 14,75% ao ano, o maior nível em duas décadas. A medida é uma resposta direta à inflação que insiste em pesar no bolso do brasileiro, hoje em 5,48% – bem acima da meta oficial de 3% ao ano. Mas o que isso significa, na prática, para quem está longe dos gabinetes e mais perto do supermercado?
A lógica é simples. Quando os juros sobem, pegar dinheiro emprestado fica mais caro. Com isso, as pessoas compram menos e as empresas ficam com mais dificuldade para investir. A ideia é esfriar a economia e, assim, conter a alta dos preços. É um remédio amargo, mas, segundo a teoria, é necessário para manter a inflação sob controle e preservar o poder de compra.
Além disso, essa alta torna o Brasil mais atraente para investidores internacionais. Com juros mais altos, aplicações em reais se tornam mais lucrativas, o que ajuda a valorizar o real frente ao dólar – algo que também influencia no preço de produtos importados.
Apesar de a medida ser um esforço claro para conter a inflação, há uma pedra no caminho: os gastos do governo. Enquanto o BC tenta conter a circulação de dinheiro, políticas públicas que aumentam os gastos, como benefícios sociais ou estímulos ao consumo, podem ir na direção contrária, criando um conflito entre a política monetária (juros) e a política fiscal (gastos públicos).
Isso é chamado de paradoxo da política econômica. Traduzindo: é como tentar enxugar o chão com a torneira aberta. Se o governo gasta muito sem compensar esse aumento com receitas, a dívida pública cresce, o risco de descontrole fiscal aumenta e a inflação pode voltar com força. Nesse caso, o BC pode ser forçado a manter os juros altos por mais tempo – o que prolonga o aperto, ou a inviabilidade, para todos.
Nem todo mundo consegue “evitar dívidas” ou “planejar melhor”, como tanto se recomenda. Para milhões de brasileiros, o salário acaba antes do fim do mês e o cartão de crédito vira a única saída. Nesse cenário, o aumento da Selic é especialmente cruel.
Seguem dicas: o rotativo do cartão é uma das formas de crédito mais caras do mercado. Com juros altos, a dívida cresce em ritmo acelerado. Quem está no rotativo deve, se possível, buscar alternativas, como um empréstimo com taxas menores, por exemplo, o consignado. Fale com o seu gerente do banco para trocar dívida cara por dívida menos cara.
As compras parceladas aliviam o mês, mas podem virar armadilhas. Em tempos de Selic alta, o parcelamento costuma embutir juros cada vez mais altos. Vale fazer as contas antes de fechar a compra – e evitar parcelar bens de consumo não essenciais. Se a renda já está comprometida, negocie. Muitos bancos estão mais abertos à renegociação, especialmente diante de cenários tão desafiadores. Não hesite em buscar condições melhores para alongar ou reorganizar suas dívidas.
Sempre procure orientação. Há programas de educação financeira gratuitos que podem ajudar a organizar o orçamento e tomar decisões mais conscientes, como os oferecidos pelo BC, por cooperativas de crédito e até na internet, mas é preciso cautela com as ajudas buscadas na rede, já que aparecer pessoas que aproveitam dessa fragilidade para te vender soluções mágicas que, da noite para o dia, prometem “transformar a sua vida financeira”.
Para todos – mesmo quem não está endividado – a nova Selic tem efeitos imediatos:
- Rotativo do cartão de crédito e cheque especial: os juros ficam ainda mais pesados. Pague o total da fatura. Nem que seja com um outro empréstimo, como disse anteriormente, “menos caro”;
- Financiamentos e compras a prazo: o custo aumenta. Reavalie o momento e a prioridade;
- Compras do dia a dia: a inflação ainda está presente. Vale comparar preços, trocar marcas e cortar excessos. Evite compras impulsivas;
- Investimentos: o momento favorece aplicações conservadoras como Tesouro Selic ou CDBs de liquidez diária, que rendem mais com a Selic alta.
O Banco Central já deixou claro que, se a inflação não ceder, os juros podem subir mais. Mas manter a Selic nas alturas por muito tempo traz seus próprios riscos, como frear demais a economia e afetar o emprego.
O equilíbrio entre segurar os preços e cuidar das contas públicas é delicado – e fundamental para que a economia volte a crescer sem penalizar ainda mais quem já está no limite. Enquanto isso, o brasileiro segue entre o aperto e a esperança. Os pensamentos de ordem continuam sendo os mesmos: lucidez e decisões conscientes.