É inaceitável tolerarmos que as normas de trânsito sejam aplicadas apenas para garantir a segurança de alguns
O trajeto de 58 quilômetros entre Campo Grande e o distrito de Anhanduí transformou-se em “rota do perigo” para quem depende de transporte coletivo urbano. Os passageiros são obrigados a viajar em pé e no veículo superlotado, como mostra reportagem do Correio do Estado de hoje. É inaceitável tolerarmos que as normas de trânsito sejam aplicadas apenas para garantir a segurança de alguns. Qualquer condutor sabe que a probabilidade de sofrer ferimentos mais graves aumenta caso circule pelas estradas sem cinto de segurança. Pode ainda ser multado. Mas, para quem está no transporte coletivo, nada disso importa. Há tolerância e displicência inaceitáveis, pois, em nome de economia para as empresas vidas são colocadas em risco diariamente.
O problema começa na nossa legislação, permissiva com esse tipo de excesso. O Código Brasileiro de Trânsito estabelece, em seu artigo 231, penalidades - incluindo multa e retenção do veículo - que estiver com lotação excedente. Mas, não disciplina quantidade, regulamentação que é feita em cada estado ou município. Em Mato Grosso do Sul, ainda em 1998, foi aprovado regulamento do serviço de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros, onde consta no artigo 55, que “não será permitido o transporte de passageiros em pé...”, salvo em algumas exceções, como prestação de socorro, acidente ou avaria, e períodos de demanda incomum. Porém, nesse mesmo artigo, abre-se a tolerância: admitindo o excesso de lotação nas linhas com características urbanas, condicionado ao uso de ônibus urbano e à utilização de tarifa diferenciada.
Seria importante promover debate sobre essa revisão da legislação, algo que poderia garantir mais direitos aos passageiros que diariamente passam sufoco no trajeto de Campo Grande até Anhanduí e, inclusive estender o benefício a moradores de outros municípios. Assunto relevante para ser colocado em pauta pelos nossos deputados estaduais, considerando o trecho de rodovia, e também pelos vereadores, pois é preciso impôr limites coerentes à lotação dos veículos na área urbana, Ainda, é imprescindível cobrar do Consórcio Guaicurus a qualidade prometida à época da formalização do contrato, algo que não deve corresponder a esse transtorno frequente.
Antes, esse trecho era de responsabilidade de outra empresa, responsável por linhas de transporte intermunicipal. Depois, passou ao Consórcio Guaicurus e termo aditivo assinado durante a gestão anterior assegurou a redução de 71% no valor da tarifa. É preciso esclarecer detalhes desse acordo, inclusive se as questões básicas de conforto e segurança foram asseguradas.
O transporte coletivo urbano continua sendo alvo de reclamações frequentes e melhorias só estão sendo assegurados mediante acordo para isentar as empresas de imposto, como ocorreu recentemente no acordo para reformas de terminais. A substituição de vários ônibus, que demorou a ser feita, era apenas obrigação em razão da idade da frota.
Trabalhadores que, diariamente, deslocam-se pelas rodovias não podem continuar desamparados. Por isso, a importância de debater normas reguladoras para garantir que a lei de trânsito não assegure proteção apenas para alguns.