Filho, lembra quando você era pequeno, uns sete anos, talvez, e viu uma gravura da Bíblia, que ficava sempre aberta sobre um suporte de bronze no bufê da sala de jantar?
Fui ver a referência, era um quadro do pintor inglês Briton Rivière, representando Daniel na cova dos leões. Daniel de costas para as feras, olhando para o alto, de onde viria o seu socorro, magro, numa túnica de veludo vinho.
Os leões, eram sete, eximiamente desenhados, andando ao redor de si mesmos, de suas caudas, soberbos em sua aristocracia radiante. Lembra, filho? Você disse: “Tenho medo de leões. Como esse homem escapou? Foi milagre?”. E suas mãozinhas apalparam a iluminura dourada.
E agora, filho, que tantos anos se passaram, sou eu que lhe pergunto: “Você tem se deparado com aqueles leões de apetites vorazes? Eles se transformaram de bestas ferozes em animais dóceis e amigáveis?
Você tem controle sobre seus instintos, sobre sua natureza? Você se identifica com um leão? Os leões estão prestes a destroçá-lo com impetuosidade irascível, avidez cega, imposições brutais?
Você, como Daniel, em meio ao rigor e à tensão desses olhares felinos, dessas ambições de longo alcance, desses saltos e perigos mortais, desses impulsos pervertidos e despóticos, dessa pressão de necessidades e ardores vitais, tem permanecido íntegro? Sairá ileso da cova?
Sonhos e visões você sempre teve. Isso poderia ter sido base para sua fé. Aquele Deus de Daniel o livraria do fosso profundo. Levaria você do poço ao pico.
Demonstraria seu poder de autoridade e libertação. Alertaria para que você atuasse com eficácia nas situações difíceis e desesperadoras. Prepararia sua mente para as crises e, dentro da história do mundo e de seus impérios, ecoaria a nota retumbante e profética de seu próprio destino.
Perdoe, filho, naquele dia eu deveria ter-lhe dito a verdade. A ordem tirânica é sempre a mesma para todos:
_ Seja jogado na cova dos leões.