A utilização da coisa pública para fins espúrios parece ter se tornado a regra geral em nosso país. Portanto, nenhuma foi a novidade sobre a situação de crise ética e financeira pela qual passa nossa capital atualmente.
Como “medida milagrosa” para sanar todos os problemas de nossa municipalidade, a atual administração anunciou a demissão imediata de todos os servidores comissionados, muitos dos quais foram nomeados legalmente, na forma do artigo 37, II, da Constituição Federal (CF).
Nos termos de nossa Constituição Federal, assim como a contratação, a exoneração dos servidores ocupantes de cargo em comissão é de livre escolha do administrador público, é o que se conhece por demissão ad nutum. Não se questiona aqui a atitude do chefe do Executivo municipal, pois, como dito, a demissão dos comissionados trata-se de prerrogativa legal do administrador; todavia, pergunta-se: tal privilégio de exoneração ad nutum pode negar direitos fundamentais e inalienáveis de todo cidadão?
Os servidores comissionados não têm direitos a verbas indenizatórias trabalhistas, mas possuem direito ao pagamento de parcelas remuneratórias devidas na exoneração (férias não gozadas, férias proporcionais, adicional de 1/3 de férias, 13º salário proporcional, etc.), devendo ser quitadas no mesmo mês da demissão, conforme o Estatuto do Servidor Público Municipal (Artigo 299, da Lei Complementar nº 190, de 22 de dezembro de 2011).
Contudo, a administração municipal não observou a lei, exonerando todos os servidores comissionados sem efetuar quaisquer pagamentos das verbas legalmente devidas. Tais verbas não são privilégios dos servidores em comissão, mas direitos de todo servidor público; em verdade, de todo cidadão brasileiro empregado, pois, por força da Constituição Federal, são direitos inalienáveis (que não podem ser cedidos, trocados ou vendidos) e sociais fundamentais (objetivam a proteção da dignidade do trabalhador): o 13º salário e as férias acrescidas de 1/3 na remuneração. Tais direitos são garantidos aos servidores públicos efetivos e comissionados, por expressa disposição constitucional (artigo 39, §3º, da CF).
A Constituição Federal é a Lei Fundamental de nosso país, o que significa que, acima dela, nenhuma lei é mais forte; e, abaixo dela, todos, sejam leis, sejam cidadãos, sejam políticos, devem obedecê-la. Assim, que não pode a administração municipal simplesmente retirar o sustento dos servidores em comissão, sobre a genérica premissa de que estes seriam responsáveis pela situação execrável de nossa Capital, sem pelo menos lhes garantir as indenizações mínimas que são devidas, até para aquele trabalhador que é demitido por justa causa, desrespeitando, desta forma, a Norma Fundamental brasileira.
O que não se pode tolerar é que todos os servidores em comissão sejam nivelados por aqueles que foram desonestos ou fantasmas, e assim justificar a retirada da dignidade daqueles servidores comissionados que trabalharam com integridade e dedicação, tornando morto aquele que é o objetivo principal de nossa Democracia, a proteção à dignidade da pessoa humana.
A Suprema Corte, no julgamento do Inquérito nº 2.577, já se manifestou em idêntica situação: “[...]O 13º salário, as férias e o adicional de 1/3 de férias são direitos previstos na Constituição, devidos tanto ao trabalhador regido pela Consolidação das Leis do Trabalho quanto ao servidor público ocupante de cargo efetivo ou não. Portanto, negar ao servidor comissionado o recebimento de tais parcelas, quando de sua exoneração, lesiona direito fundamental do trabalhador, infringe as normas estabelecidas pela Consolidação das Leis do Trabalho e dá azo ao enriquecimento sem causa da Administração Pública”.
Com o devido respeito àqueles que pregam sobre a Supremacia do Interesse Público sobre o Privado, mas não se pode ignorar o mais essencial dos princípios, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, ou seja, os comissionados são trabalhadores e também são parte do povo no plano social, também pagam tributos, possuem os mesmos direitos de todos os trabalhadores, separados dos ímprobos e oportunistas, não merecem pagar em dobro pela falência da máquina pública.
E se fosse com você?