“A vida é o mar por onde navegamos” – Padre Manoel da Nóbrega
Quando tinha apenas oito anos, fui separada de meus pais e entregue ao internato das salesianas do Ginásio Juvenal de Carvalho, em Fortaleza, aos cuidados especiais da diretora, irmã Luizinha Denegri, por quem nutro até hoje carinho especial.
A ela devo o apelido de Glorinha, por me achar muito pequenina para carregar o nome de Maria da Glória, que lembrava, segundo ela, era o de uma Rainha de Portugal. Minha primeira experiência em um internato foi bem diferente daquelas narradas nos romances ingleses tipo “Jane Eyre”.
Em 1939, segui num navio do Loyd brasileiro rumo a Campo Grande, de passagem pelo Rio de Janeiro, para continuar o curso ginasial, onde conheci a salesiana que representa uma das maiores influências em minha vida: irmã Josefina Di Sano.
Pequenina, mas dona de singular inteligência e capacidade de conhecimento em línguas e ciências físicas e naturais, além de estranho dom de despertar o interesse nas meninas pelas matérias do currículo, por mais complicadas que fossem.
Lembro-me da primeira vez em que a vi encostada na porta na sala da aula, encaminhando as alunas para a prova cujas questões eu ignorava completamente.
Meus doze anos desataram rosários de lágrimas, e, ao percebê-las, abraçou-me comovida e soprou-me cada uma das respostas. Foi uma lição de amor fraterno, que guardei no coração pela vida inteira e transformou-me numa de suas melhores alunas e amiga, nas disciplinas ministradas pela irmã Josefina.
Em 1942, como não havia segundo grau em Campo Grande, fui, desta vez num trem, enviada a novo colégio salesiano, o Colégio Santa Inês, para ali fazer o Curso Clássico. Subi, sozinha, as escadas do enorme edifício, com o temor de quem penetra num castelo da Idade Média.
O tempo foi desfazendo os temores e gerando novas conquistas. Conheci novas salesianas, que se tornaram responsáveis pelo muito do que sou até hoje, em termos de conhecimento e amor à vida.
Às vezes me surpreendia com o que teria levado aquelas mulheres a terem abandonado o que representava de melhor em suas vidas, para se entregarem à educação, a Deus, à pretensão de riquezas e vaidades por que lutam os demais e concluírem na força da vocação, da entrega a uma vida bem melhor que a nossa.
Cito apenas três que guardo como pérolas preciosas na minha formação: irmã Maria José Duarte, uma freira quase ascética, responsável pelo meu encaminhamento às veredas da literatura; irmã Olga de Sá, a qual foi minha maior amiga nos tempos de colégio e, depois, entrou para a congregação, é hoje autora de livros, revistas e com quem me correspondo, sorvendo a sabedoria de sua inteligência e de sua alma.
Finalmente, irmã Nilde Tissot, minha assistente, com quem me correspondi durante longos anos, quando a reencontrei em Manaus, onde trabalhou até morrer. Irmã Nilde me ajudou muito nos caminhos espirituais. Essas três continuam a me dar a certeza de que a vida é uma aventura sem sentido, se não a levarmos com sabedoria e decisão na certeza de que a existência só vale a pena se tomamos as rédeas de coragem em direção à eternidade.
Presto minha homenagem a quem, até hoje, de forma generosa e com muita dedicação, me ensina o alfabeto do viver: irmã Luizinha Denegri, irmã Josefina Di Sano, irmã Maria José Duarte, irmã Olga de Sá e irmã Nilde Tissot. A elas, a minha eterna gratidão.