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Michelle Shayo: "Logística reversa como solução para ampliar a reciclagem"

Diretora de Relações Governamentais da Owens Illinois

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Muito tem se falado sobre consumo consciente e descarte adequado do lixo. Iniciativas sustentáveis são observadas em diferentes cidades no mundo e sinalizam uma forte tendência a novos hábitos de vida, novas formas de comprar, morar e adquirir serviços. Aos poucos, o homem tem percebido que o consumo desenfreado esgotará, em algum momento, os recursos naturais e se tornará insustentável.

A reciclagem de resíduos sólidos é a solução mais inteligente e financeiramente viável para controlar o volume de lixo acumulado em aterros sanitários e o descarte inadequado no meio ambiente. Além das vantagens ecológicas, a reciclagem gera também economia nos custos de produção, pois exige menos insumos e energia no processo. Outro fator positivo é a geração de renda a catadores e cooperativas de reciclagem.

O caco também permite à indústria de vidro ter mais eficiência energética e menos emissão de gases de efeito estufa: a cada 10% de cacos colocados nos fornos, são reduzidos, em média, 2,9% do consumo de energia elétrica e 5% das emissões de gás carbônico na atmosfera.

O Brasil, no entanto, ainda possui entraves para o bom funcionamento da logística reversa dos materiais, isto é, o caminho que o lixo percorre até ser transformado em algo novo de novo. O vidro, por exemplo, é o único material infinitamente reciclável, o que significa que pode ser usado para refazer o mesmo produto diversas vezes, uma vez que 1 quilo de cacos de torna 1 quilo de vidro novo. Nossos índices de reciclagem, porém, ainda são baixíssimos em comparação a países da Europa.

A grande dificuldade está no retorno desses cacos à indústria, que acontece por um conjunto de fatores motivadores, como a falta de conscientização da população para o descarte adequado do vidro, pouca efetividade das políticas públicas de coleta seletiva e educação ambiental e, por último, problemas na estruturação das cooperativas, tanto no que diz respeito à infraestrutura quanto à formalização.

Diante do cenário problemático da logística reversa do vidro, algumas empresas e organizações sem fins lucrativos têm encontrado juntas alternativas para solucionar o impasse e promover a destinação adequada do material de ponta a ponta. Projetos como o realizado pelo Instituto Ecozinha, no Distrito Federal, mostram que é possível mudar a situação ecológica de uma região reduzindo a quantidade de lixo no meio ambiente. A iniciativa propõe uma solução simples e financeiramente viável, que é disponibilizar bunkers para estabelecimentos de alimentação (bares, restaurantes, lanchonetes) depositarem as embalagens de vidro usadas no dia a dia. Essas embalagens são, posteriormente, recolhidas e enviadas para reciclagem.

Cada depósito tem capacidade para receber até 800 quilos de vidro. Eles são estrategicamente instalados próximo aos estabelecimentos parceiros, de modo a facilitar o descarte adequado das embalagens.

O objetivo do projeto é incentivar o gerenciamento de resíduos e permitir que esses locais possam se adequar à Lei dos Grandes Geradores de Lixo, que prevê responsabilidade aos estabelecimentos que produzem mais de 120 litros de lixo por dia. Bares, restaurantes e lanchonetes que estiverem enquadrados na regra devem ficar responsáveis pelo próprio descarte. A iniciativa é inteiramente apoiada por instituições privadas. Os estabelecimentos interessados podem se credenciar junto ao Instituto Ecozinha e contribuir com uma taxa de manutenção mensal. Também participam obrigatoriamente de um programa de compostagem de resíduos orgânicos.

Temos muito ainda a percorrer no caminho para a sustentabilidade, mas estimular o pensamento consciente da população é o primeiro grande passo a ser dado. Podemos, sim, melhorar os índices de reciclagem no País. Temos de agir de forma consciente e fazer a melhor escolha para o meio ambiente e para a sociedade.

Ações como essa, mesmo que incipientes, atuam em seus microcosmos e não representam solução completa. Ainda é necessária a ação em cadeia de todos os agentes por meio de mais projetos e campanhas que estimulem a logística reversa. O ciclo positivo se inicia com a oferta maior de cacos e mais cooperativas de catadores envolvidas. Quanto maior o volume de reciclagem, melhor para o meio ambiente.

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O que tem para dizer o MPF?

19/11/2024 07h45

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O que há de ser entendido no silêncio que o Ministério Público Federal (MPF) adotou – quando se calou e se mantém calado – diante da solução que os governos federal e estadual encontraram para pôr fim ao caso da Terra Indígena (TI) Ñande Ru Marangatu, em Mato Grosso do Sul?

Como é sabido, a questão abarcava conflitos violentos que vinham acontecendo há décadas entre indígenas e não indígenas. Esses conflitos foram desencadeados a partir da instrução do processo administrativo em que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) demarcou – pela ocupação indígena em passado remoto que ela mesmo declarou – um território inteiro de terras particulares em Antônio João, até então, integralmente ocupado, possuído e explorado há quase um século por seus respectivos proprietários. 

O que amparava esses conflitos era a teoria do indigenato, de 1912, do ministro João Mendes, que pela ocupação indígena em passado remoto identificou a TI Ñande Ru Marangatu. Essa forma de identificação de terra indígena tem sido a causa das incontáveis invasões indígenas às terras particulares que ocorreram e que ocorrem todos os dias em MS e em muitas regiões do território nacional.

Lado outro, a Comissão Especial de Autocomposição do Supremo Tribunal Federal (STF) homologou o acordo, o que leva concluir que a mais alta Corte de Justiça concorda com esse modus operandi de se identificar terras indígenas e o adota, como se tanto fosse possível, na solução das causas que julga envolvendo matéria indígena. O exemplo mais recente envolve o julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.017.365/SC.

Aliás, a Corte faz confusão quando identifica terras indígenas. Ora adota a teoria do indigenato, ora adota a sua própria interpretação, proclamada na assertiva de que a “configuração de terras ‘tradicionalmente ocupadas’ pelos índios já foi pacificada com a edição da Súmula nº 650, que dispõe: ‘Os incisos I e XI do art. 20 da Constituição Federal não alcançam terras de aldeamentos extintos, ainda que ocupadas por indígenas em passado remoto’”.

Notadamente, o STF relativizou ainda mais o direito de propriedade constitucional diante da matéria indígena, proclamando que, uma vez constatada a ocupação indígena em passado remoto, não há que se invocar o direito de propriedade, o título translativo nem a cadeia sucessória do domínio como defesa. Em resumo, o posicionamento extremo do Supremo é de que a ocupação indígena – seja ela presente, seja ela em passado remoto (indigenato) – define a terra indígena da União. 

A seu turno, por que o MPF – ferrenho defensor dessa ordem jurídica – deixou que os governos federal e estadual pagassem aos particulares pelas terras indígenas que ocupavam e exploravam no distrito de Campestre, em Antônio João? Com a palavra, o MPF em Mato Grosso do Sul!

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A resiliência e a fé

19/11/2024 07h30

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Os desafios diários enfrentados por quem atua na proteção da natureza têm se tornado uma enorme prova de resistência e fé. As condições climáticas extremas, impulsionadas pelas altas temperaturas, ameaçam nossas reservas com o fogo e penalizam a fauna e a flora – já impactadas pela reincidência de incêndios violentos desde 2020.

Percebo que a fauna enfrenta o pior processo de extinção desde o período em que conseguimos a vitória no controle da caça, do tráfico de animais silvestres e da pesca predatória na década de 1980. O cenário atual é de destruição de habitat natural, em que espécies estão sendo dizimadas de forma assustadora, especialmente répteis e insetos. As chamas estão tão intensas que, somadas aos ventos fortes, invadem todos os lugares: locas, copas das árvores, etc, persistindo por meses de forma impiedosa.

Não há dúvidas de que estamos perdendo essa batalha. Somente neste ano já ultrapassamos os 3 milhões de hectares queimados. Esse trágico número foi alcançado mesmo com o empenho de recursos financeiros nas ações de combate, que certamente superam R$ 1 bilhão – entre os investimentos dos governos federal e estadual.

Nunca tivemos – em um histórico de 40 anos – uma infraestrutura de combate tão ampla, incluindo recursos humanos, equipamentos de logística, helicópteros, caminhões e embarcações. É importante destacar o trabalho pioneiro da Famasul, que contabiliza os prejuízos na produção das fazendas no Pantanal, já ultrapassando R$ 50 milhões.

Como podemos ser mais eficientes se nossa capacidade financeira já extrapola seus limites dos desafios e a força humana se mostra insuficiente, em algumas situações até incapaz? Estamos enfrentando algo sem precedentes e que excede nossa capacidade de resposta.

Não devemos nos omitir na identificação dos responsáveis. Eles existem, embora sejam poucos. Ainda assim, acredito que não haverá melhoras significativas na questão comportamental apenas com multas milionárias e possíveis prisões. 

A experiência de outros países, como Portugal e Austrália, nos indica que o ímpeto punitivo não traz uma solução completa. Esses países já lidam com incêndios gigantescos e perdas de vidas humanas em virtude deles há mais de 20 anos.

O mais impressionante – e certamente mais doloroso que as próprias chamas – são as acusações equivocadas e a ignorância de alguns que associam o crescimento dos incêndios às reservas de proteção. Ao contrário, as poucas áreas protegidas no Pantanal (menos de 5%) têm estruturas para evitar incêndios e ações preventivas em seus planos de trabalho, como a presença de brigadas.

Podemos reduzir a escalada dos incêndios ano após ano se implementarmos outras estratégias que não se restrinjam ao combate ao fogo, mas que incluam 
a prevenção. Devemos reconhecer que nossos planos atuais não estão trazendo os resultados esperados e que não será somente o aumento dos investimentos financeiros que nos trará a solução.

O ponto crítico é como um dos biomas mais preservados (cerca de 85%) passou a ser um grande emissor de gás carbônico no País. Os fenômenos naturais são impactados negativamente pelas condições climáticas extremas. Essa situação ameaça nosso bioma e exige novas estratégias que unam ciência e competência para enfrentar esses fenômenos sem precedentes.

Restaurar ao proprietário formas de manejo do fogo pode ser uma alternativa. Eles podem ajudar. Ao mesmo tempo, com mais tecnologia e grupos de ação de combate ao fogo, equipados com boa logística e equipamentos adequados, podemos reduzir o tempo de resposta. Não podemos desistir e precisamos ter fé e resistência para rever nossa relação com o planeta.

Poderíamos, em um gesto responsável, olhar e fazer algo pela nascente do Rio Paraguai. Não sou pessimista, mas talvez apenas a desesperança e o senso de urgência possam nos salvar.

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