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O IPCA de abril e os sinais da economia brasileira

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No acumulado de 12 meses, o índice chegou a 5,53%, bem acima do centro da meta de inflação estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que é de 3%, com margem de 1,5 ponto porcentual. Isso, por si só, já reforça a necessidade de vigilância, sobretudo em um cenário em que a política monetária segue rígida, com a taxa Selic recentemente elevada a 14,75% ao ano, maior patamar em quase duas décadas.

Mas não é só a magnitude do índice que importa. A composição da inflação de abril é ainda mais reveladora. O grupo de alimentação e bebidas teve alta de 0,82%, puxado por alimentos básicos do dia a dia do brasileiro, como a batata-inglesa (18,29%), o tomate (14,32%) e o café moído (4,48%). São itens que impactam diretamente o orçamento das famílias, especialmente das mais pobres. Além disso, saúde e cuidados pessoais subiu 1,18%, influenciado pelos reajustes autorizados nos medicamentos no fim de março.

Em contraste, o grupo transportes apresentou queda de 0,38%, com destaque para a retração de preços das passagens aéreas e combustíveis. Essa dinâmica de forças opostas é típica de períodos de transição de política monetária, em que o freio nos setores mais sensíveis aos juros ainda coexiste com pressões estruturais e sazonais que seguem empurrando o índice para cima.

É nesse ponto que a análise econômica precisa ir além da planilha. A inflação é um fenômeno complexo que reflete múltiplas camadas: choques climáticos, gargalos logísticos, preços administrados, dinâmica salarial e expectativas. E é justamente por isso que o IPCA de abril não pode ser lido como um simples número: ele é um sinal de alerta sobre a dificuldade do País em ancorar suas expectativas inflacionárias e convergir de forma sustentável para a meta.

A atuação do Banco Central (BC), por meio da taxa de juros, é apenas uma parte da resposta. Ainda que a elevação da Selic tenha por objetivo conter a inflação futura, ela não opera em um vácuo. A credibilidade das políticas fiscais, a previsibilidade institucional e a maturidade das reformas estruturais também têm peso na formação de preços e nas expectativas dos agentes.

Por fim, há uma dimensão social que não pode ser ignorada: uma inflação que recai com mais intensidade sobre alimentos e medicamentos é, em essência, uma inflação regressiva. Ela corrói o poder de compra onde ele já é mais frágil. O IPCA de abril nos lembra que, mais do que um índice técnico, estamos diante de um fenômeno que afeta a vida das pessoas, que impõe escolhas difíceis às famílias e que desafia a atuação coordenada do Estado.

É preciso escutar o que o IPCA está dizendo. Ele fala não apenas sobre preços, mas sobre o momento econômico do País, sobre os caminhos que estamos trilhando e sobre os ajustes que ainda precisam ser feitos para que o crescimento sustentável não fique eternamente adiado.

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Editorial

Fato e opinião: diferença que sustenta a verdade

Separar fatos de opiniões é mais do que um exercício intelectual, é um passo necessário para preservar a democracia, a informação qualificada e a própria lógica

16/05/2025 07h15

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Uma das distinções mais fundamentais no campo do jornalismo – e também na vida em sociedade – é a que separa fato de opinião. O fato é uma informação objetiva, passível de verificação por meio de documentos, registros ou observações. Não depende da visão de quem relata. Já a opinião é uma interpretação subjetiva, vinculada a crenças, sentimentos ou julgamentos individuais. O fato pode ser checado; a opinião, debatida. No entanto, essa diferença essencial parece cada vez mais ignorada.

Vivemos um tempo de confusão cognitiva coletiva, em que muitas pessoas têm dificuldade de identificar o que é constatação e o que é interpretação. Esse problema é agravado por redes sociais, onde os conteúdos circulam sem mediação e sem compromisso com a verdade. Notícias falsas, opiniões disfarçadas de fatos e discursos sem base concreta ganham o mesmo espaço – e o mesmo peso – que análises técnicas e dados verificados.

Por isso, nesta edição, destacamos um fato: desde que a Lei do Pantanal foi sancionada, o desmatamento no bioma caiu. A queda registrada é, inclusive, a maior entre todos os biomas brasileiros. Trata-se de um dado objetivo, apurado por fontes técnicas de monitoramento ambiental. Independentemente da opinião de qualquer grupo político, setor econômico ou indivíduo, o resultado é mensurável: o ritmo de supressão vegetal diminuiu.

É interessante observar que a lei foi aprovada justamente em um contexto de alta no desmatamento, ou seja, ela foi uma reação a uma realidade ambiental crítica. E teve efeito concreto: com regras mais claras, restrições maiores e monitoramento por satélite, ficou mais difícil desmatar. A legislação passou a funcionar como uma barreira efetiva à destruição do bioma, e os números refletem isso.

É claro que há quem discorde da existência da lei, de seu conteúdo ou de sua rigidez. Isso é opinião, e opiniões são bem-vindas – desde que reconhecidas como tal. O que não se pode fazer é negar o efeito que uma norma mais rígida teve sobre o desmatamento. Isso não é mais uma questão de perspectiva, mas de evidência.

A legislação ambiental, como se vê, não é inimiga da produção ou do desenvolvimento. É instrumento de equilíbrio e de ordenamento. E, quando ela funciona, como agora no Pantanal, o resultado positivo é algo que precisa ser reconhecido como fato, não como narrativa.

Separar fatos de opiniões é mais do que um exercício intelectual, é um passo necessário para preservar a democracia, a informação qualificada e a própria lógica. Sem isso, corremos o risco de viver em um país onde qualquer crença pode se impor como verdade – ainda que desmentida pela realidade.

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Quando a esquerda vai voltar a ter pautas próprias?

14/05/2025 07h45

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Agora é essa conversa da camisa da seleção. Minhas redes sociais, cheias de amigos e conhecidos progressistas (dos lulistas aos marinistas, dos saudosistas aos pós-modernos), todos ulularam de satisfação: “Agora eu compro!”; “Vamos pra rua de camisa vermelha da seleção!”; “Quero ver a cara dos patriotas!”.

Gente, que pobreza de ideias é essa? Sou do tempo em que a gente comprava a camisa vermelha na barraquinha da Rua XV, junto com o broche do Henfil com a graúna indignando-se com alguma coisa. Mas na hora da Copa era a amarelinha ou a azul do manto de Nossa Senhora, a padroeira, porque futebol é crença e também é sofrimento.

Quem pautou essa bizarrice de tornar a sagrada camisa do penta em símbolo de passeata política foram os caras do “mito”. Uma tristeza, uma apropriação indébita, uma profanação cultural com o símbolo máximo do nosso futebol, envergada com galhardia por um Pelé, um Garrincha, um Gerson, um Rivelino, Tostão, Sócrates, Falcão, Júnior, Zico. Ah, tantos nomes gloriosos e inesquecíveis. 

A esquerda fica empolgada com essa peraltice da CBF porque perdeu o rumo de sua própria narrativa e vive hoje como a cacatua de uma tia minha, que só sabe repetir as palavras que ela ensina. Muito malandra, minha tia ensina frases para desconcertar as visitas, como “Já não está tarde, comadre?” ou “Ai, que tá na hora da minha novela!”. Essa última, minha tia jura que ela repete, mas nunca ouvi. De qualquer forma, achei genial. Para uma cacatua, não para as forças progressistas do País.

Será que acabaram as pautas? Estaremos mesmo com nossos problemas todos resolvidos e nos resta apenas ficar arengando com os bolsonaristas, respondendo às provocações deles? E olha que isso eles fazem muito bem. Esses dias, teve um vereador em Curitiba (PR)que disse que a Ku Klux Klan era contra as armas para os negros e (eita raciocínio louco esse!), por isso, os negros foram desempoderados. Tudo isso para defender uma homenagem aos CACs. E dá-lhe indignação na internet, mostrando o rostão do vereador, feliz e contente com o marketing indireto. 

O Brasil é um país de democracia deficitária. Tá tudo para ser feito – começando na escola, que deveria ter aulas sobre a Constituição como tem de Matemática. Ninguém tá satisfeito, porque nossa democracia é nota 6. Tá sempre passando raspando. Por isso, quem realmente se importa com ela deveria estar falando dela o tempo todo, sendo didático, lembrando das conquistas tão duramente alcançadas, como a saúde pública, a universidade pública, as políticas de atendimento aos mais pobres.

Mas também deveria estar falando do que falta, do que precisa ser feito, de como é importante garantir cidadania e bem-estar para todos e não só para os 140 mil que quase não pagam imposto. E tem de entender que conflito é da natureza da democracia e, por isso, criticar e ser criticado faz parte do jogo e que não dá para substituir um “mito” por outro, porque até os gregos já largaram mão desse negócio de mito há mais de 2.500 anos e a gente ainda fica nesse rame-rame.

O denuncismo sem proposta é, para dizer o mínimo, chato pra caramba. E há muito tempo os progressistas andam sem propostas visíveis. Sei que nos cursos de pós-graduação, nos fóruns acadêmicos e nas revistas especializadas circula muita ideia boa. Mas aqui no rés do chão, onde vivemos nós, simples mortais, na planície, é só baixaria, de todo lado. E agora tem mais essa história da camisa da seleção. Que tristeza!

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