Artigos e Opinião

OPINIÃO

Paulo Cabral: "Contra toda lama, democracia"

Sociólogo e professor

Redação

05/08/2015 - 00h00
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O noticiário sobre a Operação Lama Asfáltica dominou a pauta dos últimos dias, mostrando as ligações perigosas entre políticos, agentes públicos e empresários, e o modo como são desviados  os recursos financeiros que deveriam ser aplicados em favor do bem comum. Esses crimes  impedem a adequada e suficiente prestação de serviços à população e, no limite, podem provocar até a morte de cidadãos; todavia, a reação contra eles ainda é tênue, difusa. Essa quase indiferença talvez se dê porque o fato não apresenta nenhuma novidade, parece apenas a reprodução em âmbitos estadual e municipal daquilo que ocorre no plano federal, tão bem demonstrado pela Operação Lava Jato, centrada dos malfeitos da Petrobras e, agora, nos da Nuclebrás.

A corrupção, tudo indica, está entranhada de tal forma no tecido social, no teatro político, nas atividades produtivas, em suma, em todas as instâncias da sociedade, que já se confunde com o próprio modus operandi de se realizarem as mais comezinhas ações, privadas ou públicas. Vale dizer, ela transcende siglas partidárias, identidades religiosas, raciais ou de gênero, faixas etárias, penetrando toda a estrutura social, de forma avassaladora. Essa onipresença favorece a sua naturalização; é como se não houvesse outro jeito de agir ou governar senão levando vantagem em tudo, locupletando-se do erário público, em benefício próprio, contra todos.

 A consequência dessa trágica conjuntura desagua, predominantemente, em duas posturas alienadas que tendem a minar, ainda mais, a tenra Democracia brasileira. A primeira é o descrédito generalizado na classe política. Obviamente, há motivos sobejos para não se confiar em quem detém ou postula cargo eletivo, tamanha a desfaçatez com que os políticos conduzem os governos e debatem nos parlamentos. O arremedo de reforma política recém-votada é a prova cabal desse comportamento. A segunda é a expectativa ingênua de que o impeachment da presidente, magicamente, restauraria a ordem, promovendo o saneamento e a higienização das práticas políticas, desconsiderando que, se acontecer, o sucessor é o vice-presidente. Nessa guerra não há santos e o que menos importa são os princípios republicanos; na realidade, cada qual puxa a brasa para a sua sardinha, pensando  em faturar o máximo (em todos os sentidos), para garantir seus projetos pessoais de poder.

Ainda assim, é fundamental cerrar fileiras em defesa do ideário democrático. Quem viveu sob a ditadura sabe que a pior democracia é indiscutivelmente superior a todas as formas totalitárias de governo. Afinal, se é possível conhecer a extensão, os meandros, a estrutura da corrupção institucionalizada no setor público e nas empresas, é porque na Democracia existe liberdade de imprensa, órgãos de investigação independentes, Judiciário fortalecido, bases indispensáveis para a defesa da República. A prisão de empresários e políticos talvez possa trazer mudanças ao imaginário coletivo, mostrando que a impunidade não é tão absoluta quanto se supunha. Nessa perspectiva, ao se purgarem tantas mazelas, um passo é dado para se reverter essa situação. Mais do que nunca, é preciso cultivar a esperança, a grande arma de resistência  para as conjunturas sombrias.

Nas últimas eleições municipais, “o povo, que não sabe votar”, talvez tenha intuído toda a lama agora revelada pela Operação Lama Asfáltica, impedindo, pelo voto, que o esquema se perpetuasse. Não adiantou, a vontade popular foi atropelada pela Câmara de Vereadores, também enleada com o dito esquema. Resta agora a apuração de toda a verdade, oxalá a tempo de impedir que os “fichas-sujas” se candidatem novamente.

Editorial

As propriedades estão mais produtivas

O campo não é mais o mesmo, e os discursos sobre ele também precisam evoluir: o País mudou, e a política de acesso à terra precisa acompanhar essa mudança

20/05/2025 07h15

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Nas últimas décadas, o Brasil rural passou por uma revolução silenciosa, mas de impacto gigantesco: a produtividade no campo atingiu patamares históricos. Tecnologias de ponta, mecanização intensiva, biotecnologia e novas cadeias de produção tornaram obsoletos alguns dos argumentos mais repetidos por movimentos sociais, como o dos sem-terra, na década de 1990. Naquela época, a improdutividade era o principal combustível para as ocupações de fazendas. Propriedades que estavam “paradas” eram alvos legítimos – pelo menos no discurso – para fazer pressão por reforma agrária.

Hoje, o cenário é outro. As propriedades que não produzem são exceções. Com a valorização das commodities agrícolas e o crescimento da demanda mundial por alimentos, praticamente qualquer hectare de terra fértil se tornou economicamente viável. Não só para plantar soja ou criar gado, como no passado. Há uma nova geografia agrícola que inclui culturas como trigo, sorgo, eucalipto e mandioca e atividades como a suinocultura e a avicultura industrial. O campo virou negócio – e um bom negócio.

Essa transformação reduziu drasticamente a margem para que movimentos sociais reivindiquem terras sob o argumento de que estão ociosas ou improdutivas. Mesmo a retenção de grandes áreas para especulação imobiliária, que já foi um problema relevante, praticamente desapareceu. Quem tem terra, explora. E quem explora, gera emprego, paga impostos e movimenta a economia, além de, em muitos casos, estabelecer parcerias com a comunidade local e contribuir com infraestrutura e serviços.

Reportagem desta edição mostra um exemplo claro dessa nova realidade: uma fazenda extremamente produtiva, com papel fundamental na recuperação judicial de uma grande empresa, que, ainda assim, entrou na mira do movimento dos sem-terra. Trata-se de uma propriedade que cumpre sua função social com excelência, mas que, paradoxalmente, está sendo tratada como se fosse uma terra abandonada ou sem utilidade social. Isso revela um descompasso entre a retórica de alguns movimentos e a realidade do campo brasileiro.

Não se trata aqui de negar a importância histórica da reforma agrária ou o direito de grupos sociais de reivindicar melhores condições de vida. Mas é preciso reconhecer que o País mudou e que a política de acesso à terra precisa acompanhar essa mudança. Se o governo federal ainda pretende investir em reforma agrária, esse projeto precisa ser repensado, ganhar nova roupagem. É hora de se falar em uma “reforma agrária 2.0”.

Esse novo modelo não pode se basear apenas na distribuição de terras, mas deve envolver acesso a crédito, assistência técnica, logística, mercado e, acima de tudo, integração com a economia moderna do agronegócio. Não faz sentido redistribuir terras se os beneficiários não tiverem condições reais de transformá-las em unidades produtivas e sustentáveis. O fracasso de muitos assentamentos passados prova isso.

Por fim, é preciso retomar o verdadeiro significado do termo “função social”. Produzir alimentos, empregar pessoas, cuidar do meio ambiente e investir na comunidade também são atos sociais. A palavra “social” não pode ser sequestrada por discursos ideológicos. O campo brasileiro não é mais o mesmo, e os discursos sobre ele também precisam evoluir.

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ARTIGOS

Hábito de leitura no Brasil: como mudar o panorama atual?

17/05/2025 07h45

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A criação do hábito de leitura é um dos pilares essenciais para o desenvolvimento humano, especialmente durante a infância, já que estimula a imaginação, a empatia e o pensamento crítico. No entanto, com o avanço da tecnologia, essa prática tão importante vem sendo cada vez mais negligenciada, especialmente no Brasil.

De acordo com a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro, 53% dos brasileiros não leram livros em 2024, o que representa uma queda de quase 7 milhões de leitores em relação a 2019. Além disso, 73% da população não completou sequer uma leitura no mesmo ano.

Esses dados alarmantes reforçam uma urgência: o incentivo à formação de leitores desde a primeira infância, pois estamos perdendo leitores para as telas antes mesmo de se consolidar o processo de alfabetização. E essa responsabilidade deve ser compartilhada pelas escolas, pelas famílias e por toda a sociedade. Isso porque, o contato com a leitura é fundamental para o desenvolvimento social, emocional e pedagógico das crianças.

De concentração a percepção de si mesmo: crianças que têm contato frequente com os livros desenvolvem maior capacidade de concentração e foco. A leitura contínua estimula ainda o cérebro a manter a atenção por períodos mais longos, favorecendo também a memória de trabalho e a autorregulação, uma habilidade essencial para lidar com emoções como estresse e ansiedade.

Além disso, o envolvimento com diferentes tipos de texto fortalece habilidades cognitivas como observação, análise, síntese e interpretação. Crianças leitoras geralmente demonstram maior sensibilidade aos detalhes, melhor compreensão de contextos e mais agilidade na construção de inferências, competências fundamentais para a resolução de problemas e tomada de decisões ao longo da vida.

Já do ponto de vista emocional e social, a leitura também contribui significativamente para o desenvolvimento da empatia, da criatividade e da linguagem oral e escrita. Ao mergulhar em histórias, é possível se colocar no lugar do outro, ampliar o repertório cultural e construir sentidos sobre o mundo e sobre si mesmos. Por isso, o hábito de leitura deve ser cultivado não apenas como uma estratégia pedagógica, mas como um direito fundamental da infância.

Os desafios do mundo moderno: a presença constante da tecnologia incentivou o uso excessivo de telas, muitas vezes em detrimento de interações presenciais e experiências sensoriais. Essa exposição prolongada a dispositivos eletrônicos pode comprometer o desenvolvimento da atenção, da linguagem e da imaginação, todas capacidades essenciais para a formação de leitores.

Diante desse cenário, fomentar o gosto pela leitura torna-se ainda mais crucial. Promover uma relação afetiva e significativa com os livros ajuda a equilibrar os estímulos imediatos das telas com a profundidade e a concentração que a leitura exige e proporciona, sendo essa uma missão para as escolas e também para as famílias.

Inspiração e exemplo: os educadores devem atuar como mediadores e inspiradores, proporcionando ambientes acolhedores que incentivem a leitura por prazer. Isso pode se dar por meio de atividades como rodas de leitura, compartilhamento de histórias e projetos literários interdisciplinares. Já os familiares, precisam reservar um tempo para ler em voz alta, demonstrar interesse pelas histórias e limitar o uso de telas, especialmente antes de dormir.

Em suma, a formação de leitores e o cultivo do hábito de leitura são fundamentais para o desenvolvimento pleno de crianças e jovens. Afinal, esse é o caminho mais promissor para formar cidadãos críticos, sensíveis e preparados para transformar o mundo com ética, imaginação e esperança.

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