Como se sabe, em 30/04/2019 foi editada pelo Presidente da República a Medida Provisória da liberdade econômica que em 20/09/2019 foi convertida efetivamente em lei. A Lei nº 13.874/2019, ou simplesmente Lei da Liberdade Econômica, como vem sendo chamada, implementou significantes alterações no âmbito do Direito Empresarial, que por certo irão impactar diretamente a vida do empresário brasileiro.
Uma das alterações que pretendemos tratar no presente texto diz respeito à desconsideração da personalidade jurídica das empresas.
Segundo o Código Civil as empresas adquirem personalidade própria no momento em que arquivam seus atos constitutivos no registro competente, geralmente exercido pelas Juntas Comerciais. Com o devido registro então, não é mais a pessoa dos sócios quem contrata, compra, vende ou exerce qualquer outra atividade dita empresária, e sim a própria empresa – Pessoa Jurídica. E por consequência, é a própria PJ, com seus bens, a responsável por eventuais débitos. A isso, o Direito Empresarial dá o nome de autonomia patrimonial da pessoa jurídica.
A desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional em que se busca justamente desconstruir a autonomia patrimonial, para fazer com que os sócios respondam com seus bens pessoais por dívidas contraídas pela pessoa jurídica.
Anteriormente, o Código Civil, por meio de seu art. 50, exigia como requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica, a ocorrência de abuso da personalidade jurídica que poderia se dar por confusão patrimonial ou de desvio de finalidade. Contudo tratava do assunto de forma genérica, não explicando detalhadamente como e quando poderiam ocorrer tais situações.
Com o advento da nova Lei, foram inseridos cinco novos parágrafos no art. 50, que buscaram tratar dos requisitos (confusão patrimonial e desvio de finalidade) de maneira mais objetiva. Por exemplo, o parágrafo primeiro caracterizou o desvio de finalidade como “a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza” e afastou o entendimento de que a mera alteração do objeto social da empresa poderia caracterizar desvio de finalidade.
Por outro lado, a confusão patrimonial, foi tratada pelo parágrafo segundo, como a ausência repetitiva de separação de fato entre os patrimônios da pessoa jurídica e dos sócios da empresa.
Por fim, outra importante alteração se deu na parte final do texto do próprio art. 50, no sentido de que, a personalidade jurídica somente poderá ser desconsiderada com relação aos sócios ou administradores que tenham se beneficiado direta ou indiretamente pelo abuso da personalidade.
Bem da verdade, as alterações legislativas nada mais fizeram que inserir na lei entendimentos já consagrados pelo STJ, o que a nosso ver é favorável, especialmente por favorecer pequenos empresários da “ponta da cadeia”, que muitas vezes não dispõem de recursos para levar seus casos à Corte Superior.
É importante que se diga, que a “blindagem” oferecida pela autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é instrumento válido e lícito de incentivo à atividade empresária e à economia como um todo, pois permite que o empresário, antes de iniciar sua atividade, saiba quais os riscos e qual parte de seu patrimônio pode eventualmente perder.
Por tal razão nos parecem acertadas as alterações introduzidas pela Lei da Liberdade Econômica, vez que visam delimitar e especificar as ocasiões e situações em que a desconsideração da personalidade jurídica poderá de fato ocorrer, que como dito, deve se dar sempre de forma excepcional, preservando assim a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas.