Artigos e Opinião

OPINIÃO

Raul Spitz: "Falar sobre o suicídio é proporcionar vida"

Psicólogo e consultor pedagógico do Laboratório Inteligência de Vida (LIV)

Continue lendo...

Nos últimos anos, o Brasil observa um aumento significativo no índice de suicídios. Segundo o Ministério da Saúde, foram registradas, em 2016, 11.433 mortes desse tipo, o que dá uma média de 31 casos por dia – sem contar com os casos não registrados. Muitas questões atravessam esse tema, fazendo com que o tópico ainda seja deixado de lado em discussões importantes, principalmente no meio escolar, visto que crianças e adolescentes também são impactados.
O assunto passa pela cabeça de dez entre dez jovens na idade escolar. Alguns têm a oportunidade de falar entre si, outros apenas pensam sobre. Dados do Ministério da Saúde apontam que cerca de 20% das tentativas de suicídio registradas entre 2011 e 2016 foram de crianças e jovens entre 10 e 19 anos. Isso aponta para uma dura realidade: não são estimulados espaços oficiais na escola de trocas sobre os estranhamentos vividos pelos alunos.

A adolescência se inicia com o movimento pubertário de distanciamento, isolamento e crítica dos padrões do comportamento familiar, trata-se de um rito de passagem. Aquela criança que até então era protegida e dirigida pelo outro agora se encaminha para um adulto que precisará se cuidar, realizar e se responsabilizar por escolhas próprias. Um dos maiores desafios desse período é conquistar laços sociais com outras pessoas que façam com que o adolescente creia em sua existência presente e futura no mundo. É nesse momento de vida que o jovem desloca sua intimidade da família para os amigos reais ou idealizados, o que pode causar tristeza, nostalgia e saudade.

A exigência social é de que se atravesse essa etapa da forma mais bem-sucedida possível. Isso faz com que temores, dificuldades e estranhamentos, que também são comuns nesse momento, sejam represados. O que fazer então com tais sentimentos? A recomendação social é guardá-los para manter a imagem de que todos são sempre fortes, decididos e capazes de lidar com os problemas. Dessa forma, o jovem precisa encontrar maneiras de processar o acúmulo desse conteúdo emocional. No entanto, tudo que precisa ser reprimido pelo sujeito tende a virar angústia ou dor psíquica, logo sofrimento.

Outra característica do período da adolescência é uma mudança importante no registro da linguagem. A criança aprende com os outros ao redor todo o mecanismo da linguagem e seu protagonismo no ato de se comunicar com o mundo. Porém, ainda nessa fase, há a presença de interlocutores que se responsabilizam pela comunicação direta com o mundo e são responsáveis, como pais, irmãos, avós e até professores. Com a chegada da adolescência, a voz do indivíduo ganha, naturalmente, mais representatividade, dando à ferramenta da linguagem um lugar relevante na relação com os outros. Essa alteração de paradigma também pode causar desconfortos, como inibição, vergonha e isolamento, o que acarreta na eventual diminuição do uso da função linguagem.

Como resposta, o jovem pode recorrer a artifícios que acredita serem capazes de ajudá-lo com tais desafios. Um exemplo é a base das atuações, quando são utilizados atos e formas muitas vezes estranhas para emitir uma mensagem ao outro.

Em muitos casos, é a forma encontrada para pedir socorro sem usar a fala. Outro padrão é o jovem achar-se sem recursos e habilidades de enunciar suas demandas. Nesse caso, ele se “apaga” enquanto sujeito em detrimento da dor insuportável, atrelando a dor psíquica ao corpo – o que gera, quase sempre, risco. O suicídio e a autoagressão podem resultar dessas duas saídas, sendo vistos como único ato capaz de aliviar o sofrimento. Poder falar sobre o suicídio é dar a oportunidade de se escutar uma dor profunda que habita o sujeito – em todos os sujeitos.

Em suma, todo jovem necessita de um ambiente que possa reconhecer as fragilidades causadas pelo amadurecimento. É importante que a família, a comunidade e a escola desenvolvam a capacidade tanto de perceber os sinais quanto de convidar ao debate sem exigir retorno imediato. Criar espaços abertos à fala daqueles que se encontram com possíveis sofrimentos psíquicos aumenta o repertório do sujeito para que ele possa tomar decisões de forma mais saudáveis.

ARTIGOS

O papel da IA no bem-estar moderno

21/03/2025 07h45

Arquivo

Continue Lendo...

Os últimos anos foram marcados por transformações em várias esferas da sociedade, e um dos conceitos que mais mudou e ganhou novos significados foi o de bem-estar. Se antes ele era relacionado principalmente com a saúde mental e física, hoje em dia já abrange diversos outros fatores, como qualidade de vida, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, segurança e experiências personalizadas.

Esse cenário levou ao crescimento da economia do bem-estar, que, segundo dados do Global Wellness Institute (GWI), alcançou US$ 6,3 trilhões em 2023, montante 25% maior do que o valor avaliado em 2019 (US$ 4,9 trilhões). Para 2028, a expectativa é que o setor chegue a US$ 8,9 trilhões, o que reforça como essa pauta já é uma forte tendência.

Porém, vale destacar que os avanços nesse mercado foram possíveis, entre outros fatores, por conta da evolução da tecnologia, que ampliou o acesso a soluções inovadoras, otimizou processos e possibilitou a personalização do bem-estar de acordo com as necessidades individuais. Nesse contexto, a inteligência artificial (IA) tem desempenhado um papel fundamental, contribuindo ainda mais para que o bem-estar seja mais acessível e flexível.

Temos diversos exemplos que comprovam como as soluções inovadoras trazidas pela popularização da IA impactam diretamente o autocuidado e a forma como interagimos com o mundo: no setor da saúde, startups brasileiras como a Pipo Saúde utilizam a tecnologia para oferecer suporte a diagnósticos e otimizar o atendimento médico, permitindo que milhões de pessoas tenham acesso a serviços de saúde de forma mais eficiente. O bem-estar emocional também foi impulsionado com soluções como a da Vittude, uma plataforma que conecta pacientes a psicólogos por meio de IA, democratizando o acesso a cuidados mentais.

No que diz respeito ao bem-estar corporativo, ferramentas desenvolvidas por empresas como a Gupy ajudam organizações a monitorar o nível de satisfação dos funcionários e sugerem ações para melhorar o ambiente de trabalho, reduzindo o estresse e, consequentemente, aumentando a produtividade.

Outro exemplo do impacto positivo da IA no bem-estar moderno está na personalização do entretenimento, com plataformas como Spotify e Netflix, que usam IA para sugerir conteúdos que correspondem aos interesses do usuário, e do aprendizado, com ferramentas como o Duolingo, que usam IA para personalizar o ensino, tornando essa jornada mais eficaz e menos desgastante para os estudantes.

Acredito que essa tendência de sofisticação das tecnologias baseadas em IA vai tornar a busca pelo bem-estar completo ainda mais fácil. Desde aplicativos que monitoram padrões de sono e alimentação a assistentes virtuais que ajudam a gerenciar tarefas cotidianas, é fato que a tecnologia seguirá transformando a forma como cuidamos do nosso corpo, mente e relações.

Porém, não podemos esquecer que o segredo para o uso eficaz da IA nesse contexto inclui necessariamente o desenvolvimento ético dessas tecnologias, para que sejam seguras, inclusivas e realmente focadas no bem-estar humano.

Assine o Correio do Estado

ARTIGOS

Financiamento rural e a reforma tributária

21/03/2025 07h15

Arquivo

Continue Lendo...

Os Fiagros são os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais. Criados em 2021, são ativos de investimento do agronegócio, seja de natureza imobiliária rural, seja de atividades relacionadas ao setor. O Fiagro acabou se tornando uma fonte alternativa de financiamento para o produtor rural, de modo a não depender exclusivamente dos bancos e do Plano Safra.

Entretanto, em janeiro deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a reforma tributária, mas vetou trechos que previam a isenção de tributos para os Fiagros e para os Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs). Esses trechos isentariam tais fundos da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

A justificativa do governo para o veto foi a ausência de autorização constitucional para que esses fundos não fossem considerados contribuintes do IBS e da CBS. Isso pode impactar diretamente o crédito para os produtores rurais. É uma insensatez e ilógico o que o presidente fez.

Os Fiagros são fundos em que as pessoas podem investir e que funcionam como fontes de financiamento para o agronegócio. No mundo inteiro, os fundos já são mais representativos do que os bancos. Esse tipo de fundo tem crescido bastante, pois permite também que investidores urbanos participem do setor agroindustrial, aproveitando o potencial do agronegócio brasileiro.

O Brasil conta com cinco grandes bancos e cooperativas de crédito, além de seis linhas de crédito disponíveis para o agronegócio. Há também o Plano Safra, que atende apenas uma pequena parte da produção. Dessa forma, os agricultores ficam nas mãos desses bancos e frequentemente enfrentam desafios para a concessão de crédito, tornando-se dependentes das instituições financeiras, que impõem taxas, garantias e burocracias muitas vezes incompatíveis com a realidade do setor.

Prova maior da importância de financiamentos alternativos é a notícia da suspensão do Plano Safra. O Tesouro Nacional decidiu suspender novas contratações dessas linhas de financiamento 2024-2025. A medida vale a partir de 21 de fevereiro. O governo, sempre correndo para remediar em vez de prevenir, editou a MP nº 1.289/2025, liberando 4,17 bilhões para conter a pressão do segmento. Ainda assim, é insuficiente para o que o setor demanda de fomento. 

Os fundos representam um novo universo, uma nova possibilidade de financiamento com juros menores, pois, muitas vezes, esse capital vem do exterior. Os investidores estrangeiros não estão acostumados com os juros elevados do Brasil e, portanto, taxas mais baixas já são atrativas para eles. O Fiagro é exatamente isso: uma fonte de financiamento. Além de financiar o campo, atualmente beneficia cerca de 600 mil investidores.

No momento, o Fiagro só paga imposto se houver mais de 100 cotistas no fundo, não sendo tributado pelo Imposto de Renda. Caso tenha menos de 100 cotistas, há a incidência de 15% de Imposto de Renda, cobrado apenas no momento do resgate do resultado pelo cotista. Além disso, o Fundo não paga PIS, Cofins ou ISS. Contudo, com esse veto presidencial, os Fiagros passarão a pagar os tributos previstos na reforma tributária, especificamente o IBS e a CBS. Isso significa uma alíquota de até 28,5%, o que inviabilizará completamente esses fundos.

É importante lembrar que a logística no Brasil é muito cara, os produtores gastam muito com transporte, e os custos trabalhistas e tributários são elevados. Agora, o governo tenta transferir mais essa responsabilidade para o produtor. Vale ressaltar, mais uma vez, que quanto mais difícil for a vida do produtor, mais difícil será a vida do consumidor, que verá o impacto nos preços dos produtos agropecuários nas prateleiras dos supermercados.

A nossa expectativa é que a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) manifeste firmemente sua discordância com o veto e atue no Congresso para derrubá-lo. A tributação desses fundos compromete a competitividade do setor, aumenta os custos para os produtores, reduz a oferta de crédito no agronegócio e, por consequência, eleva os preços dos alimentos para o consumidor final.

Assine o Correio do Estado

NEWSLETTER

Fique sempre bem informado com as notícias mais importantes do MS, do Brasil e do mundo.

Fique Ligado

Para evitar que a nossa resposta seja recebida como SPAM, adicione endereço de

e-mail [email protected] na lista de remetentes confiáveis do seu e-mail (whitelist).