Com a previsão de ampliação de mais 120 leitos neste mês, Campo Grande pode chegar a quase 600 vagas de unidades de terapia intensiva (UTIs) contando todos os setores, quase o dobro do que a cidade tinha antes do início da pandemia de Covid-19.
O aumento de leitos, porém, esbarra em um problema operacional: a falta de médicos. O número de intensivistas ainda é o mesmo, 76, o que tem sobrecarregado os profissionais.
Dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) de fevereiro, antes da pandemia chegar na cidade, indicam que o município de Campo Grande contava com 351 leitos de UTI (adulto, pediátrico e coronariana).
Destas, 116 eram de vagas contratualizadas pela prefeitura, ou seja, atendiam pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS).
Com o avanço da doença em Campo Grande, várias ampliações foram feitas, tanto da rede pública quanto privada, e hoje a Capital conta com um total de 475 vagas no setor, segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES), sendo 274 vagas contratadas de fundações e da rede privada.
Nesta semana, 60 equipamentos para UTI do Ministério da Saúde chegarão na cidade (20 foram entregues no sábado, outros 40 estão por vir), conforme promessa do assessor especial da Pasta.
Mais 10 que estavam em Dourados, e que não foram utilizados pelo município, também serão acrescidos aos números da Capital. Outros 40 ainda serão instalados no Hospital Miguel Couto – Unimed e no Hospital da Cassems, e 10 no Hospital Regional de Mato Grosso do Sul, totalizando assim mais 120 UTIs, que têm previsão de serem implantadas em 30 dias.
Mais médicos?
Todas essas ampliações esbarram em um fator importante: a falta de profissionais habilitados para trabalhar nos setores críticos dos hospitais.
De acordo com dados do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul (CRM-MS), a Capital conta com apenas 76 médicos intensivistas (no Estado, ao todo são 103) e cada um deveria ser responsável por, no máximo, 10 pacientes durante seu plantão. Mas com o avanço da Covid-19 e a ampliação de leitos para atender cada vez mais pessoas, esse número já não tem sido respeitado.
“Está havendo falta de plantonistas nas UTIs. Normalmente, tem-se uma proporção de um médico para cada 10 pacientes. Mas com o aumento no número de leitos, o atendimento às vezes vai de um médico para 15 pacientes”, explicou o presidente do CRM-MS, Maurício de Barros Jafar.
Segundo o titular da SES, Geraldo Resende, o Estado pretende ampliar a quantidade de leitos do setor até chegar ao limite humano para o atendimento.
“Vai chegar uma hora que não vamos ter recursos humanos na Capital. A situação é ainda mais complicada no interior: há uma escassez desses profissionais, a maioria já está compromissada. E não são só médicos, são fisioterapeutas especializados, enfermeiros, técnicos de enfermagem. A equipe tem de ter experiência porque a assistência de leitos de UTI tem de ser bastante preparada, sob pena de perder pacientes”.
Conforme a diretora do Hospital Regional, Rosana Leite de Melo, a unidade conta com 28 profissionais e, semana passada, abriu contratação de mais três médicos e 23 enfermeiros, todos temporários.
Dos que já estavam no local: 11 têm carga horária semanal de 36 horas; seis têm carga de 24 horas; e 11 têm carga de 12 horas. Além disso, nove estão afastados.
“Ainda têm médicos que são computados como dois profissionais, se a carga horária for alta”, explicou. No centro médico, há 91 leitos críticos no momento (UTI e semi-intensivos).
De acordo com a diretora do Regional, a falta de médico nessa área é um problema nacional, pois o sistema brasileiro dificulta a formação de profissionais para atuarem nas UTIs.
Para realizar residência em Terapia Intensiva, é pré-requisito ter residência completa em uma dessas especializações: Clínica Médica, Cirurgia, Anestesiologia, Cirurgia Geral e Infectologia.
Essas residências demoram, em média, dois anos. Depois disso, o profissional que deseja virar intensivista precisa estudar por mais dois anos. Contando a duração do curso de Medicina, é preciso dispender de 10 anos para conseguir atuar nas UTIs.
“Por isso temos tão poucos médicos intensivistas no País. Quando o médico acaba a primeira residência, dificilmente vai querer fazer outra. Temos um programa de residência para intensivistas no Hospital Regional, mas há pouca procura”, garante Leite.
Por causa dessas ampliações e da escassez de profissionais da área, segundo o presidente do CRM-MS, os hospitais estão buscando a contratação de médicos de outras especialidades para atuarem no setor. “Santa Casa, Unimed e Hospital Regional sei que abriram contratação de vários médicos. Mas só para plantonistas, médicos intensivistas não têm como aumentar”, apontou Jafar.