2011 promete, em alguns aspectos, ser um ano melhor do que o que passou. Analistas enxergam condições para que os índices acionários continuem a avançar, sustentados por uma atividade ainda intensa no âmbito doméstico e retomada daquela que ainda é a principal economia global, os Estados Unidos. Mas pouco adianta que o Ibovespa chegue a patamares altos, como os 80 mil pontos vislumbrados por analistas, se o investidor reiteradamente cometer erros primários e facilmente identificáveis pelas finanças comportamentais.
Como explicou André Delben, sócio da Advis Investimentos, este é um campo relativamente novo, "que procura combinar análise do comportamento humano e teorias psicológicas com teorias econômicas convencionais para explicar melhor por que as pessoas muitas vezes tomam decisões financeiras de forma irracional", aponta.
Vera Rita de Mello Ferreira, representante no Brasil da IAREP (Associação Internacional para Pesquisa em Psicologia Econômica), tem uma explicação bastante objetiva para esse comportamento irracional na hora de lidar com dinheiro. Isso ocorre, avalia, porque temos um lado frio, que consegue examinar a situação com clareza e distância e fazer avaliações de longo prazo. O problema, afirma, é que esse lado é muito precário, e no momento efetivo de tomada de decisão quem domina é o emocional, "o lado quente", que olha apenas o curto prazo, não observa o cenário completo e faz avaliações grosseiras.
É sempre difícil proteger-se desse lado impulsivo, mas ao conhecer alguns dos erros mais cometidos por investidores, é possível reavaliar comportamentos e tomar uma decisão para este início de ano: não cometer equívocos comuns.
Rentabilidade passada não garante futuro
Aquiles Mosca, estrategista de investimentos pessoais da Santander Asset Management, aponta uma das principais armadilhas para 2011: deixar-se influenciar pelo passado recente. Nesta segunda quinzena de janeiro, lembra, os extratos com a rentabilidade acumulada pelos investimentos no último ano deverão ser enviados aos investidores, e aí ficará bastante visível que as aplicações menos rentáveis foram a bolsa de Valores e o câmbio.
"As pessoas vão olhar aquilo e pensar: 'não vou aplicar em ações, porque a Bolsa está rendendo mal'. Aí está o raciocínio errado", afirma. Mosca acredita que um dos erros mais comuns é justamente imaginar que o que aconteceu no passado irá se perpetuar no futuro. Isso pode influenciar decisões em momentos de alta contínua dos mercados, mas pode também colaborar para que oportunidades fiquem para trás.
Neste ano, por exemplo, a bolsa, apesar do pífio rendimento do ano passado, apresenta um momento adequado de entrada, porque não subiu em 2011, está barata, e deve ser sustentada por melhora do cenário externo e aumento dos lucros (e dos dividendos) das companhias brasileiras. "Não fique, portanto, de olho no retrovisor", aconselha Aquiles Mosca.
Otimismo excessivo
Em contraposição à visão positiva para a bolsa em 2011, Vera Rita alerta para os riscos do otimismo excessivo. "É comum achar que não existe risco, que tudo vai dar certo. No ano passado, as principais corretoras apontavam o Ibovespa acima dos 80 mil pontos", afirma a professora. E se a perspectiva é essa, o investidor irá tomar decisões com esse ponto de referência. "Como o prognóstico não se concretiza, haverá uma diferença entre a expectativa e a realidade", avalia a professora, e por isso o investidor deve ficar atento para não fazer o movimento errado e se decepcionar.
Uma forma de se proteger, afirma Vera Rita, é um fórmula bastante simples: não comprar quando está subindo muito e nem vender em momentos de queda abrupta. "Não adianta comprar quando já subiu tudo o que tinha para subir, porque a margem de lucro será pequena, e nem vender no fundo do poço, porque, a não ser que acabe o mundo, haverá um novo ciclo", conclui.
Disciplina e paciência
Isso não quer dizer que o investidor tenha que exatamente acertar o momento de entrada e saída do mercado, o que, na visão de Aquiles Mosca, é quase impossível. Mas se o investidor tiver objetivos de aplicação, isso se torna muito mais fácil, apesar de exigir autocontrole. "A chave para evitar muitos erros é ser disciplinado e paciente", define o estrategista da Asset Management do Santander.
Por isso, é necessário, antes de tudo, definir metas. O estrategista traz um caso hipotético. Imagina uma pessoa que queira aplicar um dinheiro para poder dar entrada em um imóvel daqui a cinco anos. Com isso, dois passos importantes já foram dados: mirar um horizonte e um objetivo. A próxima etapa é aferir o perfil de risco.
Para um investidor moderadamente arriscado, uma alocação adequada poderia ser de 60% na renda fixa, 30% em multimercado e 10% em ações. "Essa paciência de manter adequação ao objetivo proporciona maiores chances de evitar erros. O investidor que não faz isso compra bolsa cara e vende barato, troca o pé o tempo inteiro", afirmou. Ou seja, quando a bolsa cair, os 10% passarão a ser 5%, por exemplo, e para rebalancear o portfólio o investidor deverá comprar bolsa, que automaticamente estará barata após um período de quedas.
Do mesmo modo, se a parcela alocada em ações chegar a 15%, é um indício de que chegou a hora de vender, reequacionando as aplicações. A recomendação de Mosca é que essa revisão seja feita a cada três meses. "Com disciplina, o retorno pode ser bem interessante para a carteira", conclui.
Experiência...
Se esse sangue frio não for exatamente sua melhor característica, Vera Rita trabalha com duas possibilidades. Uma delas é entregar nas mãos de um gestor, que terá mais frieza na tomada de decisões não apenas por ser mais experiente, mas também por não se tratar de seu próprio dinheiro, o que favorece a administração mais calculista dos investimentos.
Mas, mesmo quando se entrega a responsabilidade a um gestor, é necessário conhecer bem os produtos. Com a expectativa de alta da Selic na próxima semana, explica Aquiles Mosca, muitos investidores estão saindo de fundos de renda fixa que podem alocar recursos em papéis pré-fixados, menos atrativos nesse momento, para investir o dinheiro em títulos pós-fixados, como CDB.
Nesse movimento, no entanto, o que acontece na realidade é que o investidor está apenas pagando impostos com esse movimento. "O gestor recebe uma taxa de administração justamente para fazer ajustes nos portfólios, e ele com certeza está observando essa situação", disse Mosca. De fato, até o dia 10 de janeiro de 2011, de acordo com os dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), a captação líquida dos fundos de renda fixa estava negativa em pouco mais de R$ 3,2 bilhões.
...ou experimento
Vera Rita sabe, no entanto, que para muitos essa decisão de dar recursos para um consultor, por exemplo, simplesmente "não tem graça". Nesse caso, a especialista em psicologia econômica aconselha um experimento. Separar um pouco de dinheiro, "não muito, de preferência", e treinar fazendo o que ela chama de um diário de bordo, em que os preços de compra, de venda e as datas são todos anotadas em um caderno, para que a pessoa possa constatar se é ou não uma boa gestora.
Reavaliar a carteira também faz parte das sugestões de Vera Rita. Em determinados momentos, afirma, os investidores têm em carteira papéis que não voltariam a comprar no mercado, mas o apego às ações queridas torna difícil se desfazer delas. Um estudo mostrou, segundo a professora, que a rentabilidade das ações "mal-amadas" era às vezes superior a de papéis benquistos pelos investidores.
Efeito manada
Em resumo, acredita Vera Rita, para ganhar dinheiro é necessário ir contra a manada. André Delben, da Advis, define esse movimento como a tendência do indíviduo de imitar ações (sejam elas racionais ou irracionais) de um grupo maior, mesmo que individualmente a pessoa não optasse por aquele comportamento.
"Errar em companhia da maioria é menos estressante. Já conviver com as consequências de um erro em virtude de um posicionamento oposto ao do grupo é um constragimento que a maioria evita", alerta o gestor.
Difícil é a desigualdade
Aquiles Mosca vê a necessidade de agir em conformidade com o grupo e o conforto de errar em conjunto como dois dos quatro elementos que costumam constituir um "efeito manada" sobre algum ativo. O terceiro é imaginar que se todo mundo está indo para a bolsa, por exemplo, deve haver alguma boa razão fundamentando essa decisão.
O último é justamente o fato de que o maior receio não é perder dinheiro, mas ver os outros ganhando. "O que incomoda não é a pobreza, é a desigualdade", concluiu o estrategista da Santander Asset Management. Vale ressaltar que Mosca não observa, nesse momento, a ocorrência de movimentos semelhantes ao de manada em nenhum ativo.