Os primeiros casos do novo coronavírus surgiram no fim do ano passado na China, e em Mato Grosso do Sul a doença tem acometido pessoas desde março. Desde então a ciência já deu alguns paços em direção às respostas das principais perguntas sobre a Covid-19. O Correio do Estado ouviu especialistas e consultou materiais acadêmicos e montou um tira-dúvidas atualizado sobre o que se sabe até agora a respeito da pandemia.
Por quanto tempo uma pessoa infectada fica imune ao novo coronavírus?
De acordo com o médico doutor em medicina preventiva pela Universidade de São Paulo, Expedito Luna, a comunidade científica ainda não tem certeza de quanto tempo dura a imunidade do corpo contra a Covid-19. A informação mais consistente de que se tem notícias é que não há reinfecções pelo novo coronavírus. Na China, onde os primeiros casos foram registrados, a quantidade de pacientes novos tem reduzido.
"Não sabemos se essa imunidade é devido a anticorpos ou por células do sistema imunológico, mas fazendo um paralelo com os outros coronavírus, os níveis do anticorpo começam a cair a partir de ano, então pode ser que a doença atual seja semelhante.
Crianças são realmente menos suscetíveis a complicações da Covid-19?
Segundo Luna, Crianças tem menor propensão a ter sintomas quanto infectadas e igualmente evoluir para quadros clínicos graves, mas isso não significa que não possa acontecer. "Além de haver crianças com Covid-19, tem sido observada uma complicação que só aparece nos pequenos: a síndrome inflamatória multissistêmica. "É uma doença grave que afeta principalmente o sistema circulatório, mas existem vários outros tipos de sistemas que também podem ser comprometidos. É algo que o novo coronavírus está desencadeando".
Quando teremos vacina contra a Covid-19?
Existem mais de 130 imunizações em desenvolvimento no mundo inteiro e três delas são ou serão testadas em brasileiros: a desenvolvida por cientistas da universidade britânica de Oxford, a desenvolvida pela indústria farmacêutica Pfizer e outra originada na China.
A inglesa é considerada a mais avançada. Os testes são coordenados pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Cerca de 1,7 mil voluntários que já receberam o produto tomarão um reforço nos próximos meses. Se os resultados seguirem positivos com análise interina e parcial, pode ser que até o final do ano seja aprovada para uso emergencial.
A reitora da instituição, Soraya Smalli, disse recentemente que todos os que receberam a primeira dose já desenvolveram anticorpos contra a doença.
Das vacinas em teste no Brasil (Pfizer, Oxford e China), qual tem se mostrado mais eficaz?
Nós não podemos falar em eficácia ainda porque ela tem a ver com proteção e o resultado de eficácia só sai após o estudo de fase três, que ainda está em desenvolvimento. O que nós sabemos é que elas todas foram imunogênicas, ou seja, provocaram anticorpos. A eficácia dirá se eles são capazes de proteger. A vacina Inovac (chinesa), junto ao Instituto Butantã, usa uma tecnologia já conhecida e dominada pelos produtores de vacina, que é o vírus inativado. A vacina de Oxford usa o chamado vetor viral, ou seja, um vírus que carrega pedaços do código genético do causador da Covid-19, explica Luna. É uma tecnologia nova, desenvolvida pela própria Oxford e até hoje só existe em uma única vacina: a da ebola. Então temos uma experiência limitada sobre ela, o que não indica que seja ruim.
E quando existir vacina, os brasileiros terão acesso garantido?
O Ministério da Saúde fechou acordo de transferência de tecnologia com o laboratório britânico AstraZeneca para fabricar 100 milhões de doses da vacina de Oxford no laboratório da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O Executivo vai investir R$ 522 milhões na produção, incluindo a compra de insumos e aparelhagem necessária.
Isso quer dizer que, em um primeiro momento, a imunização não vai estar disponível para toda a população. É possível que apenas os que se enquadrem no grupo de risco sejam priorizados, mas a estratégia deve ser definida tão logo os testes se complete.
Qual o risco de uma gestante infectada passar coronavírus para o bebê?
Ainda não está muito claro, segundo Luna, se há transmissão vertical, que é a transmissão transplacentária da mãe para o feto. O que pode acontecer é a transmissão na hora do parto.
Depois que eu fui exposto ao coronavírus, depois de quantos dias aparecem os primeiros sintomas e por quanto tempo eu posso transmitir o vírus para outras pessoas?
Esse período chama-se incubação. Segundo Luna, o tempo que demora entre o contágio e os primeiros sintomas é de cinco dias em média. A pessoa infectada só começa a transmitir Covid para outros indivíduos cerca de um ou dois dias antes dos primeiros sintomas e continua entre uma e duas semanas.
Existe imunidade de rebanho da Covid?
Pesquisa feita com base em modelos matemáticos e dados reais da Covid-19 em países europeus sugere que a imunidade de rebanho da doença poderia ser alcançada quando uma parcela entre 10% e 20% da população for infectada. Esse cenário implica em um controle maior da contaminação pelo novo coronavírus, de modo que quando essa faixa for alcançada, a quantidade de casos novos tenderia a cair diariamente, mesmo com o comércio aberto e as medidas de isolamento reduzidas (gradativamente), por exemplo.
Os cientistas responsáveis pelo artigo, que ainda não foi revisado pelos pares, alertam que a projeção não anula ou contradiz a necessidade do isolamento social. Além disso, não adianta se expor voluntariamente à Covid-19 para acelerar o processo.
Por que os obesos estão no grupo de risco da Covid-19?
Pesquisa da Universidade Federal de Campinas revela que os tecidos de gordura do corpo servem como reservatório para o novo coronavírus. A descoberta é uma pista para entender porque obesos, junto com diabéticos, hipertensos, idosos e portadores de doenças crônicas podem desenvolver casos mais graves da doença. Os experimentos provaram que o micro-organismo causador da Covid-19 é capaz de infectar as células adiposas. Resta saber agora se depois de se replicar dentro delas, ele consegue sair para contaminar outras partes do corpo.
O coronavírus não consegue entrar e se multiplicar de forma eficiente em qualquer tipo de célula dentro do organismo. Existem algumas condições necessárias para que esse processo aconteça, como por exemplo a presença de uma enzima específica na qual o organismo se conecta.
O problema é que, a princípio, a gordura tem condições ideais para que isso aconteça. Nas comparações feitas in vitro, os pesquisadores da Unicamp observaram que o novo coronavírus infecta melhor os adipócitos do que, por exemplo, as células epiteliais do intestino ou do pulmão.