A falta de atualização da tabela de pagamentos do Sistema Único de Saúde (SUS) está ameaçando o oferecimento da terapia renal substitutiva – as sessões de hemodiálise – a pacientes renais crônicos.
A tabela está defasada há quase cinco anos, sem um reajuste que permita a cobertura dos custos mínimos do serviço. A consequência disso é que centenas de pacientes que hoje precisam do atendimento podem ficar desassistidos.
O problema vem sendo discutido em todo o País nos últimos dias, inclusive é tema de audiência pública na Câmara dos Deputados, em Brasília. O setor alega que vive um cenário de prejuízo financeiro histórico.
Administradores de clínicas, médicos e entidades representativas alertam para a necessidade urgente de revisão da Tabela SUS como a única saída para evitar a desassistência a mais de 140 mil doentes no País.
Em Mato Grosso do Sul, segundo as informações, mais de duas mil pessoas dependem das sessões de hemodiálise (perto de 800 só em Campo Grande) oferecidas pelo sistema público e que são realizadas três vezes por semana, com duração de quatro horas cada.
O Índice de Preços dos Medicamentos para Hospitais (IPM-H), com porcentual de variação de 2015 a 2021, é de 146,20%.
Apesar disso, no mesmo período, o reajuste da tabela do Sistema Único limitou-se a 8,47% para a diálise. O valor pago pelo SUS por sessão de hemodiálise é de R$ 194,20, e o seu custo individual real ultrapassa R$ 285.
Dos 79 municípios sul-mato-grossenses, o serviço é oferecido em apenas sete cidades – Aquidauana, Campo Grande, Corumbá, Coxim, Dourados, Paranaíba e Três Lagoas. A remuneração defasada está desestimulando a abertura de novos centros de hemodiálise.
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PROBLEMA GRAVE
Procurado para falar sobre o assunto, o presidente Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul, Marcelo Santana Silveira, que também é nefrologista e atende em clínica de hemodiálise.
O presidente confirmou a gravidade do problema e destacou que a maior parte dos centros de diálise faz atendimento pelo Sistema Único de Saúde e, igualmente, a maioria dos pacientes é custeada pelo SUS.
Conforme explicou, grande parte dos insumos é importada ou depende de material vindo do exterior, e ao longo dos últimos anos houve uma elevação significativa do dólar sem que a tabela de procedimentos tivesse reajuste para acompanhar os custos.
O reflexo disso, segundo ele, é que em breve clínicas poderão ser forçadas a recusar pacientes, especialmente os novos, pela impossibilidade de atendimento em razão dos altos custos e da remuneração insuficiente.
Conforme ele, é preciso que o governo do Estado também olhe para a situação e faça gestões com o governo federal para que o problema seja resolvido com maior brevidade.
Caso contrário, com o agravamento da crise e havendo recusa de novos pacientes, essas pessoas ficarão na dependência apenas do serviço público, que naturalmente não tem meios de responder a toda essa demanda.
No Rio de Janeiro, já em 2019, como parte de uma solução temporária, o governo estadual fez um cofinanciamento da terapia renal substitutiva para as clínicas de diálise conveniadas, cobrindo o deficit entre os custos das sessões e os valore repassados pelo Sistema Único de Saúde.
CAPITAL
Em Campo Grande, as sessões de hemodiálise basicamente são oferecidas por três clínicas conveniadas – a Hiperrim, a Pro Renal e DaVita –, completadas pelo Hospital Regional, pela Santa Casa e pelo Hospital Universitário.
A Hiperrim, por exemplo, atende quase 300 pacientes. Paralelamente a isso, de acordo com a Santa Casa, o serviço de diálise do estabelecimento responde, em média, por 80 pacientes, somente no ambulatório.
Além destes, o setor também assiste pacientes internados em enfermarias e unidades de terapia intensiva.
Sobre o pagamento do SUS, o hospital informou que o valor repassado pelo Ministério da Saúde por sessão realizada por pacientes renais agudos (os internados) é de R$ 265,41.
Já para os pacientes renais crônicos (ambulatoriais) é realmente de apenas R$ 194,20.
ALTOS CUSTOS
O administrador Alaor Simão Leiria, da Hiperrim, observou que nos últimos anos os preços de insumos utilizados nas clínicas de hemodiálise tiveram uma alta considerável, situação agravada nacionalmente pela pandemia da Covid-19.
Ao exibir as planilhas, ele revelou que antes da pandemia uma caixa de luvas para entrega às clínicas custava entre R$ 14 e R$ 17, agora está sendo encontrada entre R$ 65 e R$ 95.
Além disso, conforme também exemplificou, um capilar (tubo por onde entra e sai o sangue na máquina de hemodiálise) e que deve ser usado individualmente pelos pacientes, está custando mais de R$ 60.
Quando há paciente com suspeita de contaminações ainda não confirmadas por exames laboratoriais, geralmente se utiliza um por diálise, descartando-se após.
Nas demais situações, eles passam por reúso temporário. Já a heparina (anticoagulante), também empregada nas sessões, chega a custar R$ 42, além de outros itens.