De acordo com a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) o número de mulheres que respondem na Justiça pelo crime de aborto aumentou em Mato Grosso do Sul.
De janeiro a julho de 2020, 7 mulheres foram indiciadas. No mesmo período do ano passado, foram 6, variação correspondente a 16,67%.
A maior parte delas realizaram o procedimento no interior do Estado. Só neste ano foram 6, contra as 5 de 2019, o que resulta em uma variação de 20%.
Na Capital o índice se manteve estável, tanto em 2019, quanto em 2020, apenas uma mulher responde pelo crime.
Não é possível chegar ao número exato de quantos abortos foram realizados, já que a prática acontece através de métodos clandestinos.
A legislação brasileira não pune o ato em três situações: quando a gravidez é resultado de violência sexual (aborto humanitário), quando o feto é anencéfalo (anomalia incompatível com a vida) e quando a gestação oferece risco à vida da mãe (aborto terapêutico).
Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde, em 2020 o procedimento foi realizado legalmente uma vez em Mato Grosso do Sul, em uma menina abaixo dos 14 anos, vítima de abuso sexual. Ano passado, foram duas, com as mesmas condições.
Já o número de crianças que se tornaram mães é bem maior. Só em 2020 já foram 170 meninas abaixo dos 14 anos que tiveram filhos. Em 2019, foram 372.
Visão médica
No Estado, a unidade credenciada para realizar o procedimento é o Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian (Humap-UFMS). A paciente é atendida por uma equipe de profissionais, constituída por médico, psicólogo e assistente social.
De acordo com ginecologista e presidente da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia de Mato Grosso do Sul, Vanessa Chaves Miranda, o aborto quando realizado em condições ideais não apresenta risco para a mulher.
“Ele é tão agressivo, do ponto de vista física quanto qualquer outra cirurgia. Hoje a gente tem condições e maneiras de fazer o aborto de um modo bem pouco agressivo. Em condições ideais, quando bem indicados, podem salvar vidas. Mas quando mal indicados pode deixar sequelas”, relatou.
A médica afirma que o aborto em clínicas clandestinas têm alto risco de vida para a mulher, porque geralmente é feito sem condições de higiene adequada, que pode gerar infecção, e sem anestesia, que pode resultar em complicações graves pela dor.
“Além disso, geralmente são profissionais sem experiências, que fazem com métodos não adequados. Isso pode levar risco maior de perfuração uterina e de deixar restos e pedaços de placenta, que levam a complicações imediatas de infecção grave e possível morte”, complementa Miranda.
Os problemas a longo prazo pode ser a impossibilidade da mulher voltar a engravidar, porque o procedimento mal feito pode causar o surgimento de aderências intrauterinas, chamadas de Sinéquias.
“O acompanhamento psicológico é muito importante. Seja um aborto espontâneo ou provocado, nunca passa incólume pela mulher. Somos de uma cultura de não aborto, então é sempre muito agressivo do ponto de visto emocional. Mesmo do ponto de vista de uma paciente que tenha optado, mesmo em casos com riscos de vida materno, como foi o caso da paciente do nordeste”, conclui a profissional.
Polêmica
O caso de uma menina de 10 anos, que foi violentada sexualmente por seu tio e autorizada pela justiça a abortar no dia 16 de agosto, ganhou repercussão nacional depois que um grupo religioso protestou em frente ao hospital em que a vítima se consultaria, em Recife.
A criança é natural do Espírito Santo, mas o estado se negou a realizar o procedimento alegando questões técnicas, justificando que a idade gestacional (20 semanas) estava avançada portanto, não era amparada pela legislação, apesar do aval do juiz do caso.
Com apoio da Promotoria da Infância e da Juventude de São Mateus e da Secretaria Estadual de Saúde, ela foi transferida para outro estado, em companhia da avó. A cidade onde a gravidez seria interrompida era sigilosa, mas foi descoberta e divulgada por Sara Winter, digital influencer que produz conteúdos de extrema-direita.