O governo do Estado prorrogou nesta sexta-feira (15) a suspensão das aulas presenciais nas instituições públicas de ensino de Mato Grosso do Sul até o dia 30 de junho. Com isso as escolas da Rede Estadual de Ensino (REE) perderam praticamente o semestre inteiro por causa das medidas para evitar a disseminação do novo coronavírus.
Seguindo o Estado, o prefeito de Campo Grande, Marcos Trad (PSD), anunciou que vai fazer o mesmo com instituições da Rede Municipal de Ensino (Reme). A publicação deve sair nos próximos dias. A decisão, baseada em orientação do Ministério da Saúde, afeta mais de 300 mil alunos em Mato Grosso do Sul.
“Não há como fugir de uma conclusão da ciência. A Organização Mundial da Saúde e o Ministério da Saúde, depois de um certo tempo de convivência com esse vírus, já estão acertando mais do que errando. Então as escolas públicas ficarão fechadas por determinação do Ministério da Saúde até 30 de junho”, declarou o prefeito.
Com isso, o ano está severamente prejudicado em função da pandemia, que já matou 15 pessoas no Estado e mais de 14 mil em todo o País. Este ano, as aulas da Rede Estadual tiveram início no dia 17 de fevereiro e foram paralisadas no dia 23 de março, 35 dias depois de iniciadas, porém, com apenas 22 dias letivos, já que durante o Carnaval as escolas permaneceram fechadas, assim como nos fins de semana.
Na Rede Municipal, as aulas começaram um pouco mais cedo, no dia 6 de fevereiro, e foram paralisadas presencialmente no dia 18 de março, 42 dias depois. Em dias letivos, foram 26 aplicados antes das medidas de distanciamento social serem determinadas.
Esse período paralisado pode prejudicar os alunos de famílias de baixa renda, que têm pouco ou nenhum acesso às plataformas on-line em que tem sido disponibilizado o material para continuidade do ensino tanto no caso das escolas estaduais como municipais.
DIFICULDADE
Para a pedagoga e psicopedagoga, que é doutora em Educação, Gisele Alves, a aplicabilidade desses materiais tem uma limitação: os alunos mais carentes, que não têm condições sequer de ir à escola buscar o material de estudo.
“As videoaulas são para um grupo seleto de alunos, que têm condições de usar internet. Não são todos os alunos que têm mais de um celular em casa, por exemplo. Alguns não têm nem uma mesa para estudar, moram em casas que não têm piso, não têm condições de comprar sabonete para lavar as mãos. Como que vão acompanhar esses conteúdos? Não tem como”, afirmou Alves.
Segundo a pedagoga, que atua em uma escola da rede pública, as crianças em alfabetização podem ser as mais afetadas por causa da paralisação em função da pandemia. “Pode ser que as crianças que estão em processo de alfabetização e estão começando a reconhecer as letras percam o conhecimento já adquirido. A gente não sabe se elas têm apoio de pessoas que podem auxiliá-las nas tarefas. Então quando elas voltarem, podem ter que começar tudo do zero”, avalia.
Como o passe do estudante está suspenso em função da paralisação das aulas, a Gisele ressalta que nem todos os alunos conseguem ir até suas instituições de ensino para buscar os cadernos de atividades criados para esses alunos mais carentes.
Para a doutora em Educação, a aplicação de avaliação ou nota sobre esses cadernos seria “crueldade” com os mais pobres. “Não dá para fazer Enem [Exame Nacional do Ensino Médio], Enade [Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes] ou cobrar nota nesses cadernos, isso é crueldade. Não posso comparar a atividade de uma criança que tem casa com outra que não tem o que comer. Pessoas com fome não aprendem”.
Já a promotora de Justiça Ana Cristina Carneiro Dias, que coordena força-tarefa do Ministério Público de Mato Grosso do Sul de enfrentamento à Covid-19, acredita que quando houver a volta às aulas, as instituições devem respeitar normativas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação e realizar um tipo de avaliação para verificar o nível de aprendizagem que esse estudante teve durante a paralisação.
“O que temos sempre cobrado, tanto para escolas públicas como privadas, é qualidade nesse material remoto. E quando voltar, elas devem cumprir as normativas e fazer uma reposição ou reforço para os que precisarem”, declarou a promotora.
Prefeitura pode liberar escolas particulares
Nesta sexta-feira o prefeito Marcos Trad afirmou que as escolas particulares poderão voltar a funcionar antes que as públicas. Segundo ele, na quarta-feira (20) uma comissão de sete membros da rede privada educacional de Campo Grande e a prefeitura se reunirá com integrantes do Ministério Público.
“As escolas particulares, por terem características diferentes (...) dependendo dos protocolos de segurança e autorização do secretário de Saúde, da Educação, do Ministério Público e da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) pode ter um calendário programado para o ano”, declarou o prefeito.
Entretanto, segundo a promotora Ana Cristina, esse aval deverá ser dado pelos técnicos da área da saúde. “O parecer deve ser técnico, não é o Ministério Público que autoriza ou não. Deve ser baseado em evidências científicas”, avalia.