Areia clara e fofa, pequenas ondas, água mansa e com temperatura agradável. Bem pode parecer uma praia em alguma região do Nordeste, mas a verdade é que isso acontece também em Mato Grosso do Sul.
O detalhe é que a água não é salgada e fica em áreas próximas a Corumbá e Ladário, às margens do rio Paraguai.
Com o nível do rio baixo nos últimos dois anos, diversos bancos de areia passaram a se formar ao longo do curso do Paraguai e contribuíram para que pequenas praias fossem formadas.
Algumas delas ficam próximas da cidade e quem é da região começou a aproveitar, afinal quem mora na fronteira do Brasil com a Bolívia está a uma distância de mais de 1,4 mil quilômetros do mar.
Os bancos de areia no rio Paraguai costumam ser formados quando o nível na calha reduz abaixo do 1m na régua de Ladário.
Neste ano, essa medição chegou a ficar em -60 centímetros, o que fez surgir vários locais que podem ser utilizados por banhistas.
Com a estiagem, esse período de nível abaixo do 1m em Ladário deve ser de cinco meses, incluindo dezembro. A previsão do Serviço Geológico do Brasil avalia que o ano deve fechar em 0,88 m.
Ano passado, o período seco fez a calha permanecer abaixo do 1 m entre o final de agosto até o dia 20 de janeiro (2021).
Esses dados constam no Centro de Hidrografia e Navegação do Oeste, da Marinha do Brasil.
Esses períodos mais secos começaram a ser registrados no final de novembro de 2019.
A medição foi de 98 centímetros na régua de Ladário em 18 de novembro daquele ano, mas permaneceu nessa faixa somente até 19 de dezembro.
Prazo muito curto para os bancos de areia serem formados aos montes. Em anos anteriores, ao menos entre 2016 e 2018, o rio Paraguai não registrou mínima abaixo do 1m.
“PRAINHA”
Quem consegue aproveitar essa sazonalidade de praia em água doce são moradores que vivem às margens do rio.
Na chamada estrada da Codrasa, que é a MS-428, que tem pouco mais de 10 km e fica no município de Ladário, a formação dessas prainhas é muito perceptível e se torna um atrativo comercial, que ainda é explorado de forma improvisada.
Essa área foi incorporada ao patrimônio da União, através da lei 8.029/90, e possui a ocupação de pouco mais de uma dezena de famílias.
As moradias ainda estão em situação irregular, mas como houve a criação da Área de Proteção Ambiental (APA) Baía Negra, a área ganhou novos contornos.
A APA existe desde 2010 e engloba as Baías do Arrozal, Negra, borda do rio Paraguai e o trecho da MS-428.
Os sitiantes fazem anúncio na entrada das pequenas propriedades com uma placa dizendo: “Prainha”.
Isso já é o indicativo que é possível, a partir desses locais, atravessar trecho do rio Paraguai a pé, com a água que vai do joelho até a cintura, e acessar a praia, com areia semelhante ao que se encontra em qualquer beira mar na costa brasileira.
Para contribuir com o morador, em geral há cobrança de R$ 5 a taxa por adulto. Além disso, existe a orientação de que nenhum lixo deve ser depositado na natureza.
Vergínia Justiniano Paz mora na região e quando as prainhas são formadas ao fundo do sítio onde vive, sempre libera o acesso para turistas que são de Corumbá e Ladário.
Às vezes, pessoas de fora acabam aparecendo, mas o que ainda não é tão comum. “É uma área muito gostosa e bonita. Quando o rio está baixo, dá para atravessar a pé e ir até o meio do rio, como estava por agora".
"A preocupação é em proteger essa área. Temos que cuidar do rio, dos animais que existem por aqui”, explica.
Quem conhece o ambiente de praia e mar, diz que a adaptação para a opção de água doce é fácil.
Mariana Chianca Lúcio da Silva, professora em Corumbá, é natural de Natal (RN). Mora na Capital do Pantanal há 8 meses e descobriu as prainhas na APA Baía Negra agora em novembro.
“Nunca tinha ido tomar banho de rio porque a área que conhecia, ali no Porto Geral, não tinha gostado. Quando vi aquela areia mais clara, parecida com praia, eu me surpreendi".
"Muito organizado e tudo limpo. E a água é quentinha, foi um afago no meu coração. Dá para matar saudade. Quando estou em Natal vou na praia quase todo dia”, afirma.
PRAIA DA BADALAÇÃO
No município de Corumbá, a formação dessas prainhas são menos comuns nas proximidades com a margem. A maioria das vezes elas aparecem no meio do rio Paraguai e para chegar lá é necessário ir de barco ou mesmo de jet-ski.
Uma dessas regiões chegou a receber o apelido de “Jericoacoara Corumbaense”, em analogia à Vila de Jericoacoara, que fica em área paradisíaca no Ceará.
Com acesso mais amplo e disseminado atualmente, o Porto Geral de Corumbá também se tornou ponto turístico para tomar banho de rio tanto no caso de turistas, como dos moradores locais.
Com a estiagem, a água sofreu grande recuo e a faixa de areia, com pedriscos, é grande. Nessa região, a concentração de pessoas acontece principalmente aos sábados e nas tardes de domingo.
Como o Porto Geral é mais frequentado e tem acesso gratuito e facilitado na comparação com a APA Baía Negra ou as ilhas de areia formadas no meio do rio, centenas de pessoas aglomeram-se, inclusive indo de carro na faixa de areia.
Até caminhões chegam a ser encontrados estacionados. Com maior badalação, é comum o som alto ser propagado na região ao longo da tarde de domingo até noite adentro.
Sem contar a presença de ambulantes vendendo espetinho e bebidas.
A diretora-presidente da Fundação de Turismo do Pantanal, Elisângela Sienna da Costa Oliva, avalia que com a sazonalidade dessas formações de praia, essas regiões tornam-se um atrativo a mais para quem visita Corumbá e Ladário, mas não chega a ser um ponto turístico que gera grande movimento.
“O que ajuda é que com a baixa (do rio), podem aparecer animais silvestres nessas praias, ajudando o turismo de contemplação".
"E para aqueles turistas que gostam de passar o dia nessas ‘prainhas’, curtindo e conectados com a natureza, acaba sendo um atrativo a mais. Mas elas são temporárias”, analisa.
Por isso, enquanto o rio não sobe, as pessoas vão até o rio. Principalmente quando a prainha está formada.