A perda educacional durante a pandemia de Covid-19 deve resultar em um abandono escolar em grande escala, aponta o relatório divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
No Brasil, por volta de 10% dos estudantes jamais voltarão às escolas. Para reverter esse quadro de evasão, a Secretaria de Estado de Educação (SED) vai realizar, no mês de fevereiro, uma busca ativa de todos os alunos que deveriam estar matriculados na Rede Estadual de Ensino (REE).
De acordo com a SED, os dados de evasão escolar são bianuais. No último levantamento, de 2020, foi constatado que a Rede Estadual registrou uma taxa de abandono próxima a 1%, por volta de 2.100 alunos, considerando o total de 210 mil estudantes matriculados na época.
Conforme o superintendente de Políticas Educacionais da SED, Hélio Daher, o panorama de abandono escolar teria sido ainda pior se houvesse a suspensão das aulas durante a crise sanitária provocada pelo coronavírus. “Quando adotamos a estratégia de ensino remoto, foi uma maneira de garantir vínculo com o aluno”, salientou.
Para Daher, existe hoje uma disputa com o mercado de trabalho pela permanência do aluno na sala de aula. O superintendente ressaltou que, após dois anos de pandemia, cabe ao Estado garantir alternativas para que o jovem que precisa contribuir com a renda familiar também possa estudar.
“Por isso a busca ativa é importante, se percebermos que o abandono ocorreu, em sua maioria, por conta do trabalho, vamos abrir mais turmas de Ensino Médio noturno e de Ensino para Jovens e Adultos [EJA]”, afirmou.
Daher relatou ainda que a tentativa de trazer os alunos de volta é o que determinou o retorno escolar apenas no dia 3 de março.
“Durante todo o mês de fevereiro, vamos, em conjunto com o Conselho Tutelar e com o nosso departamento de apoio psicológico, buscar entender o que motivou o aluno a abandonar o ensino. Temos de trabalhar, além das questões financeiras, a parte socioemocional de quem perdeu entes queridos e daqueles que assumiram funções como chefes de família”.
RECOMPOSIÇÃO
O relatório do Unicef reitera que uma geração inteira será afetada pela perda educacional provocada pelo coronavírus. Na prática, o cenário atual aponta que os estudantes aprenderam apenas 25% do que teriam absorvido nas aulas presenciais.
Para as séries iniciais, os danos foram ainda mais graves, com a regressão de uma década no aprendizado das disciplinas de Matemática e de Português.
Segundo o relatório, cerca de 3 em cada 4 crianças da 2ª série estão fora dos padrões de leitura. No período pré-pandemia, o índice era de 1 em cada 2 crianças. Para a pedagoga Kátia Araújo, o foco nos próximos meses deverá ser na consolidação do processo de alfabetização.
“As crianças vão precisar de uma maior atenção nos componentes de leitura. Será necessário combinar o reforço escolar com recursos lúdicos, que prendam a atenção do aluno e façam a escola ser atrativa novamente”, explicou.
Conforme Daher, os próximos meses serão de recomposição do conteúdo.
“Não tem como recuperarmos algo que nunca foi aprendido, então o termo certo é recompor o ensino. Teremos uma matéria e um professor específicos para isso, com foco nas disciplinas de Português e de Matemática, porque consideramos que essas matérias são as bases para todo o programa de ensino, afinal, o aluno que lê e interpreta bem consegue lidar com as outras disciplinas”, reiterou.
De acordo com o superintendente, os diretores das escolas da SED vão passar por um treinamento, a partir de hoje até o dia 27, com foco na recomposição da aprendizagem.
“Temos, inclusive, quatro momentos programados com as famílias para o decorrer deste ano, para mantermos esse vínculo. Não adianta tentarmos trazer o aluno de volta se não tivermos um contato com a família”.
NOVO CURRÍCULO
O superintendente da SED, Hélio Daher, salientou que o novo formato do Ensino Médio pode ser um aliado na reintegração dos alunos que abandonaram as escolas.
Com o foco em uma grade curricular menos engessada, o estudante poderá optar por se aprofundar em cinco áreas de conhecimento, também chamadas de itinerários formativos: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas/Sociais e Formação Técnica/Profissional.
“Aquele aluno que precisa trabalhar já poderá, inclusive, optar por se aprofundar no ensino técnico em uma área em que já atua, por exemplo”, pontuou Daher.
Aprovado no fim de 2018 pelo Conselho Nacional de Educação e, posteriormente, homologado pelo Ministério da Educação (MEC), o novo modelo do Ensino Médio é semelhante ao já praticado em países como Finlândia, Estados Unidos e Coreia do Sul.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) fará parte de 60% das matérias estudadas em sala de aula a partir deste ao. Na prática, isso significa que o estudante terá flexibilidade para fortalecer o seu projeto de vida. Em Mato Grosso do Sul, todas as escolas estaduais que ofertam o Ensino Médio já vão trabalhar com o novo modelo de, no mínimo, 1.000 horas anuais de ensino e com o aluno como protagonista de seu conhecimento.