Vereadores haviam aprovado projeto de lei devido a casos de envenenamento; Adriane Lopes justificou que a competência sobre o caso é da União e Estados
A prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), vetou integralmente o projeto de lei que proibia a comercialização de arsênio, que tem sido utilizado de forma criminosa em vários casos de envenenamento. O veto foi publicado em edição extra do Diário Oficial do Município desta terça-feira (8).
A proposta, de autoria do vereador Neto Santos (Republicanos) foi aprovada em regime de urgência na Câmara Municipal, no dia 12 de junho.
Conforme o texto, ficaria proibida a comercialização de qualquer substância, produto ou composto que contenha arsênio em sua formulação, em qualquer quantidade, com exceção aos casos que o uso fosse para pesquisa científica realizada por instituições legalmente autorizadas ou à aplicação industrial ou laboratorial, quando houver controle técnico, licenciamento ambiental e autorização expressa da autoridade sanitária municipal.
No veto, a prefeita justifica que consultou a "Procuradoria-Geral do Município (PGM) e houve manifestação pelo veto total ao Projeto de Lei n. 11.895/25, argumentando tratar-se de competência concorrente entre União e Estados, não possuindo o município legitimidade para dispor sobre a presente matéria."
O veto também cita que cabe à União o papel de editar normas gerais, enquanto os estados deve suplementá-las e os municípios não integram essa competência, podendo apenas legislar sobre interesse local e suplementar normas federais e estaduais quando couber e que, editar norma autônoma com conteúdo sobre substâncias químicas, como no presente caso, ultrapassaria essa competência.
O relatório da prefeitura aponta ainda que o "arsênio é substância química reconhecidamente tóxica, mas também com diversas aplicações lícitas e reguladas na indústria metalúrgica (ligas metálicas); no setor eletrônico (semicondutores, lasers); no tratamento de leucemia promielocítica aguda (uso de trióxido de arsênio, registrado na Anvisa); como defensivo agrícola, com controle específico por parte do Ministério da Agricultura (Mapa)".
"Ocorre que a proibição genérica proposta pelo projeto não se limita a aspectos locais, mas pretende interferir diretamente na cadeia de fornecimento e uso de substâncias cuja regulação compete a órgãos federais e estaduais, como a Anvisa, o Ibama, o Conama e o Mapa", acrescenta o relatório.
Por fim, a prefeita ressalta que a proibição ampla e irrestrita à comercialização de qualquer produto com arsênio, sem respaldo em estudos técnicos prévios ou articulação com os órgãos reguladores federais, o Município estaria atuando em afronta direta à lógica federativa de regulação técnica, violando o pacto federativo e incorrendo em inconstitucionalidade.
"Desta feita, o presente projeto de lei aprovado pelo Poder Legislativo deve ser vetado integralmente, por possuir vício formal quanto à iniciativa, o que impede qualquer aproveitamento por meio de veto parcial", conclui
Proposta
Na justificativa do projeto apresentado na Câmara Municipal, o parlamentar cita o caso de uma adolescente de 16 anos que comprou arsênio pela internet e envenenou duas colegas, oferecendo um bolo de pote contaminado, sendo que uma delas foi internada e outra, Ana Luiza de Oliveira Nevez, 17 anos, morreu.
“Temos visto no Brasil uso dessa substância para envenenamento e destruição de famílias. Queremos nos antecipar para que não ocorram casos aqui e evitar a venda dessa substância”, disse o vereador.
Ainda segundo a justificativa do projeto, há regulação em nível federal sobre o uso industrial do arsênio, mas não há vedação geral à sua comercialização, o que abre margem para o comércio informal de substâncias.
“Tal lacuna coloca em risco consumidores desavisados, especialmente crianças, trabalhadores informais e populações vulneráveis”, acrescentou Neto Santos.
No veto, a Secretaria Municipal de Saúde (Sesau) ressaltou que a comercialização de arsênio já é objeto de normativas, que possuem como escopo o controle da substancia no território nacional e que a aquisição do produto é permitida apenas para empresas com CNPJ e mediante um registro detalhado sobre o motivo da compra e as condições de uso.
Envenenamento
A adolescente Ana Luiza de Oliveira Neves, 17 anos, morreu no dia 1º de junho, em razão de uma intoxicação alimentar provocada após ingerir o um bolo contaminado com arsênio, em Itapecerica da Serra, na região metropolitana de São Paulo.
O bolo de pote envenenado estava acompanhado de um bilhete, com o seguinte recado: “Um mimo pra garota mais linda que eu já vi”.
A jovem chegou a passar por atendimento médico depois dos primeiros sintomas, mas teve alta hospitalar e faleceu no dia seguinte.
De acordo com a Polícia Civil do Estado de São Paulo, uma jovem, também de 17, confessou ter colocado veneno no bolo que matou Ana Luiza. A adolescente disse à polícia que cometeu o ato infracional por ciúme.
Ela alegou que queria que a colega “sofresse”, mas não desejava causar a morte da jovem. Na ocasião, uma representação foi enviada à Justiça para a apreensão da menor de idade.
De acordo com informações obtidas com a investigação, a adolescente já tinha praticado a mesma ação contra outra garota. No caso anterior, a jovem tentou se vingar de uma menina que teria ficado com seu namorado. A vítima passou mal, mas se recuperou.
A Delegacia de Itapecerica da Serra ainda investiga o caso para esclarecer todos os fatos.
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