Da Redação
04/08/2022 07:30
Daniel Medeiros
Doutor em Educação Histórica
Tive na faculdade um colega com o qual gostava muito de trocar ideias. Quase sempre divergíamos de posição, ele sempre em defesa de um Estado de Segurança e eu sonhando com um Estado de Bem-Estar Social.
Mas os seus argumentos buscavam respeitar a lógica própria das ideias, e ele desenvolvia-os com cuidado e sempre com espaços para as minhas intervenções.
Da mesma forma – muitas vezes, com bastante perspicácia –, ele abria flancos nas minhas argumentações, obrigando-me a reavaliá-las e até mesmo refazê-las.
Uma certa vez, estávamos em um boteco próximo da universidade, bebendo e exercitando nossas ideias, quando deparei-me com uma faceta ainda desconhecida desse meu colega: ele tratava mal o garçom.
A primeira vez me surpreendeu, mas deixei passar, duvidando do que ouvira. Na segunda vez, ficou claro que o cidadão ignorava as mais básicas regras de tratamento cordial com os empregados, quanto mais – o que eu acredito – o necessário respeito e atenção com todos os trabalhadores, particularmente os que nos servem, aos quais tenho um senso de gratidão enorme.
Nada mais podia acontecer em nossa até então interessante amizade a partir dali. Eu havia encontrado um antagonismo insuperável, e nossas conversas terminaram.
Todos temos convicções, e o fundamento da cidadania é o respeito pelas convicções dos outros, desde que essas convicções não signifiquem, justamente, a destruição das nossas. Essa é a diferença básica entre divergência e antagonismo.
Não se pode pedir que um judeu “reconheça” os argumentos de um nazista. Todo debate de ideias tem uma área verde na qual a troca de opiniões pode ser enriquecedora e uma área vermelha na qual uma posição contrária implica a destruição de uma convicção fundamental.
Em tese, pode-se até admitir um tema, mas jamais considerá-lo como uma prática cotidiana, um fato entre outros fatos. A existência de um partido nazista, por exemplo.