Nas obras, tintas à base das cinzas dos incêndios que devastaram o Pantanal entre 2020 e 2024
O Salão Nobre da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), abriga hoje, a partir das 16h (horário de MS), o lançamento da exposição “Cinzas da Floresta – Bioma Pantanal: Um Chamado Para a Conservação das Áreas Úmidas à Luz da COP30”. A mostra reúne mais de 30 obras de artistas de rua de diferentes regiões do País, criadas com tintas à base das cinzas dos incêndios que devastaram o Pantanal entre 2020 e 2024.
A exposição é parte do desdobramento do projeto criado pelo artivista Mundano, em 2021, que transforma as cinzas de incêndios florestais em pigmentos para as obras de arte. Criado como resposta à banalização da destruição ambiental nos noticiários, o projeto percorreu regiões atingidas pelo fogo para coletar cinzas diretamente nos biomas brasileiros, transformando-as em tinta para obras de denúncia e resistência.
Realizada em parceria com a Environmental Justice Foundation (EJF), o Documenta Pantanal, o Instituto SOS Pantanal, o WWF-Brasil, a Wetlands International e a Frente Parlamentar Ambientalista, a iniciativa une arte, ciência e mobilização política para destacar a importância das áreas úmidas em meio à crise climática.
As obras, ao mesmo tempo poéticas e contundentes, transformam a destruição em denúncia. As cinzas dão corpo a imagens que revelam o impacto humano e ambiental dos incêndios florestais. “Queremos sensibilizar os representantes do povo para a urgência de proteger o Pantanal e os outros biomas brasileiros”, diz Mundano. Artistas como Mari Pavanelli, Carina Mello, Benson, Berg e Nels Armour participam da mostra, que leva a arte das ruas do Brasil aos corredores do Congresso.
RESILIÊNCIA CLIMÁTICA
“Quais sentimentos despertamos ao dizer que 17 milhões de vertebrados morreram nos incêndios de 2020? Certamente a indignação é um deles. Mas uma obra de arte pode despertar uma reflexão além desse sentimento? Uma obra de arte pode provocar uma ação?Apostamos nisso”, afirma Mônica Guimarães, diretora do Documenta Pantanal.
O lançamento da mostra que está aberta à visitação desde ontem, no Espaço Cultural Senador Ivandro Cunha Lima, ocorre em momento decisivo: em junho de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o Congresso aprove, até dezembro deste ano, uma lei federal de proteção ao Pantanal, conforme previsto desde 1988 pela Constituição.
O prazo é uma resposta à omissão histórica do Legislativo, reconhecida pelo STF como inconstitucional. Fruto disso, o PL 2334/2024 e o PL 5482/2022 tramitam para a apreciação dos congressistas.
“As áreas úmidas cobrem apenas 6% do planeta, mas armazenam tanto carbono quanto todas as florestas do mundo”, destaca Luciana Leite, representante da EJF no Brasil. “Falar de Pantanal e de áreas úmidas, em geral, é falar sobre resiliência climática, sobre soluções baseadas em natureza, sobre proteção contra eventos extremos. E isso também precisa estar no centro da COP30”, diz Luciana.
No Brasil, estima-se que as turfeiras (zonas úmidas que acumulam turfa, material orgânico formado da decomposição incompleta de vegetais) armazenem cerca de 39 bilhões de toneladas de carbono – 44 vezes mais do que as emissões totais da União Europeia em 2023, por exemplo. Quando degradadas, essas áreas se tornam grandes emissoras de carbono. Em 2020, os incêndios no Pantanal liberaram 115,6 milhões de toneladas de CO, mais do que as emissões da Bélgica naquele ano.
“Áreas úmidas são grandes aliadas contra as mudanças climáticas, e o Pantanal é um grande símbolo delas, a maior planície alagável de água doce do mundo. Além da conscientização constante sobre o Pantanal, o objetivo dessa ação é colocar as áreas úmidas em maior destaque para atrair mais atenção e investimentos do mundo”, diz Leonardo Gomes, diretor executivo do Instituto SOS Pantanal.
A exposição é, portanto, um alerta visual poderoso, que prega a urgência de alinhar a agenda ambiental do País aos compromissos globais. A mostra ficará aberta até sexta-feira.
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