Os primeiros minutos de dinâmica do projeto Vou de Boa sofreram com as consequências da timidez: nem sempre é fácil se abrir perante o outro, confessar as ansiedades, os defeitos e as qualidades que nos unem. Reunidos em um círculo, seis adolescentes que cumprem medidas socioeducativas na Unidade Educacional de Internação (Unei) Dom Bosco precisaram vencer essa barreira e compartilhar informações com quem convivem diariamente.
Fundamentado na teoria do psicodrama, uma abordagem psicológica criada por Levy Moreno (1889 – 1974), o projeto Vou de Boa começou na unidade semana passada e estima atender cerca de 60 adolescentes que cometeram atos infracionais e agora cumprem medidas socioeducativas na instituição.
Uma grande terapia em grupo, o psicodrama é um casamento bem-sucedido entre a psicologia e as ciências sociais, tendo por objetivo principal observar como os indivíduos se relacionam em grupo. “Ao todo serão quatro encontros com esse grupo de adolescentes, sendo que no primeiro momento eu preciso acolher os jovens”, explica o idealizador do projeto e psicólogo, Jean Carlos Barros de Campos.
Defensor da ressocialização, Campos explica que em cada encontro os adolescentes realizarão atividades diversas, que envolvem: aquecimentos específicos, dramatização e o compartilhamento de emoções. Logo no primeiro momento, os jovens precisaram deixar a timidez e o desconforto de lado e responder a uma série de perguntas sobre personalidade na frente de todos. A relação com a família, com o trabalho e com o autocuidado foram alguns dos temas abordados. “Essa parte é a matriz inicial. Eu preciso lidar com as diferenças deles e nesse momento eu estou acolhendo os adolescentes. Nós temos diversas fases de atuação, desde o aquecimento inespecífico, o específico, a dramatização e o compartilhar. Por isso o jogo do início”, ressalta Campos.
Dramatizar é um dos pontos centrais do psicodrama ou sociodrama. Para a teoria, após o aquecimento inicial, os participantes desenvolvem um tema e o dramatizam, ou seja, constroem uma cena nos moldes do teatro. Conforme a encenação dos personagens acontece, é possível se colocar no lugar do outro e desenvolver a empatia.
“Nosso objetivo primordial é a ressocialização. Estamos buscando fortalecer vínculos familiares e trabalhar temas transversais como o respeito. O psicodrama é o nome mais famoso da teoria, mas aqui trabalhamos o sociodrama, que é o pensamento em grupo. Nós pensamos na relação eu–tu, no olhar para o outro com os olhos do outro”, explica o psicólogo.
O projeto ainda está na fase inicial. “Eu sou psicólogo e analista em ações socioeducativas. Na Unei, trabalho com orientações psicológicas e agora estou montando o grupo. Acredito que seja o primeiro que aborda o psicodrama aqui na Unei Dom Bosco. Soube que aconteceu um projeto semelhante apenas em Ponta Porã e Três Lagoas”, indica.
Para um dos participantes, um adolescente de 17 anos cuja identidade será preservada, as atividades trouxeram um pouco de tranquilidade para o cotidiano da unidade. “Eu achei bem interessante e bem diferente. Nunca participei de algo assim aqui”, acredita.
Cumprindo medida socioeducativa há um ano, o jovem carrega um rosário no pulso e foi um dos mais atuantes no desenvolvimento da dinâmica. “Durante a atividade eu tive um sentimento de esperança, de paz, de que tudo vai dar certo”, diz.