Pesquisa da Federação de Comércio de Mato Grosso do Sul (Fecomércio-MS) já aponta os impactos do novo coronavírus na economia local. Houve queda de 6% na intenção de consumo em geral e de 30% na área de eventos e comemorações, como festas, casamentos e confraternizações. Os números foram captados entre os dias 2 e 9 deste mês, e a economista Daniela Dias, que comanda o estudo, não descarta um impacto ainda maior. “É um cenário muito dinâmico, que se altera a cada dia”, explica.
O mesmo estudo ainda mostra que o temor do alastramento do novo coronavírus já gera reflexos no faturamento. “Até o momento, a gente já teve algumas quedas, especificamente no comércio. A proporção dessa queda, em termos de movimentação financeira, ainda é pequena, mas ela pode ganhar maiores proporções, dependendo do anúncio de mais casos”.
Na quinta-feira, Daniela Dias já havia afirmado ao Correio do Estado que um temor quanto à paralisação das atividades por causa do novo coronavírus já existia. No sábado, com a confirmação dos dois primeiros casos de Mato Grosso do Sul, em Campo Grande, o cenário foi alterado. “Já vimos que em Campo Grande as aulas na rede pública e os eventos serão suspensos. Isso gera impacto”, afirma.
A economista afirma que as medidas de prevenção, apesar de seus efeitos, são importantes. “Se elas [as medidas] não forem tomadas, a gente pode ter impactos ainda mais significativos sobre o comércio”, alertou.
O decreto do prefeito Marcos Trad (PSD), que deve ser publicado hoje (leia mais nesta edição), suspenderá eventos com mais de 100 pessoas e poderá atingir até mesmo sessões de cinema. No domingo, o movimento nos shoppings de Campo Grande já era aparentemente menor do que em outros fins de semana.
DELIVERY
Ao passo que o movimento no setor de eventos e o consumo no comércio físico possam cair por causa do temor do novo coronavírus, a tendência, segundo Dias, é a de que o movimento nos supermercados aumente e que os serviços de entrega possam compensar os restaurantes pelas perdas com a possível queda de movimento. “As pessoas vão ficar mais em casa”, lembrou.
Daniela acrescentou que a Fecomércio fará estudos diários para verificar como o setor será afetado pelo avanço da epidemia do novo coronavírus. “A gente precisa se atualizar e ajudar os empresários”.
Economistas se dividem sobre soluções à crise
Os efeitos do novo coronavírus na economia brasileira já geram divergência entre economistas. Há os que defendem o aprofundamento das reformas e a manutenção da austeridade do Estado, e existem os que defendem a flexibilização de medidas de contenção implantadas recentemente, como o teto de gastos.
Monica de Bolle, pesquisadora sênior em Washington do Peterson Institute for International Economics, nos Estados Unidos, está entre as que defendem a volta do investimento público e a suspensão do teto de gastos. Na avaliação dela, seria uma medida contracíclica que ajudaria a evitar nova recessão.
Para a economista, o governo Bolsonaro precisa reconhecer que o cenário econômico mudou e trocar a agenda de reformas por uma agenda de investimentos públicos em infraestrutura. “É preciso deixar a ideologia de lado”.
Perguntada se a crise vai durar pouco, ela afirmou: “Não vai melhorar tão cedo. A coisa tende a ficar tensa por um bom tempo. A questão do petróleo é pontual e afeta o Brasil, mas a crise sanitária é mais grave do que se pensava”, lembrou
Mônica Debolle questiona a forma como foi arquitetado o limite para o teto de gastos. “A maneira como ele foi desenhado foi equivocada: a gente fez um teto rígido, que não permite fazer uma medida anticíclica quando for preciso”.
Ela pondera sobre o caso da infraestrutura, que pode ser um caminho para evitar a recessão. “Alguns investimentos podem começar imediatamente. Há um grande número de concessões paradas e tudo isso terá de avançar. E o governo vai ter de deixar a ideologia de lado e voltar a envolver o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social [BNDES] nesses investimentos. Não adianta ficar demonizando o banco”, avaliou.
REFORMAS
Há também os economistas que defendem o aprofundamento das reformas, como a administrativa, a tributária e a PEC emergencial.
“Se tivermos clareza sobre as reformas, como elas vão andar, se virmos um clima de parceria entre Executivo e Congresso em volta de uma agenda que permita reduzir a incerteza doméstica, melhoraria o ambiente de negócios e tornaria o Brasil muito mais interessante do ponto de vista do investimento”, diz Armando Castelar, coordenador da área de Economia Aplicada do Ibre/FGV.