O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) aumentou a taxa básica de juros, a Selic, em 1,5 ponto porcentual, de 6,25% para 7,75%. Para economistas, com o descontrole da inflação, a tática de aumentar os juros não deverá conter o índice e ainda reduzirá a recuperação econômica no País.
A última vez que os juros ficaram acima de 7,5% foi em setembro de 2017, quanto atingiram 8,25%. Enquanto o último reajuste acima de um ponto porcentual foi em dezembro de 2002, quando a taxa passou de 22% para 25%. É também o maior nível registrado no governo Bolsonaro. Quando o presidente chegou ao poder, a taxa Selic estava em 6,50%.
A principal justificativa para acelerar o aumento dos juros é tentar conter a inflação, que em setembro chegou a 1,16% na média nacional, acumulando alta de 6,90% em 2021 e, em 12 meses, 10,25%. Porém, a perda de confiança com o possível furo no teto de gastos também influenciou o aumento mais agressivo da taxa.
O doutor em Economia e professor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (Uems) Mateus Abrita explica que o efeito imediato da alta dos juros é frear a atividade econômica.
“Justamente pelo encarecimento do crédito, por exemplo. Outro ponto importante é que estamos enfrentando uma inflação muito relacionada com ‘choque de custos’, isto é, por conta da desarticulação produtiva de alguns setores no mundo frente à pandemia, do enfraquecimento do real, da alta dos combustíveis e da energia”.
“Esses elementos acabam aumentando os custos de produção e, por sua vez, são repassados aos preços. Nesse sentido, o efeito da alta de juros para corrigir esses problemas é bastante limitado”, completa Abrita.
A economista Daniela Dias alerta que outros fatores têm impactado o índice inflacionário, por isso, o aumento dos juros pode não controlar a inflação.
“Quando a gente olha para a inflação específica, como a de alimentos, por exemplo, temos vários fatores que influenciam, e não somente a demanda interna. Como o aumento da demanda mundial por alimentos, a questão do câmbio, que tem trazido uma inflação de custo, ou seja, está mais caro produzir. Talvez a Selic não seja suficiente para controlar a inflação, considerando esses outros fatores no momento”, detalha.
Para o economista Eugênio Pavão, a economia sofrerá os impactos da alta das taxas de juros para empréstimos e financiamentos, reduzindo a recuperação da economia.
“A queda do consumo é a consequência da alta da taxa de juros. Os impactos são redução da renda, redução de consumo, aumento do endividamento, abandono de investimentos pelas empresas, entre outros”.
Conforme o Banco Central, o Copom antevê outro ajuste de mesma magnitude, ou seja, de 1,5 ponto porcentual, para a próxima reunião.
CRÉDITO
A taxa básica serve como referência para outros juros do mercado. Com isso, as instituições financeiras elevam os juros e desestimulam o consumo de bens duráveis, a tomada de empréstimos e os financiamentos.
O economista Holger Heimbach explica que os demais juros utilizados pelas instituições financeiras direta ou indiretamente são influenciadas pela Selic. “Assim, quando ela sobe, os juros dos financiamentos [habitacional, automóveis, investimento empresariais, etc.] também subirão e, consequentemente, encarecerão o crédito no Brasil”.
Segundo Pavão, os juros praticados pelas empresas de cartão de crédito, que já são altos, ficam ainda maiores. “Chegando a 300%, 400% ao ano. Todo aumento da Selic leva ao aumento dos juros dos cartões, entretanto, a queda não reduz esses juros”.
A decisão de ontem foi o sexto aumento consecutivo dos juros, após o BC cortar a taxa básica à mínima histórica (2,0%) em meio à pandemia da Covid-19.
Em setembro e em agosto, o aumento foi em um ponto porcentual e, nas três decisões anteriores, o BC subiu a taxa em 0,75 ponto porcentual. Em março, a taxa foi ajustada de 2% para 2,75%, em maio para 3,50%, em junho foi a 4,25%, em agosto a 5,25% e em setembro, a 6,25%.
Conforme o boletim de mercado Focus, a expectativa é de que o índice chegue a 8,75% até o fim do ano. Já a previsão das instituições financeiras para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do País, subiu de 8,69% para 8,96%
De acordo com publicação do Estadão, com as seis altas da Selic, o Brasil voltou a registrar a maior taxa de juros real (descontada a inflação) do mundo, considerando as 40 economias mais relevantes.
Cálculos do site MoneYou e da Infinity Asset Management indicam que o juro real brasileiro está agora em +5,96% ao ano. Na segunda e terceira posições, aparecem a Rússia (4,77%) e a Turquia (3,46%). A média dos 40 países considerados é de -0,96%.
INVESTIMENTOS
Especialistas de mercado apontam que o investimento em renda fixa se torna mais atrativo com o aumento dos juros. No entanto, acreditam que manter uma carteira diversificada de investimentos ainda é recomendado, considerando a inflação.
Com a nova taxa Selic, a rentabilidade da poupança passa a ser de 0,44% ao mês e de 5,43% ao ano.
Também melhora a rentabilidade de investimentos em renda fixa, como títulos públicos vendidos por meio do Tesouro Direto, Certificado de Depósito Bancário (CDBs), Letras de Crédito Imobiliário (LCI), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificados de Recebíveis Imobiliários e do Agronegócio (CRI e CRA) e debêntures, que são títulos emitidos por empresas para financiar seus projetos e operações.
“A alta da Selic tira o foco dos investimentos em renda variável [bolsa de valores], tornando a renda fixa mais atraente, como os títulos públicos”, diz o economista Eugênio Pavão.
Abrita ressalta que é preciso observar o ganho real dos investimentos. “A renda fixa começa a ficar mais atrativa nesse contexto, entretanto, destaco para sempre observar o ganho real dos investimentos, quer dizer, aquele ganho que está acima da inflação”, pondera.
Ainda de acordo com os especialistas consultados, a diversificação da carteira ainda é interessante.
“Todo momento é bom para investir. Agora, por exemplo, está muito interessante, com a bolsa lá embaixo, para comprar no mercado de ações – é um bom ponto de entrada. Hoje a Selic está a 7,75% e acaba abrindo opção dos pré-fixados também. Sempre tem que ter diversificação”, afirma o assessor de investimentos Eliseu Nantes.