As mudanças implementadas pela Prefeitura de Campo Grande nas regras para obtenção de descontos voltados ao pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) devem provocar aumento da inadimplência.
O decreto nº 15.440, publicado no Diogrande de 25 de novembro do ano passado, retira os 10% de desconto para pagamento do IPTU à vista com parcela única a partir de 10 de fevereiro e também extingue o desconto de 5% no parcelamento em 10 vezes.
O decreto mantém o desconto de 20% em parcela única com vencimento em 10 de janeiro e aumenta de 10 para 12 o número de parcelas para quem não pode pagar à vista.
Conforme fontes consultadas pelo Correio do Estado, a média de contribuintes que pagam à vista é de 30%, dos que parcelam, 40%, e aqueles que não pagam somam 30%. Com menos descontos, a tendência é aumentar o número de pessoas que vão postergar o pagamento do imposto.
Para o ex-secretário municipal de Finanças de Campo Grande, deputado estadual diplomado Pedro Pedrossian Neto (PSD), a retirada de várias modalidades de desconto no IPTU 2023 é uma maneira de punir o contribuinte.
Segundo ele, os 8% de aumento no tributo pela correção pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), somados à retirada dos 5% de desconto para os que parcelavam o tributo, acabam punindo quem tem menor aquisitivo.
“Não entenderam que esses 5% eram muito mais que um desconto, eram um bônus por ser adimplente”, disse o ex-secretário e deputado. “Para quem é mais pobre, o aumento é de pelo menos 13%”, criticou Pedrossian Neto.
A presidente da Comissão de Assuntos Tributários da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Mato Grosso do Sul (OAB-MS), Janaína Galeano, afirmou que, até o fim da próxima semana, a entidade vai publicar um estudo tributário com avaliação detalhada sobre o fim do desconto do IPTU nos porcentuais de 5% e 10%.
No entanto, ela deixou claro “que esse tiro pode sair pela culatra”, principalmente porque muitos contribuintes vão acabar postergando o pagamento do IPTU e esperando pelo Programa de Pagamento Incentivado (PPI) de Campo Grande, o popular Refis.
“Não será difícil de os contribuintes optarem por quitar logo o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores [IPVA], além de pagar a matrícula nas escolas particulares e parcelas de compras de material escolar”, avaliou a advogada.
REFIS
Uma das causas para o postergamento do IPTU é o fato de a Prefeitura de Campo Grande promover o Refis todos os anos, concedendo descontos de quase 100% nos juros e nas multas. Se um por um lado a medida acaba conseguindo atrair o contribuinte no fim do ano, por outro, ela também afasta o compromisso com o IPTU já em janeiro.
De acordo com reportagem publicada pelo Correio do Estado em 27 de dezembro de 2022, em seis anos, a Prefeitura de Campo Grande arrecadou R$ 414 milhões em impostos recuperados.
Em 2017, o caixa da prefeitura recebeu R$ 52 milhões; em 2018, o montante foi de R$ 54,2 milhões; em 2019, o valor saltou para R$ 76 milhões renegociados; em 2020, os números foram para R$ 81,5 milhões; em 2021, o valor subiu para R$ 96,2 milhões; e ano passado fechou em R$ 54,1 milhões.
De acordo com a Secretaria Municipal de Finanças e Planejamento (Sefin), já foram enviadas 220 mil correspondências com os carnês, com uma estimativa de arrecadar cerca de R$ 40 milhões.
Na ocasião, a titular da Pasta, Márcia Hokama, chegou a dizer que “é de suma importância que os contribuintes regularizem seus débitos, pois não há previsão de outro Refis”.
Ela só não mencionou que a esporadicidade desse Refis tornou-se anual desde 2017. Na prática, o pagamento do IPTU acaba sendo substituído pelo Refis todos os anos.
Nesse caso, como os descontos de juros e de multas são válidos para quem pagar à vista, outra vez os contribuintes mais pobres acabam sendo penalizados.
O advogado Vinícius Pizetta, que em dezembro de 2022 denunciou a Prefeitura de Campo Grande por aplicar um reajuste de 130% no IPTU dos 150 moradores do residencial Terra Morena, no Bairro Jardim Los Angeles, informou que há dois dias a isenção – retirada ano passado – voltou.
No entanto, ele ressaltou que esses contribuintes só poderão usufruir desse benefício se entrarem na Justiça e comprovarem que não houve melhoria no bairro advinda de obras do poder público. Ele explicou ainda que, em até 60 dias, a Justiça vai expedir alguma liminar, mas também deixou claro que o processo deve durar cerca de dois anos.
Atualmente, o limite de isenção do IPTU é para imóveis com valor venal de até R$ 83 mil. No caso dos imóveis no residencial Terra Morena, o valor havia saltado de R$ 43 mil para R$ 93 mil.
“Só o reajuste para repor as perdas inflacionárias já causa um grande impacto”, acrescentou Pizetta. A estimativa de arrecadação da prefeitura para este ano é de R$ 620 milhões.
