Escolher a profissão que vai seguir pelo resto da vida já não é tarefa fácil, mas pode ficar ainda mais complicada quando se é um adolescente superdotado, com altas habilidades para várias áreas de conhecimento. “Toda pessoa com superdotação tem inteligência acima da média e, logo, vai ter facilidade para entrar em qualquer faculdade. Tem habilidade para ser um bom profissional na carreira que escolher. Mas sempre tem uma área de maior interesse, que se ele conseguir identificar e se dedicar, com certeza, vai ser realizado”, explica a psicóloga do Núcleo de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação (Naahs-MS), Norma Eliza Geraldi.
Ajudar nessa missão de escolha da futura carreira e oferecer atividades para desenvolver as habilidades do aluno são trabalhos do núcleo, que atende, em Campo Grande, 62 crianças e adolescentes, entre 6 e 18 anos. São estudantes da rede estadual e particular que participam no contraturno escolar de aulas complementares gratuitas.
A psicóloga explica que a orientação profissional é oferecida aos que solicitam, geralmente alunos que estão já no ensino médio, mas que, durante todas as atividades regulares do núcleo, o adolescente é incentivado a trabalhar com sua área de interesse e, consequentemente, ir dando os primeiros passos na definição da sua carreira profissional.
A área de interesse é identificada em conjunto com o processo de diagnóstico da superdotação, que acontece após os dez anos de idade, e é importante para direcionar o jovem para qual área ele tem mais talento, além de facilidade. Norma diz que o leque de oportunidades que o superdotado tem é amplo, em razão da alta capacidade intelectual, mas que a preocupação do núcleo é engajar o estudante na profissão que seja do seu interesse. “Porque não adianta ele fazer algo que a família quer, que dê mais dinheiro, mas que não seja o que gosta”, frisa. Ela diz que esse é o problema, geralmente, de alunos com altas habilidades na área de artes. “Temos a cultura de que viver de arte não enche barriga, mas a gente trabalha para mostrar que, se for esse o seu talento, sendo um bom profissional, ele pode sim ser bem-sucedido”, detalha. Mas há, também, os casos de estudantes com habilidades gerais acadêmicas. “Aí, nós vamos ajudar esse aluno a focar em uma área e seguir adiante”, diz.
SUPERDOTADO COM ORGULHO
Aluno do segundo ano do ensino médio, Lennox de Oliveira, 16 anos, gosta de arte e faz esculturas. Mas, quando é questionado sobre qual curso vai escolher para a faculdade, a resposta é diversificada. “Sem nada definido até agora. A arte é uma grande possibilidade, mas estava pensando também em Arquitetura, Direito...”, revela. A única certeza, por enquanto, é a de que não pretende optar por alguma graduação na área de exatas. “É mais cansativo para mim o que envolve números”, conta.
O adolescente participa há três anos das atividades, após ser “descoberto” pelo Naahs na escola estadual em que estudava. Na sala de aula, ele sempre foi um aluno com boletim recheado de dez nas notas, mas não pensava que poderia ser um superdotado. “Eu percebia que aprendia mais rápido, mas achava que era uma coisa minha. Nunca passou pela cabeça que seria um superdotado”, relata.
A oportunidade de “aprender mais” sobre o que lhe interessa é o que faz ele permanecer nas aulas do núcleo. No entanto, a sensação de se sentir “como todo mundo” e não ser o “CDF” da turma em meio aos amigos que fez no Naahs também conta como atrativo. “Aqui a gente conversa de igual para igual, não sou o CDF”, frisa.
Tímido, ele conta que já ouviu muitas brincadeiras e apelidos por ser bom aluno na escola, mas prefere destacar os benefícios e elogios que ganha por ser um superdotado. “Eu gosto de ter essa capacidade. Não é um peso para mim. As pessoas me chamam de ‘nerd’,mas não vejo isso”, conclui.
IDENTIFICAÇÃO
O trabalho do Naahs é em conjunto com os pais e professores das escolas regulares, que ajudam a identificar alunos com altas habilidades e encaminham para o núcleo. De acordo com a coordenadora, Graziela Cristina Jara, hoje aproximadamente 122 crianças e adolescentes estão em avaliação. Para os que têm até 10 anos de idade, o Naahs faz acompanhamento, com atividades de observação, para só depois diagnosticar com precisão a superdotação e as habilidades específicas.
Para ser considerado superdotado é preciso atender a três fatores: habilidade acima da média, criatividade e envolvimento com a tarefa. Durante o mapeamento, já é detectada a área de interesse daquele aluno. Depois disso, ele é direcionado para as aulas do núcleo.
Graziela explica que o diferencial desse aluno é a sede por aprender mais e a capacidade de envolvimento com a atividade por horas, sem, às vezes, nem perceber. “O prazer dele está em vir aqui e aprender mais sobre o que é de interesse para ele”, frisa. Desde 2007, 400 alunos com superdotação foram identificados pelo Naahs em Mato Grosso do Sul. A coordenadora, no entanto, diz que a média de atendimento é de 60 estudantes geralmente, isso porque os alunos não têm direito a transporte gratuito, o que inviabiliza a participação daqueles que não têm condições financeiras.