Uma proposta que tramita no Congresso Nacional pretende alterar a Lei de Falências para que produtores rurais possam pedir recuperação judicial dentro de um plano especial desde que o valor das dívidas não seja maior que R$ 4,8 milhões. Nesses casos, não haveria a necessidade de ter um CNPJ para abrir a ação, porém, a informalidade e a burocracia são entraves para facilitar o acesso às medidas.
Na recuperação judicial, o endividado junta todas as pendências financeiras e propõe um plano de pagamento. Os credores, reunidos em assembleia, podem aprova-lo ou não. É um instrumento utilizado com grandes companhias, com débitos milionários.
Ela poderia ser uma boa alternativa, especialmente em Mato Grosso do Sul, onde dados do último Censo Agropecuário mostraram que das 71.164 mil propriedades economicamente ativas no Estado, 43.223 são de famílias que integram a agricultura familiar, o que representa 61%.
Houve aumento de 2.969 estabelecimentos classificados dessa, na contramão do cenário nacional que aponta uma redução de 9,5%. A principal atividade econômica dos estabelecimentos é a criação de bovinos com 26.473 estabelecimentos e uma área de 904.375 ha, seguida pelo cultivo de soja com 3.037 estabelecimentos e 105.877 ha.
Contudo, análise feita por especialistas ao site Jota Justiça aponta que grande parte desse público não formaliza suas atividades, seja pela distância para ir até um centro urbano, seja pelos custos ou até mesmo burocracias dos procedimentos. E esses trâmites dificultam até mesmo quem já tem um CNPJ e vai à bancarrota.
O dono de um pequeno mercado de bairro, por exemplo, muitas vezes prefere simplesmente fechar as portas ao falir do que abrir uma ação de recuperação judicial, o que poderia lhe ajudar até mesmo a continuar na ativa. Ainda é mais fácil agir desta forma, mesmo com todos os avanços que já deram mais celeridade aos processos.
Um estudo do Observatório da Insolvência – iniciativa do Núcleo de Estudos de Processos de Insolvência (NEPI/PUC-SP) e da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) – mostrou que de 906 processos de recuperação judicial analisados no estado de São Paulo entre janeiro de 2010 e julho de 2017, apenas 92 (10,1%) foram requeridos por microempresas e 94 (10,3%) requeridas por empresas de pequeno porte.
A Justiça pode ser a solução para essa questão. Decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, entenderam que uma sociedade empresária agrícola pode pedir recuperação judicial provando a atividade econômica ainda exercida como pessoa física. A Lei de Falências prevê que uma empresa só pode abrir o processo se estiver dois anos na ativa. No caso dos pequenos produtores rurais, servem as atividades como pessoa física mesmo antes da criação da sociedade ou da cooperativa.
Divergências, nesse caso, girariam em torno do entendimento de que uma empresa só nasce oficialmente a partir do seu registro na Junta Comercial de uma unidade da federação. A decisão do STJ não vale para todos os casos, ainda não é considerada vinculante, mas abre caminho para que futuramente o procedimento possa ser ampliado junto aos agricultores familiares, fortalecendo ainda mais o setor.