Muitas propostas e pouco consenso. É assim que caminha a reforma tributária no Congresso Nacional, fazendo com que o tema, considerado essencial para a economia brasileira, se arraste sem perspectivas de encaminhamento. Entre os vários pontos de discussão está a cobrança de imposto sobre os dividendos, que correspondem aos lucros divididos entre os acionistas, sobre os quais nenhum imposto é cobrado desde 1995.
O administrador e especialista em investimentos pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) Trajano Ellera Gomes disse ao Correio do Estado que o Brasil é um dos poucos que não cobram nada sobre os dividendos, se comparado aos demais países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
“A interpretação é a seguinte: a carga tributária que a empresa sofre já seria suficiente para compensar os impostos diretos e indiretos no sentido da arrecadação pública. Os acionistas e empresários apurariam o lucro final da empresa e conseguiriam receber ele na pessoa física sem a necessidade de pagar mais um imposto, porque existe uma carga tributária que já incide sobre a empresa”, explica.
O que está sendo proposto, e o que a classe empresarial consideraria justo, seria tributar via Imposto de Renda as parcelas de lucros recebidas pelos acionistas, ao passo que a carga tributária das empresas fosse reduzida para que se evitasse dupla cobrança de impostos.
“É como se reduzindo a carga tributária da empresa, o lucro seria maior. Quando distribuído às pessoas físicas, seria elas por elas”, afirma Gomes.
O problema, segundo ele, é que os primeiros esboços das propostas divulgados pelo governo mostram que nem todas as empresas teriam o benefício da redução de PIS/COFINS. “Então alguns setores teriam aumento, em alguns casos a carga chegaria a triplicar. Então teria uma maior tributação na pessoa jurídica e uma tributação na distribuição desses lucros”, diz o especialista.
A classe empresarial espera que a promessa do Governo Federal seja cumprida, embora a questão dependa, na verdade, do entendimento dos parlamentares, que poderão mudar as propostas.
“Só vamos ter certeza disso quando a proposta for votada e trazida a público para podermos analisar o impacto final e se realmente esse discurso do governo será cumprido. Vamos precisar que a proposta seja incluída e votada para sofrer as modificações para saber”, diz Gomes.
REFORMA
Existem quatro propostas de reforma tributária no Congresso. O Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 45, que tramita na Câmara dos Deputados, é visto como o pior para o setor produtivo por implicar em uma série de situações que aumentariam a carga tributária. Por exemplo, o Imposto Sobre Serviços (ISS), que hoje tem alíquota máxima fixada em 5%, poderia ir para 25% graças à norma dentro de um imposto único federalizado, que repassaria aos estados e prefeituras determinada fatia do que foi arrecadado.
A PEC 110 tramita no Senado. Ela também prevê a junção do ICMS estadual com o ISS cobrado pelas prefeituras. Na avaliação de especialistas, retiraria a autonomia dos entes federativos em lidarem com seus próprios impostos.
Já a proposta do Governo Federal só mexe com tributos federais, unificando-os em uma única cobrança sobre movimentações financeiras. Há quem diga que seria uma nova CPMF, que seria compensada com a desoneração da folha de pagamento.
Por fim, existe o Simplifica Já. Essa proposta foi apresentada pelos municípios sem perdas para prefeituras e estados. Prevê a criação de um imposto único sobre valor agregado, como o IBS, mantendo a autonomia dos entes federativos.
CONFUSA
Uma comissão mista (com senadores e deputados) foi criada para tentar unificar todas essas propostas em apenas uma, mas o consenso não tem sido muito fácil. Os trabalhos do grupo foram prorrogados até dezembro, de modo que o relatório saia dia 10.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), admite que há possibilidade de votar a reforma em dezembro caso haja um acordo entre parlamentares e governo.
DIVIDENDOS
Cobrar imposto sobre os dividendos é uma bandeira levantada pelo Governo Federal. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que a tributação sobre lucros e dividendos no Brasil teria um potencial de arrecadação entre R$ 22 bilhões e R$ 39 bilhões.
As críticas em torno dessa proposta é que haja uma compensação com a redução de outros impostos. Nem sempre uma empresa grande tem acionistas grandes e o impacto pode ser grande para alguns.
Por enquanto, espera-se que os trabalhos evoluam a tempo de passar antes do recesso parlamentar.