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Política Um senhor ator Um senhor ator 10 FEV 2010 • POR MANOELA REIS, TV PRESS • 21h34

É quase impossível falar sobre a carreira de Milton Gonçalves sem refletir sobre a trajetória da TV Globo. Ele entrou na emissora em seu ano de inauguração – 1965 – e desde então é contratado da empresa. “Neste momento sou o ator mais antigo em constante atividade e ligação com a Rede Globo”, contabiliza o ator, que teve seu primeiro trabalho na TV em “Padre Tião”, novela produzida pela Globo em dezembro de 1965. Milton foi convidado por Octávio Graça Mello que, nos anos 60, era um conceituado ator teatral, para trabalhar na emissora. “Eu trabalhava com teatro. Com a inauguração da TV, comecei a insistir e teimar para trabalhar nesse veículo”, garante. E essa teimosia é motivo de orgulho para Milton, que também se envaidece de ser um dos primeiros atores negros na TV brasileira. “Precisei peitar muita gente que me chamava de ‘negrinho abusado’. Foram épocas difíceis, mas fui insistente”, lembra ele, que fala com extrema paixão sobre a inclusão dos negros no mercado de trabalho televisivo. “Nos primórdios também sofri pressões dos próprios negros. Meu personagem era casado com uma branca em ‘Baila comigo’, mas eles reclamavam que nós não nos beijávamos na boca”, conta, se referindo à novela de Manoel Carlos, exibida em 1981. Assim que recebeu a reclamação, Milton foi procurar Beatriz Lima, que interpretava seu par romântico, e propôs o beijo. “Depois só faltou ficarmos pelados”, brinca. Antes deste papel, Milton já havia pedido a Dias Gomes personagens que não se referissem ao negro como empregado. “Não queria fazer mais um ‘coitadinho’. Pedi um papel em que pudesse usar terno, gravata e um sapato engraxado. Ele foi atrás da Janete Clair com o meu pedido”, lembra. Graças ao pedido, Janete convidou Milton para interpretar o Dr. Percival, um psiquiatra, em “Pecado capital”, cuja versão original foi exibida em 1975 na Globo. “Foi um susto para muita gente. Um negro com todos aqueles diplomas”, ressalta. Apesar de afirmar ter sofrido com o preconceito, Milton sente falta da TV dos anos 60 e 70. “Nós tínhamos mais paixão. Hoje os jovens não querem ser atores e sim celebridades. Está tudo trocado”, lamenta, antes de ressaltar que, em outros aspectos, a mudança foi para melhor. “Com a tecnologia que temos hoje, não tem como sentir falta daquelas máquinas enormes”, confessa. Atualmente o ator está gravando a segunda temporada de “Força-tarefa”, seriado policial da Globo, onde vive o honesto Coronel Caetano. Mesmo colecionando tantos personagens na carreira, Milton ainda consegue ver um diferencial em cada papel. “No caso do Caetano, ele é popular. Tem apelo. Quantos policias como ele não existem nas ruas? É fundamental para mim fazer um personagem possível”, opina. E, apesar dos 45 anos de carreira e 76 de idade, Milton não pensa em parar e nem diminuir o ritmo. “Estou indo gravar cenas de troca de tiros agora. Ainda consigo fazer quase tudo. O dia que estiver limitado eu paro”, garante.