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Fé satânica Fé satânica 6 MAR 2010 • POR • 03h48

A população do Distrito Federal protagonizou mais um ato de renúncia. Desta feita, foi o deputado distrital Junior Brunelli, aquele mesmo filmado rezando após se encontrar com um dos operadores do mensalão do DEM, em Brasília, embolsando, ao depois, de uma forma vergonhosa e condenável o fruto do seu despreparo. O seu andar errante no campo político não lhe ofereceu mais as forças e os propósitos julgados necessários para sustentar o mandato conquistado nas urnas. Enveredou-se pelo caminho largo que anima os covardes. Triste fim para quem resultou surpreendido pela sua própria esperteza. Ao conspirar em desfavor dos seus eleitores, traindo os princípios da confiança que lhe foi depositada e no ato triste de rir da democracia, mostrou com a sua conduta, temor nenhum da Justiça. O deputado renunciante desnudou em um único ato a fragilidade do nosso ordenamento jurídico, na área eleitoral. Ela é tão gritante que pode nos reservar um pouco mais à frente surpresas desagradáveis. É que as avenidas amplas e bem arborizadas que embelezam esse ramo do Direito, são as mesmas que acolhem e tornam bem-sucedidos os que são contumazes nessas práticas condenáveis. A população, sem entender o alcance do cometimento, resultará atônita, quando esse mesmo cidadão, com a cara deslavada, desprovido de qualquer sentimento de culpa, voltar ao cenário político oferecendo o seu nome, o seu propósito, a sua luta, pelo progresso e o bem-estar dos brasilienses. Ele pedirá o voto novamente para chegar ao poder. Algo incrível. Infelizmente, com a deficiência da nossa legislação eleitoral, temos que conviver com tamanho atrevimento. Mas a ação nefasta a que estamos referindo atingiu outros valores inerentes a nossa população. A festa dos 50 anos da nossa capital, por exemplo, não poderia ter um desfecho triste, melancólico, amargo, desalentador. O mundo inteiro já tem ciência do mar de lama que abunda o berço do nosso poder político. Ele que teria que ser a sentinela mais avançada a defender intransigentemente os nossos interesses políticos e sociais e econômicos, fraquejou ante à covardia de uns poucos. Esses atos de absoluta insanidade política; de ultraje aos princípios partidários; de vilipêndio à conduta ética; desnudaram para a nação o despreparo de alguns políticos para o exercício precioso do seu – múnus. O episódio em que se envolveu o deputado renunciante foi estarrecedor. Sua ação foi mórbida. Brasília não merecia esse destino. O ato praticado pelo deputado resultou ainda mais amargo quando colocou em seus lábios a palavra sacrossanta do – Onipotente – como forma escusa de agradecer o dinheiro embolsado. Nunca vi tamanha ousadia. Mas a tresloucada ação não parou por aí, ultrapassou as raias do racional. Filiado ao PSC – Partido Social Cristão, de grande relevância e significado para a democracia brasileira, pelos seus princípios, pelas suas metas, pelos seus propósitos, nada disso serviu para conter a sua conduta insana. Não deu nenhuma importância para esses valores. Ignorou o valor e a importância dos seus dirigentes partidários a nível nacional. Não respeitou as cores, a bandeira, a tradição da sua agremiação partidária, nem mesmo o seu símbolo maior o – peixe – alimento santo, que resultou multiplicado pela ação divina para saciar a fome de milhares de pessoas. Aqui reside o seu grande pecado. Não soube avaliar a gravidade do crime que cometeu. Perversidade grande, safadeza das maiores, o que podemos falar ainda de alguém que se atreveu a tamanhas e horrendas brutalidades. Mas a sua ação de agradecimento a Deus escandalizou ainda todas as pessoas que possuem decência, dignidade e honradez. Pessoas que sendo tementes a Deus precisam receber o nosso respeito e a nossa consideração. É o mínimo que a sensatez pode oferecer. Não se tratou de nenhuma ação solitária. Talvez pelo seu preparo no campo espiritual foi encontrar no texto sagrado o embrião de tão grande maldição – o dinheiro, a raiz de todos os males. É esse dinheiro, sobretudo de origem suja, nojenta, que, nas mãos de pessoas insensatas, despreparadas, desqualificadas para o exercício da atividade política e do bom convívio social, transforma a fé em algo satânico. Nas mãos dessas pessoas, o dinheiro é uma arma de ação destruidora. Destrói os ideais, dilacera os sentimentos, machuca pessoas queridas, tornam-se impiedosas para os estranhos. Mas o seu raio de ação não se cinge apenas a esses espetáculos horrendos. Desperta o ódio, a inveja, o ciúme. A toda evidência, é a pedra angular de todos os crimes, cujos malefícios são tão amplos e amargos para o conjunto da sociedade, que nenhum sentimento de culpa o desequilibra. E a razão é simples de entender: é que o dinheiro sujo torna ásperas as relações sociais e de amizade, e está presente em todos os lugares ditando soberanamente os rumos e as consequências das ações condenáveis. Enfim, nas relações que estão a tratar de atos de absoluta e incontestável ilicitude, é ele a carta maior do baralho. Não existe nada de mais sórdido e perverso do que se utilizar dele para humilhar, constranger o ser humano, exigindo dele o que não pode oferecer. Essa lição extraí do jornalista Antonio João Hugo Rodrigues, quando esteve na fronteira, cumprindo o seu mandato como suplente de senador. Sua fala ocorreu no saguão do edifício-sede da nossa alcadaria, e teve por protagonistas vários populares, inclusive o nosso prefeito, Flávio Kayatt. A lista infindável de trabalhos que o deputado mostrou na carta, por ocasião em que formalizou a sua renúncia, perdeu o seu valor. Persistirá sempre a dúvida no seio da população quanto à real grandeza do seu propósito. Não pode existir nada mais amargo. Naqueles atos e ações, seguramente estão enrustidos os interesses menores, os mais mesquinhos que podemos imaginar. E os que receberam os seus favores tornaram-se escravos de inescrupulosos, que se agigantam na medida exata da fraqueza da sua vítima e do grau de participação na empreitada criminosa. A política é a arte mágica de realizar o bem, arrostar os perigos, incentivar o cidadão a buscar o seu destino de grandeza e de prosperidade. Em todas as nossas ações ela se apresenta sempre altiva e soberana. As nossas colocações, os fatos que alinhamos para sustentar um ponto de vista, indicar uma direção, mostrar a evidência lógica do raciocínio, são suas características inigualáveis, e por isso mesmo, imprescindíveis para o seu correto entendimento. O diálogo é o seu maior instrumento para se buscar o entendimento quando ele resulta ofuscado por qualquer que seja a circunstância. Essa é a política que todos desejamos, torcemos, aplaudimos. Política que nos leva ao caminho da concórdia, do respeito, das relações sociais saudáveis, independentemente das circunstâncias e dos desdobramentos que tiverem os desfechos das nossas ideias e dos nossos propósitos. Fora desse parâmetro, ela resulta condenável, algo maligno, que causa náusea e mal-estar, máxime quando a sua luta vem respingada com coisas ilícitas. O mundo dos sensatos recomenda que para termos uma vida cheia de encantos e de prazeres, identificada mais fortemente com o que quer e deseja o nosso Criador, não poderemos nunca avançar em nossa peregrinação terrena pelos caminhos sombrios da ganância, da loucura extremada, do desamor sem limite. Esse é o ensinamento divino. Ele precisa ser respeitado.