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Negociatas normais Negociatas normais 11 MAR 2010 • POR • 08h00

Sob risco de ser preso por atrapalhar as investigações decorrentes da Operação Owari, o prefeito de Dourados, Ari Artuzi, vem alegando que não participou de nenhuma licitação fraudulenta e que eventuais irregularidades em sua administração são consequência da gestão anterior. Porém, a denúncia do Ministério Público revela em detalhes as negociações que o prefeito e sua turma mantinham com a família Uemura e outros grupos para terceirizar os serviços de água e a rodoviária. No caso da “privatização” da distribuição de água e coleta de esgoto chegou a ser aprovada até mesmo uma lei na Câmara dos Vereadores permitindo a terceirização. Porém, o vencedor da futura licitação já estava escolhido havia tempos, conforme demonstrou a Polícia Federal. No caso da rodoviária, a empresa que venceria a licitação estava igualmente escolhida, embora nem mesmo houvesse tratativas oficiais para terceirizar o serviço. Estas negociações, ao que tudo indica, eram feitas à luz do dia, sem que os envolvidos fizessem muita questão de esconder algo, pois a Polícia Federal garante ter verdadeiro álbum de fotografias comprovando as reuniões, algumas até mesmo no gabinete do prefeito. Quer dizer, as licitações seriam meras formalidades legais para encerrar um jogo de cartas marcadas e, provavelmente, com jogador único. "É natural que as coisas funcionem assim", deviam estar imaginando os administradores públicos. Porém, provavelmente não imaginavam que estivessem sob a mira da Polícia Federal, que em meio a estas negociações descobriu distribuição de dinheiro em espécie, cheques e até carros de luxo para o prefeito e assessores. Esta distribuição, por sua vez, evidencia que estavam participando deste jogo de olho nas vantagens próprias que poderiam obter. Dourados está longe de ser a única prefeitura que terceirizou ou tentou entregar à iniciativa privada determinados serviços públicos. No País inteiro esta passou a ser fórmula garantida para administradores públicos atender determinados grupos econômicos e com isso irrigar os próprios bolsos. Em Campo Grande, por exemplo, quase um ano antes de a empresa assumir os terminais de transbordo, já era oficialmente apontada, em reuniões públicas, como a futura administradora dos locais. Edital da licitação nem mesmo estava sendo elaborado e a vitória já estava líquida e certa. Quando saiu o resultado da concorrência, a empresa, a mesma que negociava com Ari Artuzi, venceu a disputa e está recebendo mais de R$ 320 mil mensais por um serviço que até agora não disse para que veio. Se a Polícia Federal tem algo em mãos sobre esta e outras terceirizações, só ela pode responder. Porém, diante da revelação daquilo que ocorreu em Dourados, certamente é grande o número de homens públicos que deve estar tremendo nas bases pelo fato de ter feito negociações idênticas às detonadas pela raiz no sul do Estado. Os encontros fotografados em Dourados ocorriam na mesma época em que eram fechados acordos em Campo Grande. Então, se a PF investigou lá, pela lógica, fez, ou poderia ter feito, o mesmo na Capital. A não ser, é claro, que fosse alguma investigação específica somente para implodir determinado político que se atreveu a desafiar certas lógicas daqueles que dominam o cenário estadual. Isto, porém, não inocentaria o prefeito de Dourados, vereadores e secretários. Mostraria, somente, que o jogo é bem mais pesado e sujo do que normalmente os “comuns mortais” podem imaginar.