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ARTIGO Paulo Cabral: "A questão juvenil" Sociólogo e professor 13 JAN 2015 • POR • 00h00

O potencial da juventude é uma riqueza inestimável que as sociedades podem explorar, estimulando a revelação de talentos, apoiando projetos de desenvolvimento, investindo na felicidade humana. Mas, se nada é feito, minguam-se as possibilidades; contingentes imensos tornam-se uma massa adulta medíocre, quando não perdida nas sendas da criminalidade.

Quase sempre, jovens envolvidos com a gravidez na adolescência ou em práticas delitivas, que estejam na escola, apresentam rendimento insatisfatório, defasagem idade/série, revelando um percurso escolar difícil, indicativo de uma situação de possível vulnerabilidade no seu desenvolvimento pessoal. Essas evidências raramente são captadas.

Ao se compulsarem os dados da educação básica brasileira, particularmente o ensino fundamental, do 1º ao 9º ano, constata-se uma massa extraordinária de recursos a ela destinados pelo Fundeb – Fundo Nacional  da Educação Básica, além daqueles provenientes dos tesouros estaduais e municipais, garantindo oferta suficiente em termos quantitativos. Trata-se de um potencial de trabalho fantástico, tendo em vista a capilaridade da rede de educação pública, presente em todos os municípios e distritos brasileiros, além da área rural.

A qualidade da educação, porém, tem estado muito aquém das expectativas mínimas. E aqui, não se trata só do desempenho pífio dos estudantes nas provas de aferição de conhecimento, mas também da postura burocrática da escola. Há as exceções que confirmam a regra, contudo, no geral, assiste-se a um processo de alienação dos que deveriam educar, insensíveis aos  alertas emitidos por jovens desencontrados, clamando por atenção  e, ainda assim, permanecendo invisíveis,como coisas fora do lugar e não como pessoas com dificuldades para situarem seu estar no mundo.

As políticas públicas para a juventude não dão conta de contemplar a multiplicidade de demandas apresentadas. A incapacidade de diálogo das políticas setoriais é um dado estrutural da ineficiência delas, cada qual  em seu nicho (educação, saúde, esportes, cultura, emprego e renda, etc), atuando isoladamente, sem estabelecerem  sinergia entre si, construindo respostas minúsculas diante dos desafios postos.

Considerando a obrigatoriedade da matrícula escolar, uma abordagem possível para lidar com esse  problema, seria estabelecer um programa para monitorar a frequência e o desempenho  dos estudantes, ao menos, a partir do 6º ano, momento coincidente com o início da pré-adolescência e fase crucial do desenvolvimento juvenil. Simultaneamente, monitorar a qualidade do trabalho docente e, de posse dos resultados, estabelecer atividades de apoio à docência e de acompanhamento dos jovens  a caminho de ou em situação de vulnerabilidade, com encaminhamento para os serviços que se fizerem necessários.

Não adianta  lamentar as indecentes taxas de mortalidade juvenil, a crescente propagação do consumo de drogas lícitas e ilícitas, a inércia e indiferença da chamada “geração ni-ni”, em suma, não adianta chorar todas as perdas que oneram a juventude brasileira;  urge prevenir, assegurando  meios capazes de garantir o desenvolvimento e a dignidade dos jovens. 

Ao se iniciar um novo governo, seria auspicioso pautar a Questão  Juvenil, assumir a sua dimensão multifatorial,  reunir criatividade, ousadia e vontade política para revertê-la, propondo um futuro melhor para todos nós.