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A Unimed e o clínico A Unimed e o clínico 19 MAR 2010 • POR LUIZ OVANDO, MÉDICO, CLÍNICO E COOPERADO DA UNIMED. • 05h56

A Unimed foi concebida e fundada há mais de 30 anos. O seu propósito era fortalecer e proteger a atividade médica. Propósito evidente de uma cooperativa visando a subsistência digna de qualquer categoria. Nessas três décadas a Unimed, que era cooperativa, passou a ser também operadora de plano de saúde. Hoje, é inquestionável que a sua opção foi pelo patrimônio em detrimento da defesa do propósito inicial da categoria médica. A atividade fim, que era a defesa do exercício da arte e ciência médica, com benefício direto ao paciente e, da manutenção de espaço adequado para o médico crescer técnica, social e profissionalmente, transformou-se na defesa de interesses patrimonialistas. Diante da essência unimediana, os médicos também metamorfosearam o propósito de sua profissão. Por uma questão de sobrevivência, os mais articulados, organizaram-se em grupos, e sob a argumentação da procura da medicina de excelência, alimentam uma corrente de encaminhamentos e exames que não tem similar na história médica do País. Hoje, a ação médica visa mais o procedimento e quase nada o resultado. Deixamos de lado o ato médico mais importante que é a consulta médica para nos enveredarmos pela via tecnológica onde uma Ressonância custa R$ 1.500. Não há dúvida de que a consulta médica que custa R$ 45 perderá sempre. A consulta requer paciência, tolerância, dedicação, experiência, atualização e sobre tudo determinação diante o desafio que cada paciente significa. É preciso saber ouvir. O médico não tem tempo para ouvir diante de uma remuneração vergonhosa. A tecnologia é encarada como legítimo substituto do tempo e complemento salarial. Os exames sofisticados para nada servem se não forem fundamentados em uma consulta médica bem feita. É dinheiro jogado fora. A Unimed é perdulária e permissiva. Em 2009 o interagis (sistema de informática) registrou 500.000 consultas para uma população de 100.000 usuários. Isso quer dizer que cada segurado consultou cinco vezes no ano. É muito mais do que o SUS, que sinaliza frequência de três consultas por ano. A explicação para esse fato está na corrente de encaminhamentos e no desprezo pelos clínicos. A Unimed/Campo Grande, em 2009, teve uma receita aproximada de 270 milhões de reais. O gasto com assistência aos usuários andou por volta de 250 milhões de reais. A sinistralidade total da cooperativa foi de 90%, sendo o aceitável de no máximo 75%. A produção dos cooperados (honorários) foi de mais ou menos 95 milhões de reais no ano e desse total só 13% estavam comprometidos com a consulta médica. Isso dá uma média de R$ 1.030 por cooperado/mês. São mais ou menos 1.100 cooperados credenciados e ativos. Quem poderá subsistir com esse salário? O restante dos 83 milhões foi distribuído para os médicos operadores de máquinas, que é um número infinitamente menor. Ambulatórios, consultórios, enfermarias, centro cirúrgicos, telefonemas fora de hora, reuniões com famílias, explicações infindas aos parentes e familiares constituem a rotina do clínico e cirurgião-geral. São verdadeiros operários da medicina. A esses a Unimed reserva a humilhante e constrangedora remuneração de R$ 45 com direito a vários retornos em 15 dias. O corpo Unimed, pelo tipo de medicina que se pratica hoje, está ameaçado. Há anos venho alertando sobre o desprezo aos clínicos. Esta é a 6ª. campanha à presidência da Unimed que sistematicamente falo com os candidatos solicitando seja colocado em assembleia uma proposta consistente de melhor remuneração do clínico. Todos prometeram, inclusive os atuais candidatos, mas nenhum deles ao tomar posse fez algo concreto nessa direção. O gasto assistencial da Unimed tem aumentado. Em 2009, foi 14,7% a mais em relação a 2008. A tendência é continuar crescendo se continuarmos encolhendo o valor da consulta. Os mais idosos são os que mais precisam de atenção. A carteira de usuários acima de 60 anos equivale a 17% do total com sinistralidade de 97,7%. Esses usuários pela sua condição etária contribuem com valor até 5 vezes maior do que faixa etária mais jovem, e determinam um gasto equivalente a 41% do total. É justo que pelo tempo gasto e, pela experiência colocada à disposição do paciente, o clínico possa ser remunerado de forma mais justa. Essa decisão política fará toda a diferença para o futuro da cooperativa. Os detalhes operacionais devem ser estudados com diligência e vagar. Estamos novamente num processo eleitoral para sucessão na Unimed. As duas chapas, a 1 encabeçada pelo dr. Paulo de Tarso e a 2 pelo dr. Cláudio Saab são o mais do mesmo. Será uma eleição sem oposição. Ambos são oriundos da administração atual e não representam qualquer perspectiva de mudança. Politicamente é uma via só. A segunda via foi inviabilizada pela estratégia estatutária que exige cursos e qualificações administrativas dos componentes da chapa. É a profissionalização perniciosa e tendenciosa da política. Há candidatos a diretorias que se eleitos estarão pela 4ª.vez em funções burocráticas. Isso torna a política de classe atrelada a influência dos tentáculos legislativos e executivos do poder municipal. Por isso tudo torna-se iminente o risco de continuar priorizando o patrimônio e desprezando o fundamento da cooperativa. O cooperado tem que ficar atento diante do discurso dos candidatos. É preciso retornar aos trilhos da defesa da prática médica digna. A Unimed é o grande instrumento para a execução dessa tarefa. A cooperativa tem no momento todas as condições de voltar ao seu propósito inicial de valorização do médico e principalmente do clínico que resolve. É uma decisão política e de coragem sob risco de falência da instituição se continuar valorizando os exames, as máquinas e o encaminhamento. Cooperado, fique atento e vote com convicção.