Rodrigo Alvarez ouviu falar pela primeira vez do padre Fábio de Melo em um momento inusitado, em 2013. Ele era correspondente da Globo em Jerusalém e estava fazendo no local uma reportagem sobre a escolha do papa Francisco. Entre uma entrevista e outra, uma peregrina brasileira que acompanhava Fábio de Melo no Oriente Médio o parou na rua e "mandou" que ele fosse entrevistar o religioso.
"Disse a ela que o propósito da matéria era outro e que me perdoasse, mas não conhecia o padre de quem ela falava. Estou fora do Brasil desde 2006, com uma passagem rápida por São Paulo e, de fato, estava mal informado sobre os padres que estavam mudando os rumos da religião no Brasil. A peregrina ficou indignada e foi contar a história ao padre Fábio", relembra Alvarez, achando graça, em entrevista ao EGO.
Mal sabia a peregrina - que, por ironia do destino, se chamava Fábia - que aquela "ordem" daria frutos: uma amizade entre o padre e o repórter, e uma biografia que Alvarez está escrevendo atualmente sobre o sacerdote e será lançada no fim deste ano pela editora Globo Livros.
Intrigado com o episódio inusitado, o jornalista foi procurar saber quem era o tal religioso e descobriu que ele era querido não só entre católcos, mas também entre evangélicos e ateus. Tempos depois, Alvarez finalmente o conheceu pessoalmente no hotel mantido pelo Vaticano em frente aos muros da Cidade Velha de Jerusalém.
"Era pra ser uma conversa rápida, pois faríamos em seguida uma matéria para o ‘Jornal Nacional’ sobre a procissão que centenas de católicos brasileiros faziam naquela noite de Pentecostes. Mas nossa conversa durou vinte minutos. Eu estava terminando de escrever o livro 'Maria' (Globo Livros, 2015) e os assuntos religiosos dominaram nossa conversa. Fiquei encantado com as posturas do padre Fábio sobre questões complexas religiosas e humanas. Acho que ele também gostou de ver meus pontos de vista, e ficamos amigos", conta ele, que acaba de ser transferido para Berlim, capital da Alemanha, no posto de correspondente da Globo.
Mais de 100 horas de entrevistas
Para Alvarez, não foi ele quem escolheu escrever a biografia do padre Fábio de Melo e, sim, a vida. "Nosso encontro mostrou que havia uma afinidade muito grande entre nós dois, mesmo ele sendo padre e eu um escritor e jornalista. Poucos dias depois do nosso encontro, mesmo sem saber quase nada da história de vida dele, senti que queria contar aquela biografia", diz.
"Numa conversa pelo WhatsApp, fiz a proposta - de impulso, confesso - e ele aceitou na hora, dizendo que já havia recusado outras propostas, mas que naquele momento estava seguro para aceitar o desafio. E haja desafio! Em alguns momentos foi difícil para ele reviver um passado que nem sempre foi cheio de músicas e alegrias, começando pela vida difícil da família Silva em Formiga, Minas Gerais", entrega.
Segundo Alvarez, a biografia tem como base mais de um ano de conversas com o padre, em mais de 100 horas gravadas. "Algumas vezes dentro de aviões, pois era o que a vida agitada nos permitia, outras numa procissão em Belém, outras num bairro de judeus ultraortodoxos em Jerusalém, outras por Skype ou WhatsApp. E dessas conversas, além das lembranças de tudo o que o padre viveu antes de ser o Fábio de Melo que nós conhecemos, surgiram grandes discussões filosóficas sobre questões humanas e divinas, que vão ser uma parte importante do livro", adianta.'Simpatia e uma força impressionante'
O livro sobre a trajetória de Fábio de Melo merece ser feito, segundo Alvarez, pelo fato do padre ser complexo em sua religiosidade e humanidade. "Querer simplificá-lo, como alguns que o chamam de padre-cantor ou padre-celebridade, é mera ignorância. Para mim o maior mérito de Fábio de Melo é mostrar que é possível ser católico e moderno, sem precisar fechar os olhos ao mundo em que vivemos, sem precisar seguir regras sem sentido", avalia.
"O padre que me fez querer escrever minha primeira biografia tem conteúdo de sobra, honestidade, simpatia e uma força impressionante que vem mudando a vida de pessoas dentro e fora do Brasil. O livro vai mostrar isso com muita clareza", aposta o autor dos best-sellers "Aparecida" (2014) e "Maria" (2015).
A preferência de Alvarez por temas religiosos na hora de escrever livros veio de casa. "Nasci em uma família católica, estudei no Colégio Santo Agostinho e na Pontifícia Universidade Católica. Sou culturalmente 100% católico, ainda que não seja uma pessoa religiosa. No período em que estive em São Paulo, fiquei impressionado com a devoção do brasileiro a Nossa Senhora Aparecida, quis saber a história da imagem e senti falta de um livro completo. Como não havia, resolvi escrever", relembra.
Quando havia terminado a pesquisa e começado a escrever o livro, a Globo o transferiu para Jerusalém. "Na Terra Santa, vivendo a 1,5 km do Santo Sepulcro, o lugar onde a tradição diz que Maria ficou de joelhos aos pés da cruz de seu filho Jesus; a 2 km do túmulo onde dizem que Maria foi sepultada; a 5 km de Belém e assim por diante, essa história passou a fazer parte da minha vida. Descobri que ainda vivemos hoje a continuação da história que Jesus viveu. Os lugares são os mesmos. Muitas questões são as mesmas. Descobri que havia uma conexão profunda entre o passado e o presente, mesmo para aqueles que não fossem religiosos, e tentei traduzir isso em palavras. Esses foram os livros ‘Maria’ e ‘Aparecida’", conta.
"Depois disso, me sentindo mais católico do que nunca, ainda que sempre ache importante dizer que sou um católico mais cultural do que religioso, foi natural para mim continuar no tema e escrever a história de um dos padre mais importantes do Brasil. Espero que, ao chegar às mãos dos leitores no fim deste ano, a biografia do padre Fábio de Melo seja tão reveladora quanto tem sido essa experiência incrível que venho tendo o privilégio de ter, ao lado dessa pessoa sem igual que é o padre Fábio", elogia.