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ARTIGO Ângela Maria Costa: "Qual a medida da liberdade?" Professora e doutora em Educação 26 JUN 2017 • POR • 02h00

Crianças gritando com os pais...correndo em volta das mesas dos restaurantes, incomodando todos... fazendo birra... chutando e mordendo professores. Por que as crianças de hoje têm mais liberdade? Por que os adultos responsáveis estão cedendo mais? Será por sentimento de culpa por não estarem presentes na vida dos filhos ou por acharem que deveriam dar mais amor? Estão devendo! Dão liberdades, e não liberdade, enchendo as crianças de presentes como reparação desse sentimento de culpa. Quantos não se endividam para comprar aquele celular top de linha, caríssimo, quando na verdade o que seus filhos precisavam era tão somente de um sorriso, um abraço, um olhar, um beijo, um aconchego. Alguns estudiosos os chamam de “pais demagogos” (não existem só políticos demagogos), porque usam a liberdade como demagogia, satisfazem pequenos prazeres (mais cômodo), e não as necessidades emocionais e afetivas da criança. Entregam à sociedade um ser infeliz, exigente, insatisfeito e egocêntrico.

Segundo Erich Fromm, “a existência humana e a liberdade são desde o início inseparáveis”. A existência humana começa com a individualidade no momento em que é cortado o cordão umbilical. A partir daí, estamos livres, desatados, mas não preparados para viver essa individualidade. Isto porque o ser humano é o único animal que nasce prematuro, precisando, no mínimo, de 8 anos, para sobreviver. Depende das orientações e limites bem estabelecidos pelos adultos, muitas vezes resumidos em proibições: “Cuidado! Não ponha o dedo na tomada...”; “Não corra no chão molhado”. E é nesse segundo nascimento que absorvemos regras, normas, mitos e crenças que formarão nosso caráter e personalidade para o resto da vida. Isto é, no núcleo familiar. Saímos da infância, mas a infância não sai da gente!

A questão é: em que medida podemos ser livres? A liberdade ideal e absoluta é difícil de ser atingida, a não ser que nos isolemos em uma ilha, porque até em uma tribo é preciso seguir normas e regulamentos estabelecidos. Segundo dicionários filosóficos, psicológicos e linguísticos, liberdade é a faculdade de se autodeterminar – poder decidir por si mesmo, fazer ou não algo naquele momento. Por exemplo: “Posso comer com as mãos?”; “Posso sair sem roupa na rua?”; “Posso andar na contramão?”. Lógico que pode, mas sofrerá as consequências. Então, a liberdade tem limite! Por meio dessa liberdade, alcançamos a autonomia. Essa autonomia depende da capacidade de organização e fixação das normas e limitações dentro de um círculo (família, escola, igreja.), pré-traçados pela autoridade. Em síntese, podemos dizer que liberdade é fazer aquilo que se gosta, desde que não interfira na liberdade dos outros, porque os “outros” também têm a sua liberdade, a qual precisa ser respeitada.

Atualmente, um dos maiores desafios da educação é saber qual a medida da liberdade (soltar as rédeas). Usar ou não de autoridade? Corrigir ou não a criança? Necessário ampliar esse debate sem demagogia. Que tal a família (1ª instância de educação) começar a participar da educação do filho, entregando à escola, pelo menos, um aluno com capacidade de agir, de ter iniciativas suficientes e responsabilidades satisfatórias, que já faça uso das palavrinhas mágicas: “obrigado”, “por favor”, “com licença” e “desculpa”. Um aluno que respeita seu ambiente escolar, as pessoas e os seus colegas. Educação compartilhada – família e escola. 

“Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo” (Paulo Freire).