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CORREIO DO ESTADO Confira o editorial deste sábado/domingo: "Contradições intermináveis" Confira o editorial deste sábado/domingo: "Contradições intermináveis" 12 AGO 2017 • POR • 03h00

Estranha-se que menos de quatro meses depois de financiar R$ 100 milhões, o hospital esteja enfrentando novo colapso financeiro.

Os recursos milionários para custear as despesas da Santa Casa de Campo Grande suscitam várias incógnitas.  Nos últimos dias, a população tem acompanhado, aflita, enxurrada de cobranças, justificativas e contestações sobre valores envolvendo a Associação Beneficente, mantenedora do hospital, a Prefeitura de Campo Grande e o governo do Estado. A falta de consenso em torno do dinheiro atrapalha algo essencial: que os sul-mato-grossenses possam contar com atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no maior hospital do Estado, referência em casos de trauma. Por enquanto, o impasse foi apenas amenizado com o pagamento de R$ 13 milhões, mas não há garantia alguma que os mesmos obstáculos não se repitam no próximo mês, seguindo a sequência de problemas que se arrastam há meses.

De um lado, o presidente da Associação Beneficente, Esacheu Nascimento, cobra da prefeitura valores atrasados e que os repasses passassem a ser feitos até o dia 5 de cada mês, conciliando com a data para depositar os salários de funcionários. Ainda nesta semana, mais uma vez, enfermeiros e técnicos de enfermagem paralisaram os trabalhos temporariamente para reivindicar pagamento. De outro, o prefeito da Capital, Marcos Trad, alegava que todo dinheiro acordado estava em dia e que não teria como antecipar o montante porque o Ministério da Saúde deposita apenas entre os dias 12 e 15 de cada mês. Culpou os problemas administrativos na unidade e chegou a cogitar intervenção. O governo do Estado, no sufoco, pagou parte da dívida que mantém com o município e justifica que já tem gastos consideráveis para manter sozinho o Hospital Regional.  

Em momentos de crise, verdades e mentiras tendem a aparecer. Pelo que tudo indica, havia uma pendência financeira que foi paga no sufoco, com a pressão do fechamento do pronto-socorro e suspensão do agendamento de cirurgias. Porém, a prefeitura já justificou que não tem como arcar com os pagamentos antes de receber os repasses do Ministério da Saúde, algo que desfalcaria ainda mais os cofres públicos. Então, os problemas voltarão a acontecer. É impreterível a participação efetiva de órgãos fiscalizadores para sanar essas dificuldades e troca de acusações. A auditoria completa e constante não pode mais ser protelada. 

Em abril deste ano, a Santa Casa reestruturou sua dívida com a Caixa Econômica Federal e obteve empréstimo de R$ 100,3 milhões. Reformas das alas particulares, quitação de dívidas e garantia de fluxo de caixa estariam nas metas e utilização desse dinheiro. Estranha-se, porém, que menos de quatro meses depois, o hospital esteja enfrentando novo colapso financeiro. É preciso detalhar onde esse recurso foi aplicado, considerando que as parcelas também estariam sendo pagas com ajuda do poder público. 

O Ministério Público de Contas anunciou varredura, mas não pode se limitar aos dispositivos do contrato com o município. É preciso contrapor dados, apurar os altos salários de dirigentes, a receita com os contratos terceirizados e atendimentos particulares, além de verificar a ocupação dos leitos. Ministério Público Estadual também precisa fazer sua parte e ir além das reuniões formais que não chegam a resultados. A crise continuará eterna se não houver controle rigoroso dos recursos.