Logo Correio do Estado

ARTIGO Antônio Carlos Siufi Hindo: "O Estado papal e a Amazônia" Promotor de Justiça aposentado 13 SET 2019 • POR • 02h00

O Tratado de Latrão, assinado entre o governo da Itália e a Igreja Católica em 1929, colocou fim à “questão romana” e ensejou a criação do Estado do Vaticano, também conhecido como Estado papal. O Pontífice da Igreja Católica passou a ser oficialmente considerado chefe de Estado com todas as prerrogativas dos seus iguais. Mas sempre no curso da história o seu peso político foi surpreendente. 

Na esteira desse raciocínio, precisamos entender a sua importância. Especialmente quando discute, propõe e ainda recomenda aos chefes de estado as políticas públicas para questões inquietantes. A Amazônia é o tema atual. Os números dos principais institutos técnicos na área ambiental apontam para essa preocupação. Esses números não podem ser desprezados. Trata-se de uma questão de bom senso. A batalha intensa que os ambientalistas sérios procuram travar será sempre pela preservação da vida e do meio ambiente. Esse tema estará no centro das discussões do sínodo dos bispos a ser presidido pelo papa Francisco. As conclusões desse colóquio serão sempre bem-vindas e se constituirão em novos rumos para o enfrentamento do tema. 

Incorrem em ledo engano os que pensam que o colóquio está minado de interesse político. Nada disso. Serão decisões de caráter colaborativo. O próprio papa Francisco descartou a ingerência política. Assiste razão ao pontífice. O clero brasileiro não precisa desse tipo de opinião para exarar seus juízos técnicos. Sua formação sacerdotal é completa. Não se circunscreve apenas à Filosofia e à Teologia. Alcançam todas as áreas do conhecimento humano. Os cardeais e os bispos são os ministros de Estado do papa. Seus pareceres estão estribados em conhecimentos técnicos. Por isso precisam ser recebidas com o especial interesse pelos governantes lúcidos. Vencer os desafios precisa ser o norte de qualquer chefe de governo desejoso de estabelecer com o seu governado um relacionamento respeitoso.

No mundo inteiro não existe mandatário incauto. Essa assertiva resulta incontroversa. Todos saberão avaliar, no momento oportuno e de forma adequada, as recomendações plantadas no colóquio. O interesse sagrado da pátria estará sempre em primeiro lugar. A sua soberania não pode ser desrespeitada. O papa Francisco sabe muito bem interpretar esse assunto. Sabe ainda avaliar onde as suas decisões, as suas opiniões e as suas recomendações podem alcançar sem ferir as boas e sadias relações diplomáticas. Não existe outra forma de interpretar as suas recomendações. 

Do sínodo, em especial. Os governantes no mundo inteiro precisam fixar o entendimento de que os conselhos do pontífice estarão sempre ancorados em alicerces sólidos. O bom senso, o equilíbrio e as ações comedidas são suas vertentes preciosas. A marcha de qualquer governante na direção oposta a esse entendimento evidenciará a soberba, motivará o orgulho e desencadeará a insensatez. Esses temas não se coadunam com a grandeza da mais alta magistratura da nação. Mas não se trata apenas desses indicativos. A Santa Sé exporta para o mundo inteiro todos os dias a esperança, o congraçamento dos povos, a fé, o amor e o perdão. Os ensinamentos sagrados do Cristo. 

O papa, como qualquer outro ser humano, é passível de erros. Trata-se de um simples mortal. Com os seus pecados e suas virtudes. Em razão dessas circunstâncias, cresce a importância das áreas técnicas do governo de avaliarem tecnicamente as conclusões do sínodo. Se não forem convincentes, não haverá necessidade de respostas ásperas, provocativas ou desrespeitosas. As ações dos governos precisam ser sempre elegantes; despertam na população um sentimento nobre de grandeza, de propósito, e instrumentalizam uma ação eficaz para o governado entender melhor a decisão governamental. Mas não é só. 

O Estado brasileiro não está obrigado a cumprir a decisão do papa oriunda do sínodo ou qualquer outra decisão plantada fora dos nossos limites territoriais. Essas decisões não trazem no seu bojo a sua força cogente, ou seja, uma obrigação legal. Essa regra não existe no Direito Internacional Público. A soberania do Estado está bem à frente dessa proposta. As decisões do sínodo serão apenas indicativos, recomendações. Nada mais.