Direito no exterior, licença menstrual é implementada em empresa de Mato Grosso do Sul
Ainda sem legislação específica no Brasil, medida é direito legal de mulheres em países da Ásia e na Espanha
5 MAR 2023 • POR Bárbara Cavalcanti • 17h29Em poucos lugares do mundo, mulheres que sofrem com fortes dores e desconfortos durante a menstruação têm a opção de uma licença menstrual, que garante licença médica remunerada durante o período.
No Brasil tramita um projeto de lei semelhante na Câmara dos Deputados, porém, enquanto não são definidas leis específicas, uma empresa de Mato Grosso do Sul resolveu testar a ideia na prática.
A empresa sul-mato-grossense Digix anunciou a decisão de adotar a medida de conceder às funcionárias um período de licença menstrual.
Conforme a instituição, funcionárias terão a permissão de dias de folga remunerada, em casos de dores excessivas e outras complicações durante o ciclo menstrual, sem necessidade de atestados para comprovação dessas ausências.
A iniciativa veio da CEO, Suely Almoas. Ela relata ter tido a ideia após ler o livro “A tenda vermelha”, de Anita Diamant.
O enredo do romance conta a história de mulheres que eram levadas para uma tenda vermelha e cuidadas por outras mulheres em seu período menstrual.
“Após ler o livro, pensei que poderia cuidar das nossas mulheres de uma forma moderna, através deste benefício”, expressou.
No mundoA garantia ao direito de uma licença menstrual foi aprovada na Espanha no mês passado.
O direito a uma licença menstrual é garantido por lei em países como Japão, Taiwan, Indonésia, Coreia do Sul e Zâmbia. A Espanha se tornou o primeiro país europeu a adotar a medida.
A ideia causa polêmica em todo o mundo. Conforme reportagem da BBC News, os defensores da medida colocam a licença menstrual como tão importante para as mulheres quanto a licença maternidade, sendo um reconhecimento de um processo biológico básico.
Enquanto isso, críticos afirmam que o projeto reforça estereótipos negativos, o que pode gerar ainda mais desigualdade de gênero no mercado de trabalho.
A BBC ouviu mulheres em diversos países onde a licença é garantida, e as experiências relatam resultados positivos, como a simplicidade em todo processo e até apoio de colegas de trabalho.
Mas algumas mulheres também relataram empecilhos colocados da parte dos empregadores para a obtenção da licença ou o aumento na competitividade e a expectativa social de suportar a dor dentro do ambiente de trabalho.
O argumento principal em torno do assunto é que desconfortos menstruais crônicos impactam diretamente a produtividade das trabalhadoras e, por isso, devem ser tratados como outras questões de saúde que já contam com autorização para licenças médicas.
O jornal Le Monde explicou como a lei espanhola funcionará na prática: trabalhadoras que sofrem com fortes sintomas durante o período menstrual poderão pedir licença pelo tempo que acharem necessário por meio de atestado médico.
A licença vai atestar “incapacidade médica temporária”. A lei também garante que a conta sairá do bolso do governo espanhol e não dos empregadores.
No Twitter, a ministra da Igualdade da Espanha, Irene Montero, comemorou a conquista da lei aprovada em fevereiro. “É um da histórico para o avanço feminista”, publicou em uma de suas redes sociais.
No Brasil
O Projeto de Lei 1249/22, assinado pela deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), vai na mesma linha, e pede para que o direito à licença menstrual seja incluído na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
O texto sugere licença médica de três dias consecutivos, a cada mês, às mulheres que comprovem sintomas graves associados ao fluxo menstrual, sem prejuízo do salário.
O projeto chegou a ser arquivado no ano passado, mas a deputada solicitou o desarquivamento e nova análise no mês passado.
Por enquanto, trabalhadoras brasileiras não contam com um amparo legal para uma licença específica relacionada ao desconforto durante o período menstrual.
Porém, é realidade que a maioria sofre com o período menstrual, além de conviverem com doenças como Endometriose ou Síndrome do Ovário Policístico.
Conforme a ginecologista e obstetra Rúbia Borges, a maioria esmagadora de suas pacientes relatam desconfortos durante a menstruação, desde a labilidade emocional, à desconfortos físicos mais intensos, como a cólica menstrual, que é o sintoma mais comum.
Assim, para a médica, um dos fatores importantes é que existam conversas sobre o assunto, com o objetivo de se respeitar as diferenças e disseminar o entendimento de que esse período é sofrido para muitas mulheres.
“A gente entende tudo como normal, mas não é. Vou te falar da minha própria experiência: admiro muito e honro essas mulheres [que não sentem dores], mas o primeiro dia do meu ciclo eu sinto muita dor, no campo físico. O meu primeiro dia é zero produtividade, porque eu sinto muita dor no corpo. Então é muito importante conversar, acima de tudo, viva às diferenças e o respeito”, declara.