Em poucos lugares do mundo, mulheres que sofrem com fortes dores e desconfortos durante a menstruação têm a opção de uma licença menstrual, que garante licença médica remunerada durante o período.
No Brasil tramita um projeto de lei semelhante na Câmara dos Deputados, porém, enquanto não são definidas leis específicas, uma empresa de Mato Grosso do Sul resolveu testar a ideia na prática.
A empresa sul-mato-grossense Digix anunciou a decisão de adotar a medida de conceder às funcionárias um período de licença menstrual.
Conforme a instituição, funcionárias terão a permissão de dias de folga remunerada, em casos de dores excessivas e outras complicações durante o ciclo menstrual, sem necessidade de atestados para comprovação dessas ausências.
A iniciativa veio da CEO, Suely Almoas. Ela relata ter tido a ideia após ler o livro “A tenda vermelha”, de Anita Diamant.
O enredo do romance conta a história de mulheres que eram levadas para uma tenda vermelha e cuidadas por outras mulheres em seu período menstrual.
“Após ler o livro, pensei que poderia cuidar das nossas mulheres de uma forma moderna, através deste benefício”, expressou.
No mundo
A garantia ao direito de uma licença menstrual foi aprovada na Espanha no mês passado.
O direito a uma licença menstrual é garantido por lei em países como Japão, Taiwan, Indonésia, Coreia do Sul e Zâmbia. A Espanha se tornou o primeiro país europeu a adotar a medida.
A ideia causa polêmica em todo o mundo. Conforme reportagem da BBC News, os defensores da medida colocam a licença menstrual como tão importante para as mulheres quanto a licença maternidade, sendo um reconhecimento de um processo biológico básico.
Enquanto isso, críticos afirmam que o projeto reforça estereótipos negativos, o que pode gerar ainda mais desigualdade de gênero no mercado de trabalho.
A BBC ouviu mulheres em diversos países onde a licença é garantida, e as experiências relatam resultados positivos, como a simplicidade em todo processo e até apoio de colegas de trabalho.
Mas algumas mulheres também relataram empecilhos colocados da parte dos empregadores para a obtenção da licença ou o aumento na competitividade e a expectativa social de suportar a dor dentro do ambiente de trabalho.
O argumento principal em torno do assunto é que desconfortos menstruais crônicos impactam diretamente a produtividade das trabalhadoras e, por isso, devem ser tratados como outras questões de saúde que já contam com autorização para licenças médicas.
O jornal Le Monde explicou como a lei espanhola funcionará na prática: trabalhadoras que sofrem com fortes sintomas durante o período menstrual poderão pedir licença pelo tempo que acharem necessário por meio de atestado médico.
A licença vai atestar “incapacidade médica temporária”. A lei também garante que a conta sairá do bolso do governo espanhol e não dos empregadores.
No Twitter, a ministra da Igualdade da Espanha, Irene Montero, comemorou a conquista da lei aprovada em fevereiro. “É um da histórico para o avanço feminista”, publicou em uma de suas redes sociais.
No Brasil
O Projeto de Lei 1249/22, assinado pela deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), vai na mesma linha, e pede para que o direito à licença menstrual seja incluído na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
O texto sugere licença médica de três dias consecutivos, a cada mês, às mulheres que comprovem sintomas graves associados ao fluxo menstrual, sem prejuízo do salário.
O projeto chegou a ser arquivado no ano passado, mas a deputada solicitou o desarquivamento e nova análise no mês passado.
Por enquanto, trabalhadoras brasileiras não contam com um amparo legal para uma licença específica relacionada ao desconforto durante o período menstrual.
Porém, é realidade que a maioria sofre com o período menstrual, além de conviverem com doenças como Endometriose ou Síndrome do Ovário Policístico.
Conforme a ginecologista e obstetra Rúbia Borges, a maioria esmagadora de suas pacientes relatam desconfortos durante a menstruação, desde a labilidade emocional, à desconfortos físicos mais intensos, como a cólica menstrual, que é o sintoma mais comum.
Assim, para a médica, um dos fatores importantes é que existam conversas sobre o assunto, com o objetivo de se respeitar as diferenças e disseminar o entendimento de que esse período é sofrido para muitas mulheres.
“A gente entende tudo como normal, mas não é. Vou te falar da minha própria experiência: admiro muito e honro essas mulheres [que não sentem dores], mas o primeiro dia do meu ciclo eu sinto muita dor, no campo físico. O meu primeiro dia é zero produtividade, porque eu sinto muita dor no corpo. Então é muito importante conversar, acima de tudo, viva às diferenças e o respeito”, declara.