Carreira em que o profissional passa dias longe de casa, na cabine de um caminhão, o setor de transporte de cargas em Mato Grosso do Sul está precisando de cerca de 3 mil trabalhadores em 2023, para completar esse problema antigo de falta de mão de obra, o que deixa várias empresas com boa parte de suas frotas estacionada à espera de gente qualificada.
Quem aponta para o problema do setor desguarnecido é o Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística do Estado de Mato Grosso do Sul, na figura do Diretor de Administração do Setlog, Dorival Oliveira, frisando que o motorista estradeiro, de longas viagens, é uma vocação de um pessoal que envelheceu.
"E não tem material de reposição. Hoje você é difícil pegar uma pessoa de 20 e poucos anos que quer ser motorista de caminhão. É uma profissão que parece que perdeu o atrativo, mesmo pagando salários bons a nível de mercado", expõe Dorival.
Como bem destaca ele, e também Gilmar Ribeiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte de Cargos de MS (Sindicargas), ainda que empresas custeiem um plano odontológico e de saúde, os altos valores de renovação de habilitação impedem que muitos motoristas avancem e cheguem até a categoria "E", necessária para esse trabalho.
Conforme o Sindicargas revela, por um estudo com a categoria, hoje, mais de cinco mil trabalhadores compõe esse grupo estagnado nas categorias "C" e "D", com salários em torno de R$ 2,5 a R$ 3 mil.
Vale ressaltar que um motorista com categoria "E" ganha em média R$ 8 mil, com trabalhadores que tiram até R$ 17 mil e outros que batem apenas R$ 3,5 mil no mês.
Entretanto, para avançar para essa última categoria de habilitação, estima-se que o trabalhador hoje - além de participar do curso de 30 dias para a progressão - precise desembolsar até R$ 4,2 mil nesse processo.
"Empresas estão com caminhões parados. E o trabalhador não tem essa condição, e fica na C e D para o resto da vida, por questão financeira", diz Gilmar.
Solução para problema antigo
Vale apontar que esse total de três mil trabalhadores necessários para o ano, trata-se de uma estimativa baseada no desempenho do mercado, contratações futuras e desligamentos que acontecem. Em Mato Grosso do Sul hoje são 900 vagas para esses profissionais, que podem acumular esses três milhares até o fim de 2023.
Com isso, ambas as entidades apontam para o programa que vem sido desenvolvido com o Governo do Estado, e apoio do Sest Senat, para custear o curso desses mais de cinco mil motoristas.
"Inclusive essa primeira etapa vai ser, em torno, de 500 a 1000 CNH's sem custo para o trabalhador. O profissional que, na C e D, tira até R$ 3 mil no máximo, na E vai ser em média de cinco a 10 mil reais", expõe Gilmar, do Sindicargas.
Para ele, até mesmo o empresário tende a ganhar nessa história, uma vez que com mais trabalhadores poderão botar para rodar os caminhões, hoje estacionados em suas garagens.
"Às vezes o caminhão está financiado, pagando parcela. Ele [o empresário], com pouca frota rodando, a tendência é vender o veículo parado que só tende a trazer prejuízo", completa o representante do sindicato de trabalhadores do setor.
Apontando que a estimativa é que os cursos gratuitos comecem já em abril, Dorival ainda comenta que a carreira tem suas dificuldades, como se privar do convívio familiar, festas, etc. "Você não tem uma vida social fácil. Tem que abrir mão de algumas coisas para ser motorista", cita.
Para ele, a iniciativa de oferecer gratuitamente os cursos a partir do mês que vêm, para atualização de CNH, pode suprir essas vagas do mercado, e também recompor a mão de obra da profissão.
"Muito motorista prefere ficar ganhando menos na cidade e, aliado ao alto custo da CNH, a pessoa acaba desistindo. Mas a gente precisa tomar uma posição, porque, continuando dessa forma, vamos chegar daqui a dois ou três anos e não vai mais existir motorista estradeiro", pontua Dorival.
Além do que já é oferecido para os motoristas (como planos de saúde e dentário custeados pelas empresas), o diretor de administração do Setlog cita que o caminho é investir no setor para oferecer mais benefícios sociais.
"Para tentar trazer esse pessoal para dentro. Estamos esbarrando na primeira demanda mesmo, o valor da renovação da CNH. O camarada que ganha até 3,5 mil reais no mês, não tem como gastar isso no valor de um curso que ele ainda vai levar 30 dias para fazer", faz questão de ressaltar.
Por fim, com base em estudos realizados no final de 2022 e começo de 2023, em época de Safra, Dorival comenta que a colheita foi um desastre, com percas nas lavouras pela falta de motoristas.
"Caminhões estão parados nos pátios, sem habilitados para o transporte da produção. E com esse incremento de duas indústrias grandes, uma só vai contratar 1800 motoristas e não temos esse contingente", conclui.
Entenda as categorias da CNH
Atualmente, motorista que tira sua primeira habilitação como condutor categoria B, leva cerca de três anos até chegar na E, com a possibilidade de dirigir as carretas e caminhões com reboques que fazem esse transporte de carga.
Essa progressão pode se dar de duas formas distintas, sendo uma delas a opção de subir de categoria a cada ano, já que é necessário o intervalo de 12 meses para progredir em ordem alfabética.
Entretanto, o motorista que visa a última das categorias, pode esperar por dois anos na "B" e pular direto para a "D", sem passar pela classe intermediária (que permite digir caminhões não articulados, tratores e máquinas agrícolas).
Uma vez na D, basta esperar mais 12 meses até chegar na última categoria, sendo necessários:
- Ter 21 anos completos
- Curso prático de 20 horas/aula
- Teste de direção veicular
- Estar aprovado nos exames de aptidão física e mental
- Além de não ter cometido infração gravíssima nos últimos 12 meses