O caráter violento de Christian Leitheim, de 25 anos, acusado pela morte de Sophia Ocampo, de dois anos, já era conhecido por pessoas de sua convivência, mas, denúncias não surtiam efeito, já que ele é filho do policial militar Adailton Cristiano Leitheim, que usava de sua influência para proteger o filho.
Em entrevista exclusiva para o Correio do Estado, a ex-esposa de Christian, Andressa Victória Fernandes, de 22 anos, com quem ele tem um filho de quatro anos, relatou episódios de agressões físicas e psicológicas praticadas pelo acusado, afirmando que todas as vezes em que tentou denunciar, a influência do sobrenome sobressaiu para que o agressor ficasse impune.
Segundo seu relato, logo após a primeira denúncia, além de passar por tortura psicológica por parte do seu então namorado, sua família também começou a ser ameaçada por Adailton. De acordo com o relatado, ele é conhecido na corporação e, sempre que a polícia era chamada no endereço em que as vítimas estavam, a polícia não comparecia.
Andressa relembra que uma das primeiras vezes que viu Christian ser protegido foi quando, no meio de uma discussão, os familiares dela chamaram a polícia, mas, logo em seguida, o PM foi à casa em que eles estavam, armado e passou a agredir verbalmente os que estavam presentes.
“Na hora que a gente acionou a polícia, ele ligou para o pai dele. Ele chegou armado e ameaçando a gente. Depois dele ter ido embora, não demorou muito e a polícia chegou e, quando começamos a relatar o que aconteceu e falamos o nome dele, contando que estava armado, eles falaram que sabiam quem era”, recorda.
E completa: “Na hora a gente entendeu que eles se conheciam. Até então, eu não sabia que existia toda essa cobertura para quem é filho de policial”, afirmou, enfatizando que foi levada à Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (Deam) pelo policial que, dentro da viatura, contou a situação para uma terceira pessoa, chamando Adailton pelo apelido.
Além de ser protegido pelo pai, que sempre ia ao encontro de Christian armado para resolver conflitos tanto com Andressa quanto com qualquer outra pessoa, a vítima ainda acredita existir uma rede de informações para não deixar que as denúncias contra o acusado deem resultado.
“Depois desse dia, a família dele pediu para eu tirar a denúncia e, como eles ameaçaram minha família, eu voltei pra casa [dos ex-sogros, onde morava na época]. Eu retirei apenas a medida protetiva e iria deixar a denúncia, mas essa informação chegou até eles e me forçaram a retirar a denúncia também porque falaram que iam tirar meu filho de mim”, contou.
Em outro episódio, Andressa relata que a influência de seu ex-sogro também fez com que o atendimento dado à ela na Defensoria Pública Estadual fosse negligenciado. Conforme seu relato, no dia em que foi ao órgão buscar alguma forma de ter a guarda de seu filho, que estava morando com os avós e o pai, esta informação foi vazada e uma foto sua durante o atendimento chegou para a mãe de Christian, que, de imediato, mandou uma mensagem para Andressa dizendo que ela não iria conseguir voltar a ver seu filho.
Ainda de acordo com Andressa, Adailton também se aproveitava de seu cargo para ameaçá-la, dizendo que se ela falasse para alguém sobre as agressões, ele iria levá-la para uma delegacia e prendê-la por desacato “porque sabia que ninguém iria fazer alguma coisa contra ele”.
Na entrevista, a vítima reforçou que,da mesma forma que o PM usava a influência para proteger o filho, Christian também se aproveitava do cargo do pai para agredir não só Andressa, mas também o filho que tiveram juntos.
“O Christian falava ‘eu posso fazer isso porque meu pai é policial e não vai acontecer nada comigo’. E realmente não aconteceu”, afirmou.
De acordo com informações as quais o Correio do Estado teve acesso, o processo gerado a partir de uma das denúncias feitas na Deam foi arquivado em 09 de agosto de 2022, sendo que o primeiro boletim de ocorrência na delegacia é de 2018.
Antes de ser arquivado, oficiais de justiça tentaram intimar o acusado ao menos três vezes, mas sem sucesso e, como Andressa havia mudado de cidade, o processo não teve movimentação.
A ação foi reaberta no dia 31 de janeiro deste ano, logo após a polícia apontá-lo como um dos assassinos de Sophia, que morreu no dia 26 de janeiro, e tramita na Justiça de MS, com a última movimentação registrada no dia 03 de fevereiro.
“Ele nunca foi chamado para depor na Delegacia da Mulher, sendo que ali já tinham provas suficientes, inclusive fotos. Foram três denúncias registradas, mas cheguei a ir mais de seis vezes na Casa da Mulher, mas eles nem fizeram questão de me atender e fazer o boletim de ocorrência”, relatou.
Por fim, Andressa ainda destaca que o pai de Christian usou sua influência para ter a guarda provisória do neto, que está há três meses sem ter qualquer contato com a mãe, já que a criança está sob os cuidados dos avós desde que o pai foi preso.
“Pela informação que eu tenho, eles conseguiram pelo Núcleo Militar”, afirmou, mas não souber detalhar como teria sido esse processo porque, de acordo com ela, não conseguiu ter muitas informações sobre como isso aconteceu.
“Após saber dessa informação sobre a guarda provisória, eu fui na Depca [Delegacia Especializada em Proteção da Criança e do Adolescente] e me orientaram a fazer a contestação de guarda e estou esperando a audiência que foi marcada”, concluiu.
PEDIDO DE LIBERDADE
Na primeira audiência sobre a morte de Sophia Ocampo, morta aos dois anos, quando foram ouvidas cinco testemunhas de acusação, a defesa de Christian fez um pedido para que o acusado responda o processo em liberdade.
A defesa alega que ele está em perigo de vida por estar em contato com outros presidiários, no entanto, ele está em cela isolada em um presídio do interior de MS.