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suspeita de corrupção

Mesmo com contrato milionário, ruas sem asfalto de Campo Grande têm crateras e são intransitáveis

Com contrato de R$ 24 milhões, empresa responsável pela pavimentação da capital foi alvo de uma Operação do Ministério Público nesta quinta-feira

16 JUN 2023 • POR Alison Silva • 18h45
Rua Padre Antônio Franco, Jardim Noroeste   Foto: Gerson Oliveira

Enquanto o Ministério Público de Mato Grosso do Sul investiga contratos milionários para a manutenção de vias não pavimentadas, que podem chegar a R$ 300 milhões, e são suspeitos de serem a origem de um gigantesco esquema de corrupção, as vias públicas sem asfalto, objeto do contrato, padecem da manutenção deveriam receber. 

A comprovação do mau serviço prestado, que reforça o indício investigado pelo Ministério Público, é reforçado pelos moradores da periferia de Campo Grande. Empresas como a A L dos Santos, do empreiteiro André Patrola, é um dos pivôs do esquema. Sozinha, ela tem um contrato de R$ 24 milhões. Mas há outros. 

Natural de São Paulo, Natália Katarina, vive junto do marido e dois filhos na região do Jardim Noroeste há pelo menos 18 anos.

Sem pavimentação na rua onde mora, inclusive em frente à casa onde vive, a jovem de 27 anos alega que a falta de cascalhamento na região é prejudicial sobretudo nos momentos de chuva. “Só boatos sobre cascalhamento e asfaltamento da região. Falam sobre as melhorias há mais de um ano, mexem na rua e nada melhora, estamos praticamente jogados”, disse. 

Conforme a moradora, desde que está no bairro, a administração municipal trabalha apenas de forma ‘paliativa’, sobretudo em períodos de eleição.

Com um dos filhos autista, destaca que a falta de assistência da prefeitura acerca de melhorias  na pavimentação de Campo Grande à atingem indiretamente sobretudo no cuidado com os filhos. “Quando chove não dá pra sair, abrem valetas nas ruas. Sofro para levar meus filhos na escola, tenho um filho autista e a falta de acessibilidade e pavimentação atrapalha até nisso, pois ele precisa fazer acompanhamento”, frisou. 

Empresário no ramo de caminhões, Adelar Trevisan reside no mesmo bairro que Natália pelo menos desde 2013. Nascido no Rio Grande do Sul e com propriedades em Chapecó, Santa Catarina, reside junto  de familiares em uma via não pavimentada do bairro.

“Essa rua é complicada, meu vizinho tem asfalto na porta da casa, com isso o problema (pavimentação) passa a ser meu, digamos”, disse. Conforme Trevisan, a região está abandonada pela administração. “O terreno aqui da esquina não sei nem quem é o dono, toda a vida está abandonado, tudo isso deixa a situação difícil, fica difícil e  ninguém faz muita força”, alegou. Ex-morador do Parque Maria Pedrossian, Adelar Trevisan faz uma comparação com o município em que possui propriedades.

“Vivi em bairros lá (Santa Catarina) onde as condições eram muito melhores das que temos aqui. Em termos de capitais, Campo Grande está muito atrasada, a administração tem de buscar melhorar a região, eu não tenho poder de barganha e nem conheço ninguém da administração que possa melhorar isso aqui”, finalizou. 

Distante cerca de 10 km, ambulantes do bairro Nova Lima, região norte de Campo Grande, destacam os mesmos problemas de Natália Karina e Aderlan Trevisan. Sem se identificar, falaram ao Correio do Estado que as únicas e poucas melhorias vistas na região foram direcionadas aos moradores do Jardim Columbia, bairro adjacente.

Rua Alexandrino de Alencar

Assim como os moradores do Jardim Noroeste, ambos alegaram que nem os espaços já asfaltados e mais estruturados da ‘vila’ atendem as necessidades dos moradores locais. “Estamos vivendo sem perspectiva de melhoras, a administração não auxilia aqui, isso há pelo menos duas décadas, perdemos as esperanças”, disseram. 

Operação

Desencadeada nesta quinta-feira (15) pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), a ação tinha como um dos principais alvos, André Luiz dos Santos, conhecido como “André Patrola”, dono da empreiteira ALS Transportes, detentora de contratos que ultrapassam a casa dos R$ 300 milhões com a Prefeitura Municipal. As investigações apuram possível organização criminosa estabelecida para a prática de crimes de peculato, corrupção, fraude em licitação e lavagem de dinheiro. 

De acordo com o Portal de Transparência da Prefeitura de Campo Grande, Patrola tem três contratos ativos com o município, que, somados, equivalem a R$ 26,3 milhões.

O primeiro, o maior deles, de R$ 24,7 milhões, é referente à manutenção de vias não pavimentadas. Conforme o Portal da Transparência, o contrato recebeu cinco aditivos, saindo de R$ 4,1 milhões, em 2018, período em que foi assinado, para os atuais R$ 24,7 milhões, fatia cinco vezes superior aos valores acordados há cinco anos.

Segundo o Portal da Transparência, a ALS Transportes, sob o nome de Andre L. dos Santos Ltda., é responsável pela manutenção de todas as vias não pavimentadas em seis das sete regiões de Campo Grande (Anhanduizinho, Imbirussu, Bandeira, Lagoa, Prosa e Segredo). A única região não contemplada é a centro, porém, nessa área não há ruas sem asfalto.

A empresa também tem um segundo contrato ativo com a mesma finalidade, no valor de R$ 1.090.055,68, que foi assinado em maio do ano passado e tinha previsão de duração até maio deste ano, mas ainda consta como ativo.

O terceiro contrato torna a empresa responsável pela “prestação de serviços ambientais que visam ao atendimento do Programa de Recuperação de Áreas Degradadas e Conservação da Bacia Hidrográfica do Córrego Guariroba”. O contrato, de R$ 600 mil, começou em março de 2018 e tem vigência até março de 2024.

Além de Campo Grande, a empresa também já fez parcerias com outras prefeituras de Mato Grosso do Sul e até com o governo do Estado.

Em Corumbá, são quatro contratos ativos, no valor total de R$ 78.089.200,24. 

Entre os contratos estão: prestação de serviços públicos de limpeza (como varrição manual de vias, calçadas e logradouros públicos, capina, roçada e raspagem manual de passeios, guias, sarjetas, vias e logradouros públicos, roçada mecânica de passeios, guias, sarjetas, vias e logradouros públicos e pintura de meio-fio); serviços de implantação de revestimento primário em rodovias vicinais nos assentamentos Jacadigo e Taquaral; execução de obras/serviços de manutenção de vias e travessões de assentamentos rurais (Tamarineiro I Norte, II Norte e Sul, Paiolzinho, Taquaral, São Gabriel, Mato Grande e Urucum) e do distrito de Albuquerque, com revestimento primário existente; e locação de máquinas e de caminhões destinados à Secretaria Municipal de Infraestrutura do município.

Com o governo do Estado, a empresa de Patrola possui cinco contratos, no valor total de R$ 162 milhões.
Apesar de todos esses supercontratos, o capital social da Andre L. dos Santos Ltda. é de R$ 10 milhões.

Colaborou Daiany Albuquerque

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