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Animais sivestres

Fauna do cerrado e Pantanal ganha hospital veterinário de ponta em Mato Grosso do Sul

Animais da região, como onças, araras, jaguatiricas, macacos, entre outros, passam a ser atendidos em moderno hospital inaugurado em Campo Grande

14 SET 2023 • POR Alanis Netto • 18h45
  Divulgação: Semadesc

A partir desta sexta-feira (15), começa a funcionar em Campo Grande o maior e mais especializado Hospital Veterinário para Animais Silvestres da América Latina. O local faz parte do complexo do Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS), e foi batizado de "Ayty" (pronuncia-se aitã), nome oriundo da língua Tupi-Guarani que significa "ninho".

Foram investidos mais de R$ 6,1 milhões na construção e compra de equipamentos para o hospital, que terá capacidade para atender as demandas da fauna de todo o Estado, e se tornará referência na especialidade de atentimento a animais silvestres para todo o País.

"Isso aqui é a concretização de um sonho para todos os nossos servidores que atuam na conservação da biodiversidade", comemorou o diretor-presidente do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), André Borges, durante cerimônia de lançamento, realizada na tarde desta quinta-feira (14).

Atualmente, o CRAS atende cerca de 2.500 animais por ano, e possui uma média de 70% de sucesso na reabilitação dos animais e reintrodução dos mesmos na natureza.

"Nós esperamos que com esse hospital a gente possa aumentar esse número e melhorar esses indicadores", pontuou Borges.

Com a entrega do "Ayty", o centro de reabilitação não vai mais precisar depender de parceiros, como clínicas privadas e estruturas de universidades, para realizar os exames necessários e atendimentos mais especializados.

"Anteriormente, os animais que chegavam aqui e necessitavam de um atendimento um pouco mais complexo eram destinados para os nossos parceiros, para a Universidade Federal, para algumas clínicas particulares que faziam os procedimentos necessários (...) Agora, com o hospital, todos esses procedimentos vão ser realizados aqui", comemorou o diretor do Imasul.

A proposta de construir um hospital no CRAS havia começado a ser discutida no governo anterior, de Reinaldo Azambuja (PSDB). As obras tiveram início em 2020, e só foram concluídas no governo de seu suscessor, Eduardo Riedel (PSDB).

"O que a gente entrega aqui hoje é um símbolo muito forte de que nós vamos dar para a biodiversidade do estado de Mato Grosso do Sul, que tem três biomas - o Pantanal, o Cerrado e a Mata Atlântica - a devida importância, a devida relevância que merece", destacou o governador do Estado, durante a cerimônia.

Além do atendimento aos animais, o hospital será um importante polo de pesquisa para os biólogos e médicos veterinários que buscam se especializar na área de atendimento às espécies silvestres. Universidades de Mato Grosso do Sul poderão oferecer cursos de pós-graduação, e utilizar a estrutura das clínicas e laboratórios do complexo como "sala de aula".

"Vamos oferecer aqui a primeira residência médica veterinária em animais silvestres do Brasil" declarou o secretário Jaime Verruck, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc).

"Nós vamos ter pós-graduações e um volume muito forte em pesquisa científica. Isso vai ser um braço para o desenvolvimento de literatura e da comunidade científica", destacou o médico veterinário e responsável técnico do CRAS, Lucas Cazati.

O ex-governador Reinaldo Azambuja também esteve presente no evento, garantiu que a estrutura, associada aos profissionais qualificados que atuam no CRAS, irá melhorar ainda mais o tratamento dos animais silvestres no Estado.

"Eu não tenho dúvida de que o índice de 70% pode ser melhorado, porque uma estrutura melhor, equipamentos melhores, condições humanas melhores de trabalho vão propiciar melhoria na recuperação dos animais. Nosso intuito é sempre evitar os acidentes, mas quando houver, que a gente tenha condição de tratá-los e recuperá-los", declarou Azambuja, durante entrevista coletiva.

Divulgação: Governo do Estado

Também participaram da inauguração o vice-governador, José Carlos Barbosa, os secretários Eduardo Rocha (Casa Civil), Pedro Caravina (Governo e Gestão Estratégica), Patrícia Cozzolino (Assistência Social e Direitos Humanos), Hélio Daher (Educação), Marcelo Miranda (Setescc), além de deputados estaduais, vereadores, prefeitos e dirigentes de entidades e instituições do Governo do Estado.

Estrutura

O hospital, de mais de 1.100 metros quadrados, possui toda a estrutura necessária para os atendimentos, igual a um "hospital de humanos", como brincou o médico veterinário e responsável técnico do CRAS, Lucas Cazati

"Temos ambulatório, salas de emergência, patologia clínica, biópsia, e o maior e mais bem equipado centro-cirúrgico do centro-oeste", destacou Cazati.

Local foi apresentado às autoridades após a cerimônia

O Correio do Estado conheceu o local, que chama a atenção pelo tamanho da estrutura e pela qualidade dos equipamentos, que são "de ponta".

Foram investidos mais de R$ 1 milhão para mobiliar e equipar o hospital. A lista de itens inclui mesa para anestesia, máquina de tosa para tricotomia, laringoscópio em led, monitor multiparamêtrico com capnografia, bombas de infusão para equipo e seringa, aspirador cirúrgico com pedal e ponteira, incubadora, calha cirúrgica em três tamanhos, mesa cirúrgica de inox com dois motores, maca com carrinho em inox, mesa para instrumental cirúrgico, aquecedor elétrico a óleo para filhotes, mesa buck para raio-x, aparelho de ultrassom, autoclave 21 litros horizontal digital, sistemas de radiografia veterinária completos, ambu, traqueia, mobiliário completo para dependências administrativas e demais componentes.

Divulgação

O espaço conta com dois ambulatórios; um laboratório clínico, que é novidade no CRAS - anteriormente, os exames precisavam ser feitos em clínicas privadas ou Universidades -; almoxarifado; farmácia; sala de esterilização; sala de exames de imagem, com raio X portátil e ultrassom, além de uma impressora 3D para confecção de próteses, quando necessário; sala de antissepsia; sala de preparação de pacientes; centro cirúrgico com equipamentos modernos e capacidade para atender animais de até 80 quilos; setor de pós-operatório.

Cinco salas foram dedicadas à quarentena, três delas de aves, que já abrigam espécies de pássaros, uma de répteis, que já conta com a presença de jabutis, sala de quarentena de mamíferos, e uma sala de isolamento. 

Sala de amostras, dois laboratórios de patologia clínica, sala de antissepsia, sala de necropsia, câmara fria e lavanderia também fazem parte da estrutura.

O "Cambiamento", local que funciona como quarentena para animais maiores, também já possui moradores, como os irmãos órfãos tamanduá-bandeira, uma simpática jaguatirica, araras, macacos e uma onça parda. Confira a galeria de fotos da visita:

Hospital também conta com recepção, secretaria, lavabos e vestiário masculino e feminino, sala para os biólogos, sala para os veterinários, sala administrativa, despensa, copa, e quarto de repouso do profissional plantonista.

Não para por aí...

Durante o evento de inauguração do Hospital, o diretor presidente do Imasul, André Borges, anunciou ainda que serão realizados investimentos para reestruturar todo o complexo do CRAS.

"Não sei se eu podia falar", brincou, "Mas em breve nós vamos apresentar toda a reestruturação do CRAS. Nós temos um hospital novo, então todo o CRAS vai ser restaurado, reestruturado, readequado a atender essa nova necessidade", afirmou.

Além do novo hospital, o complexo é composto por sede administrativa; centro de atendimento veterinário; cozinha; biotério: quarentena; recintos para aves, mamíferos e répteis; recinto para treinamento de vôo; cercados e piquete para mamíferos de médio porte.

Em Corumbá

Em julho deste ano, a Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) repassou R$ 4,1 milhões para a Prefeitura de Corumbá, município localizado a 426 quilômetros de Campo Grande, para a construção de um Centro de Reabilitação de Animais Silvestres do Pantanal, já batizado Crepan.

O local deve funcionar nos moldes do CRAS de Campo Grande, que é referência no atendimento de animais silvestres em todo o Centro-Oeste.

Conforme o projeto, o Creapan vai conter recintos de quarentena, sala de avaliação clínica, sala cirúrgica, câmara frigorífica, sala de raio X, almoxarifado, vestiários para funcionários, cozinha com estrutura para higienização, armazenamento adequado e prepraro e distribuição de alimentos.

Deverá haver outros blocos separados dos recintos apropriados a cada espécie de modo a não permitir contato entre as diferentes espécies e desta forma não estressar os animais em recuperação. Igualmente, o projeto prevê ambientes apropriados para répteis, primatas, aves, treino de aves, recinto fechado para mamíferos e área aberta para mamíferos e roedores de grande porte.

Centro de Reabilitação de Animais Silvestres

O CRAS foi criado há 36 anos, em julho de 1987, com o intuito de recepcionar, triar e destinar os animais silvestres apreendidos em operações de combate ao tráfico, animais atropelados nas rodovias estaduais, bem como os entregues voluntariamente pela população.

A unidade foi um dos primeiros Centros de Triagem de Animais Silvestres criados no Brasil. Desde sua criação, milhares de animais confiscados pela fiscalização deixaram de ser soltos de forma aleatória, sem qualquer processo de triagem ou reabilitação.

Segundo o CRAS, o processo permitiu também formar no Estado uma equipe técnica habilitada em identificar os diferentes espécimes apreendidos, sua área de ocorrência natural, bem como realizar avaliações clínicas do estado sanitário de cada um destes animais recebidos, visando minimizar os riscos ligados às ações de soltura indiscriminada de animais na natureza.

O CRAS já recepcionou mais de 300 espécies entre aves, répteis e mamíferos, perfazendo perto de 41.000 animais. Deste total 68% são aves, 20% mamíferos e 12% répteis. O número de animais ameaçados de extinção é de 4% em relação ao total de entradas.

As destinações podem ser classificadas como: manejo in-situ (devolução ao ambiente natural para repovoamentos com soltura em local onde a espécie está presente) e manejo ex-situ (atendimento a projetos de conservação da espécie, após consulta ao comitê, e encaminhamento a instituições de pesquisa, zoológicos, criadores comerciais, científicos e conservacionistas).

Atividades

RECEPÇÃO: os animais encaminhados ao centro geralmente são oriundos de apreensões realizadas pela Polícia Militar Ambiental; apreensões realizadas pelo IBAMA / MS ou doações por particulares.

QUARENTENA E ACONDICIONAMENTO: a quarentena consiste no isolamento do animal para observações mais detalhadas, visando evitar qualquer contaminação nos recintos. O período de quarentena é variado, não devendo ser inferior a 7 dias. Nesse período o animal é marcado, sexado e vermifugado.

ACOMPANHAMENTO NUTRICIONAL, SANITÁRIO E COMPORTAMENTAL: após a quarentena o animal é alojado em recintos individuais ou coletivos, de acordo com suas características biológicas. Durante o período de permanência no Centro, os animais são acompanhados individualmente quanto aos aspectos sanitários, nutricionais e comportamentais. Cada animal é analisado de acordo com sua origem, tempo de cativeiro, estado de mansidão e físico, idade, sexo e outros.

DESTINAÇÃO: as destinações seguem princípios básicos pré-estabelecidos, em consenso da equipe técnica, considerando-se as condições do animal em questão e seguem recomendações e legislação do IBAMA e de órgãos internacionais de combate ao tráfico de animais silvestres. Estas destinações podem ser classificadas como: devolução ao ambiente natural para repovoamentos (soltura em local onde a espécie está presente); translocação (soltura após curto período de cativeiro); atendimento a projetos de conservação da espécie (após consulta ao comitê) e encaminhamento a instituições de pesquisa ou zoológicos. Algumas espécies são mais difíceis de serem destinadas, como por exemplo, onças e animais peçonhentos. Não há áreas nativas relativamente extensas para abrigar estes animais e os fazendeiros cadastrados não permitem a soltura destas espécies.

MONITORAMENTO: A maioria dos animais antes de saírem do Centro são marcados de acordo com suas características físicas (anilhas, tatuagem, picote na orelha, brincos e furos na carapaça), para que seja possível o seu monitoramento. As informações referentes aos animais utilizados para repovoamentos são extremamente importantes, tendo em vista, os escassos dados sobre o assunto. O Centro, por sua vez, realiza periodicamente, vistorias nos locais para onde os animais foram encaminhados, visando coletar informações e acompanhar a adaptação dos animais soltos.

Visitas

Uma Resolução CONAMA n° 489 de 26 de outubro de 2018, que estabeleceu critérios para os empreendimentos que manejam fauna em cativeiro, determinou que somente é permitida visitação pública aos zoológicos.

Sendo assim, para demais empreendimentos, como o Centro de Reabilitação de Animais Silvestres, só pode ser realizada visita monitorada de cunho técnico-científico, previamente agendada com a coordenação do CRAS.

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