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ARTE Presidente do bairro rabisca grafite que custou R$ 2 mil e 7 horas de trabalho a artista Ele alegou que a artista não tem autorização da prefeitura para grafitar o local; PMCG autoriza manifestações artísticas em espaços de convivência, praças ou outras áreas de encontro, passagem e lazer 1 FEV 2024 • POR Naiara Camargo • 12h45
Thais Maia, de 28 anos, ao lado de sua arte que foi destruída pelas mãos de terceiros   MARCELO VICTOR

Grafite, situado em um mural de 25 metros na Orla Morena, foi rabiscado pelo presidente da associação de moradores do bairro Cabreúva, Eduardo Cabral, na tarde de terça-feira (30). O caso ganhou repercussão apenas nesta quarta-feira (31).

Artista visual, Thais Maia, que é autora da obra, gastou R$ 2 mil de seu próprio bolso e levou sete horas para grafitar o mural.

Em poucos minutos, Cabral jogou tinta branca por cima e manchou o trabalho que Thais levou horas para fazer. Vídeo divulgado nas redes sociais flagrou a ação do presidente do bairro.

Ele alegou que a artista não tem autorização da Prefeitura Municipal de Campo Grande (PMCG) para grafitar o local e que, no calor do momento, acabou borrando a obra da menina pois “estava de cabeça quente”.

O mural está localizado na Orla Morena, bairro Cabreúva e foi grafitado em homenagem aos animais, representados por gatos cor-de-rosa.

“Eu sou muito apaixonado por animais, eu sempre levanto causa animal, principalmente no meu trabalho. Os gatos são os animais mais negligenciados na rua, são abandonados, são torturados, as pessoas matam, as pessoas jogam em terreno baldio, as pessoas acham que gato é lixo, então muito do meu trabalho que você vai ver pela cidade é gato, gato, gato, gato. Eu sempre tô levando essa pauta dos gatos porque os gatos são os animais que mais são torturados. Eles fazem parte da minha arte 100% do tempo”, explicou Thais.

Veja a galeria de fotos:

Em 13 anos de profissão, é a primeira vez que Thais viu sua arte ameaçada. “É a primeira vez que eu passo por isso, nem imaginei que eu ia passar por isso ainda. A galera normalmente fica super empolgada, tanto que quando a gente estava pintando eu peguei o contato de um monte de morador, porque todo mundo pediu para fazer na casa deles”, contou.

Confusão e gritaria entre grafiteiros e presidente do bairro/comerciantes tomou conta da região da feirinha da Orla Morena, no fim da tarde de terça-feira (30). De acordo com a artista visual, três homens atacaram verbalmente e rabiscaram o trabalho realizado pelas meninas.

“Os caras chegaram e deram carteirada na gente. Ele chegou, começou a gritar com a gente, já falando que ia tacar tinta, que isso não podia. Ele nem deu chance da gente argumentar. Os caras chegaram super autoritários, não quiseram ouvir. A gente tentou conversar com ele, não teve chance. Foi a gente afastar um pouco do mural que eles pegaram e tacaram tintas”, detalhou a artista visual.

Segundo o fotógrafo, empresário e presidente da associação de moradores do bairro Cabreúva, Eduardo Cabral, espaços públicos precisam de autorização para serem grafitados.

“Eu fui chamado para vir aqui terça-feira a tarde porque me falaram que estavam pichando toda a Orla. Cheguei aqui, me apresentei e disse ‘Vocês têm autorização para por?’ e me falaram ‘Não, eu sou artista, eu faço grafite em qualquer espaço público que sou autorizado. Eu sou amiga da prefeita’. [Ela] me peitou. Todo bem público tem que ter autorização para fazer um grafite, desenho, qualquer coisa que seja”, disse.

Ele ainda apresentou um projeto de mosaico, autorizado e aprovado pela Secretaria de Cultura e Turismo de Campo Grande (Sectur), para pintar no palco da Orla Morena. Veja:

Projeto de mosaico no palco da Orla Morena. Foto: Marcelo Victor

GRAFITE x PICHAÇÃO

A pichação contém escritas ou dizeres. O grafite se refere a desenhos ou imagens.

A principal diferença é que a pichação advém da escrita, enquanto o grafite está diretamente relacionado à imagem. Ambas são pinturas feitas com tintas spray ou de látex.

De acordo com a Lei nº 5230, publicada em 6 de novembro de 2013, o grafite é permitido em espaços de convivência, praças ou outras áreas de encontro, passagem e lazer. Veja o trecho redigido no Diário Oficial:

“São consideradas expressões urbanas livres no contexto desta lei o grafite, o estêncil, o painelismo e o muralismo. O município disponibilizará espaços próprios específicos para as diferentes manifestações de arte e expressão urbana livre, na forma de muros, paredes, murais, tapumes de obras ou espaços construídos para esse fim. As áreas específicas devem compreender bairros de todas as regiões urbanas em espaços de convivência, praças ou outras áreas de encontro, passagem e lazer, respeitando a legislação urbanística competente. É vedada a utilização de manifestações que ofendam, caluniem ou atentem moralmente contra pessoas, que expressem de qualquer maneira propaganda ou anúncio, sendo proibida conotação política ou partidária, religiosa, o uso de símbolos e códigos”.

“Pichação é a pichação. Grafite é grafite. As pessoas acham que a letra é a pichação, então assim, as letras não são crime. Grafite entra como revitalização de espaço público. É um presente pra cidade. É um espaço que a gente vem agregar, não vem cometer crime nenhum não. Grafite não é crime”, finalizou a artista visual, Thais Maia.