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CONSTRUÇÃO CIVIL

Empreendimentos terão de promover ao menos 2 consultas populares

Decreto de Adriane Lopes manda submeter qualquer projeto urbano a audiências públicas; medida pode burocratizar setor

11 MAR 2024 • POR Eduardo Miranda • 09h00
No Chácara Cachoeira, empreendimentos têm sido criticados   Gerson Oliveira/ Correio do Estado

A prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), publicou decreto neste mês que regulamenta a realização de audiências públicas para debater o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e o Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) dos empreendimentos a serem lançados dentro do perímetro urbano de Campo Grande. 

O decreto editado pela prefeita no dia 1º de março deve normatizar um tema que foi judicializado depois que moradores de bairros de classe média, como Chácara Cachoeira e Vilas Boas, voltaram-se contra o lançamento de empreendimentos verticais.

Nos bastidores, o Correio do Estado apurou que o setor da construção civil não recebeu bem o decreto, que obriga a realização de audiências públicas para a aprovação de todos os estudos de impactos de vizinhança de um empreendimento.

Na prática, tal exigência pode burocratizar o lançamento de edifícios, supermercados, centros comerciais e de qualquer atividade que gere impacto significativo nos bairros. 

O decreto de Adriane Lopes regulamenta exigências já previstas no Plano Diretor, aprovado e sancionado em 2018. Tal normatização não ocorria desde a administração de Marquinhos Trad (PSD). 

O problema se agravou depois que moradores de bairros de classe média se voltaram contra novos empreendimentos em sua vizinhança.

Tais reações são inéditas em Campo Grande, pois, anteriormente, elas eram bem-vindas em bairros mais afastados, centrais, humildes ou de classe média, pois os empreendimentos sempre foram tratados como fatores que poderiam valorizar um bairro. 

65
empreendimentos em risco de suspensão

Ação civil pública ajuizada no ano passado pela ONG Auditar Brasil, ligada ao ex-vereador e ativista ambiental Marcelo Bluma, quer suspender 65 empreendimentos em Campo Grande, a maioria deles edifícios residenciais verticais, além de um shopping nas Moreninhas.

O decreto

O Decreto nº 15.846 estabelece que, “para efeitos de licenciamento urbanístico, deverá ser objeto de audiência pública, previamente à decisão final sobre a expedição da Guia de Diretrizes Urbanísticas (GDU), os empreendimentos e/ou atividades que estiverem sujeitos à apresentação de Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e seu respectivo Relatório de Impacto de Vizinhança (RIV)”. 

O decreto ainda prevê que, “para efeitos do licenciamento ambiental, deverá ser objeto de audiência pública, previamente à decisão final sobre a expedição da licença ambiental, os empreendimentos e/ou atividades que estiverem sujeitos à apresentação de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (Rima)”.

Os documentos dos empreendimentos deverão estar disponíveis 25 dias antes das consultas, e contribuições e sugestões poderão ser dadas no período de 15 dias após a convocação das audiências públicas. 

A audiência pública será dirigida pela Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano (Planurb), se for para EIV, ou pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semadur), se for para EIA/Rima.

O empreendedor vai secretariar a sessão. O decreto não faz menção a nenhum caráter deliberativo das audiências públicas. 

Polêmica

A regulamentação das audiências ocorre em meio a uma disputa judicial travada com a organização não governamental (ONG) Auditar Brasil, liderada pelo ex-vereador, advogado, engenheiro e ativista ambiental Marcelo Bluma, ligado ao PV. Em uma das ações, a ONG conseguiu paralisar os empreendimentos da construção civil na cidade. 

Alegando a não realização de audiências públicas para debater os EIVs de 65 projetos, Bluma pediu à Justiça para que todos fossem paralisados até que as consultas sejam realizadas. 

Caso o Judiciário atenda ao pedido do ex-vereador, mais de 15 mil unidades habitacionais, muitas delas já prontas e comercializadas, poderão ser embargadas ou ter suas obras suspensas.

A ONG autora da ação, a Auditar Brasil, funciona na Rua Bela Cintra, no Bairro Tiradentes, no endereço da sede do Partido Verde, historicamente comandado por Marcelo Bluma. A cruzada de Bluma contra a construção civil em Campo Grande teve início depois que a incorporadora Plaenge decidiu lançar um residencial vertical de 94 unidades a poucas quadras de sua casa, no Bairro Chácara Cachoeira.

Por causa deste projeto, Bluma, apoiado por vizinhos, ingressou com outra ação civil pública, em que obteve liminar favorável, para suspender a Guia de Diretrizes Urbanísticas (GDU) do empreendimento, documento que autoriza a incorporadora a dar início à construção do edifício. 

O grupo resiste à verticalização do bairro e, pelo teor da ação civil pública, fez a disputa escalar ainda mais, pedindo a paralisação de 65 projetos em Campo Grande.

Entre as obras que poderão ser suspensas ou embargadas estão edifícios já concluídos da construtora Northern Capital, cujo nome de fantasia é Jooy, no Bairro Mata do Jacinto – todos os apartamentos foram vendidos no residencial Jooy Style.

Em outro residencial da mesma construtora, o Jooy Wonder, na Vila Planalto, as obras estão 68% prontas, quase todas as unidades foram comercializadas e todas as torres já estão em pé. Ao lado delas, um outro residencial, que integra o projeto Reviva Campo Grande, que tem como objetivo revitalizar o centro da cidade, também poderá ter suas obras embargadas.

As 792 unidades do Reviva Campo Grande levantadas pela Cesari Construtora já estão sendo comercializadas, e o canteiro de obras já foi todo mobilizado.

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