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ENTREVISTA

"Queremos remodelar o terminal intermodal, agora não focado na ferrovia, mas sim na rodovia"

O titular da Sidagro disse em entrevista ao Correio do Estado que a Rota Bioceânica impõe à Campo Grande uma reformulação na estrutura logística

29 JUN 2024 • POR Súzan Benites e Evelyn Thamaris • 09h30
  Foto: Marcelo Victor

Médico veterinário, Ademar Silva Junior tomou posse em 19 de abril como secretário municipal de Inovação, Desenvolvimento Econômico e Agronegócio (Sidagro). 

Em entrevista ao Correio do Estado, ele destaca a importância da Rota Bioceânica para o desenvolvimento econômico de Campo Grande. Fala ainda sobre o agronegócio da Capital e as políticas de incentivo fiscal. 

O secretário ainda ressalta ser fundamental o investimento em atrações para movimentar o centro da cidade e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano.  

Confira a entrevista a seguir: 

Houve recentemente o fortalecimento da atuação do Serviço de Inspeção Municipal, principalmente na questão da produção local, existe a intenção de fomentar a produção da Capital?

Realmente Campo Grande é o grande centro do Mato Grosso do Sul, porque trinta e tantos por cento da população do Estado está residindo na Capital. Isso faz com que a economia de Campo Grande seja muito pujante em vários setores, principalmente os serviços, a indústria e o agronegócio.

A agroindústria é o grande foco da região central de Mato Grosso do Sul. Quando a gente fala em proteína, está aí uma das maiores plantas de proteína do mundo, a JBS, instalada aqui. A cidade ganha com a instalação da Suzano em Ribas do Rio Pardo, porque o crescimento do plantio de eucalipto virá também para a área rural de Campo Grande.

Então a gente ganha com isso e vem ainda os serviços todos, temos um volume significativo de mão de obra se deslocando para Ribas e voltando para cá, trazendo muitas das vezes o salário para ser gasto em Campo Grande. Isso é uma vantagem logística, a Capital tem esse benefício de estar numa posição geográfica positiva. A cidade sempre foi muito mais voltada à pecuária, hoje chegaram grãos, as cooperativas. Mas os grandes setores de desenvolvimento são os serviços e comércio, o agro representa muito pouco. 

Acho que o agronegócio da Capital tem a grande vantagem de estar mais próximo de um grande mercado consumidor e a gente tem feito um trabalho muito grande junto aos pequenos e médios agricultores para que eles possam se organizar e aí vem o sistema de inspeção municipal para fazer com que esse pequeno agricultor também se torne um comerciante.   
 
Nesse sentido, quais estratégias a secretaria tem adotado para desenvolvimento do setor produtivo?

Primeiro exatamente é entender tudo isso, entender a magnitude da economia de Campo Grande e tentar destravar ou melhorar os ambientes de negócio. Quando a gente entende que Campo Grande tem todas essas variantes, serviço, indústria, comércio e agro. Então a gente tem feito várias estratégias e vários programas para criar essa sinergia.

Onde é que a gente está focando? Tem quatro grandes eixos que eu, quando cheguei aqui, estabeleci. O primeiro deles é fazer uma revisão e uma modernização no Prodes, na nossa Lei de Desenvolvimento Econômico. A economia vai mudando os cenários econômicos e a gente também tem que atualizar e modernizar essas leis. Uma das coisas que o empresariado se preocupa muito e trouxe essa demanda muito forte para nós, é principalmente a cláusula de reversão que hoje essa lei impõe um certo rigor. A gente tem que sentar com o empresariado,  com o poder público, rever isso, e eu estou fazendo isso junto a Fiems, à Câmara Municipal para discutir uma cláusula de reversão, que beneficie o empresário que investiu, que está gerando emprego, que está cumprindo com todas as suas obrigações, mas que também não tire o direito do município de retomar essa área caso aquela empresa não cumpra com seus compromissos. 

Depois, a Lei de Liberdade Econômica, a gente precisa desburocratizar a estrutura para abrir uma empresa. A Prefeita possivelmente manda para a Câmara na próxima semana, a lei da liberdade econômica também para o município. Isso desburocratiza, facilita a abertura de empresas e não tira a força das fiscalizações que o município tem a obrigação de fazer. 

Há alguns anos houve uma reformulação do Prodes para trazer novos investimentos para a Capital, houve algum avanço sobre isso? 

Com certeza houve avanços. Toda vez que você moderniza uma legislação de incentivos, o empresariado se move para buscar esses incentivos e continuar fazendo os seus investimentos gerando emprego. Campo Grande hoje é uma força tanto que o Caged deste mês mostra que 70% da empregabilidade de Mato Grosso Sul é referente a Campo Grande. Se você tem emprego, é porque o empresariado está investindo, está abrindo novas frentes de atuação e isso é o que demonstra esses números. Então, toda reformulação de lei de benefício gera crescimento. 

E vem o segundo pilar da nossa gestão aqui. A gente precisa também modernizar os nossos polos. O crescimento industrial e comercial de Campo Grande é tão grande que falta área. Os polos já estão quase todos ocupados, a maioria das áreas estão já prometidas ou endereçadas. O que precisa a gente fazer lá hoje? Melhorar investimentos, asfalto, esgoto, água, luz, limpeza de terrenos, acesso, levar o serviço público para dentro dos polos. Exatamente.

Estivemos no polo oeste, que está com 20, 30 empresas, um volume de mil pessoas trabalhando. Essas pessoas querem morar mais perto, então precisa ter casa, transporte, creche, ou seja, o serviço público também tem que se aproximar desses polos industriais, isso também é uma política que a gente está avançando junto à prefeita para que os serviços municipais cheguem mais próximos a esses polos industriais que estão crescendo.

Vamos ampliar os dois polos, aumentar as áreas do Oeste e do Norte para que esses empresários possam realmente continuar investindo. O que eles querem um pouco é uma área para colocar sua empresa, benefícios fiscais, alguns incentivos. 

Quais ações para fomentar a economia da Capital?

A economia da Capital quase anda sozinha, como eu disse, tem uma força motriz muito grande devido a sua logística, devido a sua população. O Estado e o município precisam ajudar a criar ambiente, primeiro ambiente de inovação e aí a Prefeitura Municipal está colocando em Campo Grande um parque tecnológico, voltado para a vocação econômica desse município onde a gente vai absorver startups, empresas de inovação, dar soluções às empresas que já estão instaladas, mas que precisam crescer.

Precisamos de infraestrutura, de asfalto, de esgoto, de água, nós precisamos de casa, habitação, ou seja, quando a gente fala no que precisa ser feito para que a gente cresça economicamente vai além da Sidagro, nós precisamos envolver outras secretarias.

Isso seria também em parceria com envolvimento das verbas federais e estaduais, ou seja, é um trabalho muito mais amplo do que só o município. O município vai dar as bases para esse crescimento. 
 
Havia uma expectativa da Pasta, de que o PIB da Capital crescesse 5% no ano passado, essa perspectiva se confirmou? Para este ano qual a estimativa?

Na verdade, não se confirmou uma expectativa alta de 5%, era uma visão do mercado naquele momento pós-pandemia, a gente acreditava que o mercado fosse reagir fortemente e que Campo Grande fosse puxar esse PIB aí na casa dos 5%. Isso nos confirmou hoje, tem uma expectativa em torno de 2%, 2,5% que está já se configurando como real. Eu acredito que fique nisso, isso para mim já é um número significativo, pensando que o estado de São Paulo, o qual é o grande motor econômico do Brasil, está com uma perspectiva de 2,4%. Ou seja, nós estamos no Centro-Oeste do País com a mesma perspectiva de aumento do grande motor econômico que é São Paulo.  

Foi apresentado um projeto com a intenção de transformar o Porto Seco em local para manobras com motocicletas, mas que não foi aprovado. Há algum projeto para utilização do local?

É importante conceituar o terminal intermodal de cargas e porto seco. Tem um pouco de confusão nessas definições. O terminal intermodal de carga é um espaço físico onde você coloca vários modais, rodoviários, aeroportuários, hidroviários e principalmente ferroviário, que era o grande chamariz para se ter um grande terminal e intermodal de cargas em Campo Grande. Dentro desse terminal é possível e deve-se colocar um porto seco que nada mais é do que uma Aduana onde você consegue fazer todo o processo administrativo de importação e exportação. 

A gente acaba usando o termo Porto Seco para generalizar tudo isso. Então, naquele período, foi trabalhado, já que havia um incentivo nacional para se criar grandes estruturas de logística. Tínhamos a vinda de minério de Corumbá, parando em Campo Grande e indo para o porto de Santos e o retorno com combustível. Então você tinha uma malha ferroviária que viabilizou fortemente um terminal, um terminal intermodal de cargas e a Rumo, naquele momento, foi a empresa que ocupou esse terminal. Essa malha ferroviária foi mudada, o cenário econômico alterou isso e hoje praticamente o terminal não tem mais essa funcionalidade.

A Prefeitura Municipal está fazendo um grande estudo para dar uma nova roupagem a esse terminal. Nós estamos no centro da Rota Bioceânica e esse terminal tem tudo a ver para ajudar nesse espaço, nesse quesito de modal rodoviário. Queremos remodelar o terminal intermodal, agora não focado na ferrovia, mas sim na rodovia.  

Os comerciantes do centro de Campo Grande tem reclamado de forma recorrente da queda das vendas e principalmente da falta de movimento, há algum projeto para levar esse consumidor de volta ao centro?

Há uma mudança cultural na forma de se comprar hoje, porque Campo Grande tem muitos bairros populosos. Muita gente prefere comprar no próprio bairro e o comércio mudou muito. No passado, o centro era muito forte porque era o único e o maior centro comercial que tinha. A cidade vai crescendo, se estruturando, vai se modernizando, isso muda um pouco.

Depois veio a mudança de hábito com a internet, hoje também as pessoas aprenderam e culturalmente está mais simples e mais fácil você fazer compras virtualmente, receber em casa e não ter que se deslocar. Depois você tem os grandes shopping centers também onde você encontra várias lojas reunidas no mesmo espaço físico. Isso fez com que o centro da cidade começasse a diminuir a sua força econômica. 

A gente precisa criar mecanismos para voltar as pessoas para o centro da cidade. As habitações sociais são algo que precisa ser pensado, colocar um programa forte, e o município já começou, tem ali a Vila dos Idosos, tem outro programa grande que são quase 800 moradias sociais, ou seja, você leva as pessoas para morar no centro da cidade. A farmácia vai se instalar, o mercado e as lojas vão se instalar.

Depois, a gente tem um trabalho com a Secretaria de Turismo para levar eventos. Eventos levam pessoas, atraem movimento, então tem que circular também ali naquele centro de cidade um volume maior de pessoas para reativar este comércio. São várias situações e, como eu disse, de várias secretarias que precisam se juntar para fazer uma revitalização desse centro da cidade. 
 
Como a Capital pode se beneficiar com o funcionamento da rota bioceânica?

A vantagem logística de Campo Grande estar quase no centro dessa grande rota é enorme. A gente esteve agora em Loma Plata, no Paraguai, numa reunião que discutia as vantagens e as desvantagens de cada município dentro da rota. E eu entendo que para Campo Grande, esse centro logístico entra de novo como fundamental porque toda essa rota ela vai se basear fortemente na rodovia. 

Campo Grande vai ser um grande entreposto de passagem de mercadoria, de recebimento de mercadoria. Tenho para mim que nós podemos deixar de ser final de rota, mas meio de distribuição para o Brasil quase todo, tudo que vier do Chile pode ser aqui distribuído para o Brasil todo. Vai ser a capital das oportunidades com certeza e a rota vai ser talvez a maior oportunidade que Campo Grande vai ter em décadas.. 

Como a secretaria tem auxiliado os produtores rurais nesse período de estiagem severa?

 Lutar contra a natureza é sempre um grande problema. A gente está vendo que o Brasil é um país continental, a gente olha para baixo, tá vendo o sul do país inundado, alguns milhares de quilômetros para cima a gente tá vendo o Pantanal pegando fogo por falta de chuva e uma estiagem muito antecipada. De que jeito que a secretaria tem atuado? 

Primeiro, com orientação a gente precisa capacitar, orientar, mostrar a esse produtor que um período de estiagem é sempre um risco para a sua produção. Depois, a gente está aumentando a frota de maquinário. Tem uma grande emenda da senadora Tereza Cristina que a gente está viabilizando para que a gente possa comprar novos equipamentos.  

Perfil

Ademar Silva Junior 

Ademar Silva Junior é formado em medicina veterinária e especialista em agronegócios. Foi presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (Famasul); presidente do Conselho Curador da Fundação Educacional para o Desenvolvimento Rural (Funar); presidente do Conselho Administrativo do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar/MS) e vice-presidente de Finanças da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Ele também foi presidente da Anater, secretário-adjunto da Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) e diretor-presidente da Fundação do Trabalho de MS (Funtrab).

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